Por Julio Miragaya*
O Brasil despende R$ 120 bilhões por ano para sustentar 700 mil militares da ativa e inativos, e espera mais do que tutela ou ameaças
Para quê servem as Forças Armadas de um país? Os democratas dirão que, essencialmente, para a proteção de possível ameaça externa ao país. Mas Bolsonaro pensa que elas existem para tutelar a vontade de um povo, ao dizer que “a democracia só existe se as FFAA assim o quiserem”.
O problema é que não têm querido muito. Pelo contrário: historicamente, o que o alto comando das FFAA tem feito é atacar a democracia e a liberdade. Foi assim ao sustentar a ditadura do Estado Novo (1937/45); ao tentar um golpe contra a posse de JK; ao derrubar Jango e impor uma ditadura militar por 21 anos (1964/85); e, mais recentemente, fazendo apologia ao golpe de 64, ao AI-5, defendendo torturadores e ameaçando o STF caso concedesse habeas-corpus a Lula.
A frágil democracia no Brasil só existe ou existiu pela vontade da sociedade civil, mais exatamente pela luta e resistência do povo trabalhador. Qual a situação hoje? Após o golpe jurídico/parlamentar, campanhas de difamação pela grande mídia, ameaças de toda ordem, farsa jurídica de Moro/Dallagnol e propagação de fake news, o resultado foi a eleição de um ex-capitão troglodita incompetente e inconsequente para o Planalto, que logo povoou a Esplanada de militares, da reserva ou da ativa.
O general Pazuello é somente mais um entre os mais de 6 mil militares indicados para cargos civis no governo federal, a maioria sem a devida qualificação para o cargo. As bobagens do general-ministro da Saúde, com resultados macabros, é apenas a face mais visível do FBAPA, o festival de besteiras que assola o país, para lembrar Stanislaw Ponte Preta.
A versão de que militares no governo colocariam o País “nos trilhos” é um embuste: a economia está quebrada; o desemprego assola mais de 20 milhões de trabalhadores; a fome voltou com força; e a corrupção grassa solta. Sim, não passa de mito a versão de que com os militares não há corrupção.
Na ditadura, foram pagas propinas bilionárias nas obras da Transamazônica, da ponte Rio-Niterói, da usina de Angra I. Sem contar as denúncias de favorecimento à OAS e à Odebrecht no Polo de Camaçari. Só que as denúncias não prosperavam devido à censura à imprensa e ao Judiciário açodado. Hoje, compras “suspeitas” de vinho e leite condensado.
O fato é que, na América Latina, com raras exceções, as FFAA historicamente têm atuado como braço armado do grande capital, da burguesia urbana e da oligarquia rural. Incorporaram a batida ideologia do anticomunismo (antes, anti soviético, agora, anti China) gerada na academia militar de West Point (EUA), tornando-se verdadeiros arautos do imperialismo norte-americano.
O Brasil despende cerca de R$ 120 bilhões todo ano para sustentar 700 mil militares da ativa e inativos, e espera mais do que tutela ou ameaças. Tampouco, deseja a ocupação de mais de 6 mil cargos civis – que deveriam serpreenchidos por servidores concursados, qualificados e competentes – por militares que, via de regra, estão apenas atrás de uma “boquinha”. Uma “boquinha verde oliva”.
(*) Doutor em Desenvolvimento Econômico Sustentável, ex-presidente da Codeplan e do Conselho Federal de Economia