Por Rafa Energia*
A tarefa deste ano de 2022 é enorme, decisiva e muito valiosa. O ano de 2023 também será difícil e repleto de desafios, mesmo com a possível vitória do Lula e a eleição da bancada de esquerda ou ao menos progressista, que buscamos e precisamos eleger no Congresso Nacional e no Distrito Federal. Se não um terceiro, um quarto turno precisará de toda força pra ajudar Lula e Leandro Grass nas difíceis tarefas que eles terão que realizar para resgatar o Estado para as juventudes e para as/es/os trabalhadoras/es. Trazer a dimensão da radicalização do direito para a centralidade das tomadas de decisão nos governos.
Agora, tanto candidatas/os/es quanto militantes e população em geral são pessoas, vidas humanas, que na atual conjuntura sofrem dores imensas e complexas orquestradas enquanto necropolítica deste (des) governo. Políticas que não compreendem a importância da equidade, das reparações históricas com os povos negros e tradicionais e só pensam em sua acumulação egoísta de riqueza, na ilusão, que poderão se safar da roda viva do universo. E neste mundo que dá voltas, acaba trazendo a violação praticada com os outros para a porta da sua própria casa.
Então, essa consciência de projeto de nação, de construção de equilíbrio das forças mundiais e de desenvolvimento de sociedades se torna indispensável para nossa prática política. Consciência na qual, de forma equânime, as pessoas tenham acesso as suas necessidades ou algum apoio estrutural no exercício do desenvolvimento dos seus desafios. São horizonte fundamental na nutrição da nossa prática humanizada, enquanto vamos construindo os projetos possíveis e mais próximos ao nosso território.
Os projetos para a nossa classe profissional, para a potência de dignidade do nosso direito à vida na saúde, educação, assistência social, segurança, cultura, habitação, terra e espiritualidade são o caminho, enquanto classe trabalhadora. Os sonhos para nossa família, amigos e comunidade, onde a gente possa se encontrar com a sensação de conforto, tranquilidade, relaxamento, atividade, dignidade e esperança são a linha pela qual podemos avançar sem esquecer da utopia.
E como dizia, os sujeitos que sofrem são dotados de sentimentos e corpos. Dimensões de matéria viva, densa e sutil, que precisam de cultivo, cuidados, nutrição qualificada sem veneno e alguma compreensão integral de sua identidade para conseguir realizar e ser no mundo. Autocuidado é alimentação devem ser observados com disciplina para superação de momentos em que a exaustão da luta pode ser um perigo. É no corpo que sentimos os reflexos da dureza da luta.
Por vezes, no desafio da realização dos projetos e sonhos, nos perdemos de nós mesmos e não sabemos como retornar. A princípio, tudo bem se perder, porém, a depender do que por ventura encontramos, pode nos faltar estrutura psíquica para retomar o caminho. E nesses momentos é fundamental o coletivo, o apoio, um ombro companheiro.
Por isso, para todas as pessoas, inclusive aquelas que lutam por uma causa maior, ou por uma questão no seu bairro ou categoria, é fundamental manter uma agenda permanente de auto observação e cuidado integral do corpo para o desenvolvimento de uma consciência gradualmente mais aproximada de si mesmo/a, das fragilidades, incompreensões e potências. Exercícios que, ao mesmo tempo, auxiliam na análise de conjuntura que busca transformar.
E talvez, nessa construção, seja possível observar que a realidade que precisamos transformar a partir do instrumento do Estado, passa também por um exercício de lapidação e transformação de nós mesmos/as. Em alguns casos, é possível ir compreendendo que essa construção é complexa, implica esforço e articulação de forças, que estão ao nosso alcance pessoal, profissional e histórico e outras dimensões, que no atual momento estão além da nossa condição.
Nesse exercício vamos analisando a nossa contribuição na sociedade, que só se realiza se for via coletividade. Na integração nem sempre convergente dos/as sujeitos/as que ousam, para além da vaidade ou no exercício dela mesmo, compartilhar o seu poder de construção para o coletivo e se permitir receber o que o grupo tem pra dar.
Porém, geralmente não estamos prontos pra isso e em alguns momentos, os conflitos florescem e a reação primeira é pular do barco, sair fora, como forma de acalentar a dor, que o contato com a diferença/interpretação de violência propiciou. Quando nos permitimos ficar um pouco mais, ter um espaço para olhar de novo para a mesma questão, abrir brechas para que as pessoas possam se posicionar, criamos possibilidade para o projeto coletivo crescer e os e as sujeitas disponíveis também.
Cada um está em seu tempo e processo. É necessário paciência e discernimento para ir construindo. Não se desenvolve coletividade sem tentativa de compreensão da diferença, sem abertura para nutrir compartilhamentos que alimentam e sem ousar ser firme nos princípios e valores que estamos estruturando.
A forte estrutura da coletiva não é rígida e nem mole. É flexível, como um bambu, que em uma direção é mais forte que o aço, mas em outra, frágil como uma palmeira. Na coletiva, o florescimento de uma consciência/sabedoria coletiva permite maior ciência das fragilidades/sensibilidades e maior consistência da força do grupo. Esse saber pode servir de guia para os necessários movimentos de amor e luta do grupo, para construir as vitórias necessárias dos planos no Distrito Federal e ir se desenvolvendo enquanto sujeitos no mundo.
*Rafa Energia é psicólogo, professor e Conselheiro Regional de Psicologia. Atua no Movimento Homens em Conexão e é músico da Banda Porta do Mundo.