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Gilney Viana: A nova orientação do PT e sua direção lulista

As Resoluções do 6º Congresso do PT se concentram no curto prazo. Pensam o hoje, pensam pouco o ontem e menos ainda o amanhã. Não voltam atrás mais que 2014 e não olham à frente mais que 2018, não por acaso, marcos eleitorais. Limitadas no tempo, sua orientação política tem potência só no curto prazo.

Não responderam adequadamente o questionamento imposto pelo golpe de 2016 ao PT, sua visão de mundo, seu projeto de desenvolvimento para o país e sua forma de fazer política. Não ousam pensar o futuro, presas ao raciocínio equivocado de que uma dose mais forte de utopia lhe dificultaria disputar os corações e mentes, no presente.

A nova direção do PT, em contrapartida, ganhou alta potência com a participação de Lula e sua equipe. Ficou não apenas lulista, mas também luliano. Talvez resolva a crise de direção e lhe dê prumo, presente; mas lhe falta sentido e rumo, futuro. Resoluções fracas e direção forte, frutos da hegemonia lulista restaurada.

Tenta resolver essa contradição com maior assertividade e protagonismo na luta política, na luta de classes que está aguçada e cobra do PT não apenas mais do mesmo, mas também mais do mais. Este é o desafio.

Compreendo, mas não compartilho do otimismo da senadora Gleisi Hoffmann, presidenta do PT, ao apresentar o Caderno de Resoluções do 6º Congresso, não só em relação ao processo, como em relação aos resultados (vide meu artigo “A foto do congresso do PT” nesta Tribuna de Debates) e avalio que o conjunto das resoluções padece de pelo menos três insuficiências graves.

A primeira insuficiência grave diz respeito à ligeireza da análise das tendências estruturais do capitalismo atual, tanto global como nacional, da revolução tecnológica e da integração produtiva que alteram a composição da classe trabalhadora e impõem novas condições para a sua luta por maior participação no excedente; da financeirização globalizada, que recompõe o poder da burguesia em favor do capital financeiro; e, finalmente, das suas formas encobertas ou abertas de governar os governos e submeter os estados nacionais aos seus interesses.

Ignora a crise ecológica e o seu enfrentamento, seja pelo capital, seja por movimentos alternativos sociais e ambientais globais. Às vezes a análise se concentra na crise econômica atual desencadeada a partir de 2008 e na crítica ao “receituário neoliberal aplicado para enfrenta-la” (item 4, da Resolução sobre a Situação Internacional do Caderno de Resoluções) o que leva a pensar em programas simplesmente antineoliberais.

A segunda insuficiência diz respeito à discussão sobre o socialismo, trabalhada na Resolução sobre Estratégia e Socialismo itens 8-19. Há um esforço de formulação sobre os dois pontos. Sobre Socialismo, recupera o conceito do socialismo democrático e ignora quando este conceito avança para o socialismo democrático e sustentável, no 3º Congresso, reafirmado no 4º e no 5º Congresso. Em Estratégia avança na defesa “da construção do poder popular, de um Estado dirigido pelas classes trabalhadoras” (item 22) sem se deter na formação deste poder popular e sua articulação com o poder do Estado.

Exatamente sobre esses pontos apresentei ao Congresso a emenda substitutiva “Em defesa do socialismo democrático e sustentável” que define o conceito e elabora uma estratégia que articula luta de classes e lutas libertárias das mulheres, negros, jovens, LGBT e outros; fortalecer iniciativas econômicas, culturais e associativas como elementos do poder popular autônomo das classes trabalhadoras e da cidadania; gestão autônoma dos bens comuns em relação ao capital e também em relação ao Estado; combinar estrategicamente acúmulo de forças com rupturas sociais democráticas; e disputar o imaginário das pessoas com o anúncio de um novo modo de trabalhar, produzir e viver e da expansão das experiências práticas do viver bem, em harmonia entre humanos e entre humanos e a natureza. Infelizmente rejeitada.

A terceira insuficiência é a contradição entre os argumentos e os encaminhamentos, especialmente quando se trata de programa. Já não falo de programa máximo de construção da sociedade socialista, democrática e sustentável, falo do “Plano Nacional de Emergência” proposto na Resolução sobre Situação Nacional e dos “Treze capítulos fundamentais que sintetizam essas reformas” (“estruturais”) do item 34, da Resolução sobre Estratégia e Programa.

Reformas minimalistas, abaixo do acumulado teórico e político do PT em outros encontros e congressos: reformas agrária e urbana sem explicitar desapropriação de terras e terrenos; direitos indígenas sem afirmar o direito à terra; direitos das mulheres à la ortodoxia comunista; direitos humanos sem contextualização social;  desenvolvimento sustentável da Amazônia sem falar das unidades de conservação e dos serviços ambientais; e, suprema heresia, Plano de Nacional de Desenvolvimento Sustentável, com muito incentivo à industrialização e nenhuma palavra sobre sustentabilidade.

Já o novo Diretório Nacional tende a ser melhor do que o anterior. Deve recuperar seu papel dirigente em função das mudanças impostas pelo golpe de 2016, por várias razões. Primeira, não será subalterno ao Palácio; segunda, tende a ter maior sintonia com a bancada federal; terceira, pode melhor aproveitar a Fundação Perseu Abramo; quarta, e não menos importante, trouxe para dentro de si o centro de poder petista mais evidente que é Lula e sua equipe.

Este novo arranjo não foi obra apenas das pressões externas. Houve um movimento interno muito forte de Lula e sua equipe para fazer acordos políticos e programáticos no Congresso; e arranjos para formar uma nova maioria dentro do Diretório Nacional que não dependa apenas da corrente Construindo um Novo Brasil (por si só minoritária) submetendo aliados ao centro e à esquerda do leque ideológico interno. As correntes minoritárias reunidas no Muda PT resistiram à investida, mas tiveram uma atuação no Congresso abaixo da expectativa, não obstante a postura combativa do seu candidato a presidente, o senador Lindbergh Farias. Agora terão que se reinventar.

Por outro lado, a conjuntura política nacional evoluiu. A classe dominante se unificou em favor das contra reformas neoliberais e impõe sua agenda ao Congresso Nacional e ao governo que se enfraqueceu com as denúncias contra o presidente ilegítimo Temer, na iminência de ser derrubado. Do outro lado, não obstante a perseguição judicial e midiática, Lula sobe nas preferências do eleitorado enquanto eventual candidato a presidente da República em 2018 e o PT recupera parte de sua aceitação pública, segundo as pesquisas de opinião. Há uma percepção na direção de que o PT saiu do fundo do poço.

É neste contexto que se realizou a primeira reunião da nova direção. Ao estilo lulista, o Diretório dedicou horas para exposições interessantes sobre economiagreve geral e reforma política abertas a poucas intervenções da plenária; e alguns minutos para explicar e aprovar a “Caminhada do Lula” pelo Nordeste, sem dúvida, a iniciativa mais arrojada do partido para defender Lula, estimular sua militância e impulsionar a luta contra o governo ilegítimo e as contrarreformas da classe dominante. Torçamos e esperemos que seja um sucesso!

Por Gilney Viana, coordenador da Setorial Nacional de Meio Ambiente e membro da Executiva Nacional do PT, para a Tribuna de Debates do PT.

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