Fome atinge 15,5% da população. Insegurança alimentar afeta 59%. A tragédia é culpa do desmonte das políticas sociais criadas por Lula e Dilma
No primeiro dia de governo, em 1º de janeiro de 2003, Lula anunciava que sua prioridade era garantir que todos os brasileiros tomassem café da manhã, almoçassem e jantassem todos os dias. Onze anos depois, em 2014, a ONU informava que o país estava oficialmente fora do Mapa da Fome.
No primeiro dia de desgoverno, em 1º de janeiro de 2019, Jair Bolsonaro anunciava o fim do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea), criado por Lula. Três anos e meio depois, neste 8 de junho de 2022, a Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional) informa que o país regrediu 30 anos e tem mais famintos do que tinha em 1993.
De acordo com o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, encomendado pela Penssan ao Instituto Vox Populi, o Brasil tem hoje 33 milhões de famintos, o que representa 15,5% da população. Quando se levam em conta também as pessoas que não têm garantia de que conseguirão comer todos os dias, consideradas em situação de insegurança alimentar leve ou moderada, o total chega a 125,2 milhões, ou 59% da população.
Na manhã desta quarta-feira, o ex-presidente Lula lamentou a situação. “Quando tomei posse em 2003, minha meta era simples: garantir três refeições por dia para os brasileiros. E tiramos o Brasil do Mapa da Fome. Mas infelizmente nosso país andou para trás e o flagelo da fome voltou para 33 milhões de pessoas. Vamos ter que reconstruir nosso país”, escreveu no Twitter.
Fome voltou a crescer após impeachment
A fome avança de maneira assustadora no Brasil. Depois de ficar na casa dos 4% em 2014 (índice que a ONU considera para retirar um país do Mapa da Fome), a inanição voltou a crescer após o impeachment fraudulento contra Dilma Rousseff.
No fim do governo de Michel Temer, a taxa de famintos já estava em 5,8%. No segundo ano de Bolsonaro, já havia saltado para 9%. E, agora, chegou aos 15,5%, castigando 33 milhões.
Em 1993, quando o número era de 32 milhões, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, lançou a primeira grande campanha contra fome do Brasil. “A gente regrediu literalmente 30 anos na luta contra a fome, o que nos assusta muito”, disse à Folha de S. Paulo o atual diretor-executivo da Ação da Cidadania, Kiko Afonso.
Essa regressão é resultado direto da falta de compromisso que os governos Temer e, principalmente, Bolsonaro tiveram com o tema. O fim do Consea, logo no primeiro dia de mandato, foi só a primeira medida do ex-capitão para desmontar toda a estrutura que garantia comida na mesa dos brasileiros.
“Não foi a pandemia que trouxe a fome de volta”, ressalta a ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome Tereza Campello. “Foi o desmonte das políticas públicas. O Brasil desperdiçou a estrutura de proteção social que poderia ter garantido ao país enfrentar a pandemia sem fome. Fizemos o oposto”, acrescenta, lembrando que o Instituto Gallup apontou recentemente que o Brasil tem hoje um índice de famintos mais alto que a média mundial.
Do salário mínimo à agricultura familiar
As políticas públicas desmontadas que Tereza menciona eram muito mais que o programa Bolsa Família, como já explicou em diferentes ocasiões o ex-presidente Lula.
A fome acabou no Brasil na década passada porque, nos governos do PT, o salário mínimo teve aumento real de mais de 70%, mais de 20 milhões de empregos foram criados, estoques de alimentos eram feitos para impedir a disparada de preços, os agricultores familiares recebiam incentivo para que não deixassem de produzir os alimentos básicos, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) levava comida de graça a creches, escolas, instituições sociais e famílias carentes.
Tudo isso foi desmontado. O salário mínimo não tem aumento real há quatro anos, o desemprego continua acima dos 11%, os estoques de alimentos não são mais feitos e o PAA teve o orçamento reduzido para R$ 58 milhões em 2021, enquanto, em 2012, executou R$ 840 milhões.
Mulheres, negros e pobres sofrem mais
Todo esse descaso maltrata especialmente as mulheres e a população negra, mostra o estudo do Penssan. Na média, 15,5% dos brasileiros passam fome. Mas esse índice é mais alto em domicílios chefiados por mulheres (19,3%) ou por pessoas pretas e pardas (18,1%). Já nas casas com três ou mais crianças ou jovens de até 18 anos, o percentual sobe para 25,7%.
Outro dado que revela a desigualdade: enquanto 53,2% dos brancos estão em situação de segurança alimentar, esse índice cai para 35% entre pretos e pardos. Há diferenças regionais também. A insegurança alimentar no Sudeste afeta 55% das pessoas. No Norte e no Nordeste, afeta, respectivamente, 72% e 68%.
PT