“Vão matar eles dois. Se matar, daí não tem mais”. Em um relato publicado em vídeo pela Survival International, Rita Piripkura, a única pessoa de seu povo em contato frequente com pessoas de fora, descreve como seus parentes foram massacrados em um ataque realizado por madeireiros, e conta que seu irmão e seu sobrinho, Baita e Tamandua, ainda vivem isolados dentro do território. Mas agora eles estão sob risco de serem assassinados por invasores ilegais.A ameaça constante em que vivem Baita e Tamandua é semelhante a de outros povos indígenas isolados do país. E imagens publicadas recentemente mostram que a situação piorou drasticamente nos últimos dois anos. Existe um risco iminente de que terras de povos indígenas isolados sejam destruídas em nome do agronegócio.Existem mais de cem povos indígenas isolados vivendo na parte brasileira da floresta amazônica, mais do que em qualquer outro lugar do mundo. Esses indígenas não possuem contato regular com pessoas de fora de seus grupos.Mais informaçõesInvasão de centenas de garimpeiros na Amazônia expõe tolerância do Brasil com crime ambientalEditarAo contrário do que muitas pessoas imaginam, esses povos sabem da existência da sociedade que os rodeia. E, mesmo assim, muitas vezes eles deixam claro que desejam se manter isolados. Em muitos casos essa decisão é resultado de violentos encontros do passado e da contínua invasão e destruição de sua floresta –e uma estratégia de sobrevivência.O encontro com pessoas de fora tem se mostrado repetidamente desastroso para indígenas isolados. Quando invasores forçam esse contato, trazem a violência, o roubo de terras e doenças, contra as quais os isolados não possuem imunidade. São os povos mais vulneráveis do planeta. É comum que metade de um povo seja dizimado no período de um ano após o primeiro contato.Além disso, como disse Sydney Possuelo, experiente sertanista e um dos responsáveis por criar a política de não contato adotado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em 1987, sobre as consequências desse encontro com a nossa sociedade: “No primeiro contato, você começa a destruir o universo deles. Eles não podem avaliar as ilusões do nosso mundo. Tenho para mim que só quem vivenciou sabe, com que velocidade destruímos o conjunto de valores que os mantinha vivos, unidos e diferenciados.”Os povos indígenas isolados prosperam quando suas terras estão protegidas. Eles são alguns dos mais importantes guardiões da biodiversidade amazônica pois vivem há inúmeras gerações em uma relação de simbiose com a floresta. Por isso, proteger suas terras de invasores é também uma das medidas mais eficazes para mitigar a crise climática.Mas atualmente esses povos se encontram em uma situação de extrema vulnerabilidade –situação intensificada nos últimos três anos pelas ações e discursos racistas e anti-indígenas do atual governo. Sob Jair Bolsonaro, a Funai, órgão responsável por “proteger e promover os direitos dos povos indígenas”, tem negado a devida proteção dos territórios e das vidas desses povos isolados e tem encorajado ativamente a abertura dessas terras para a exploração comercial.Um dos casos mais flagrante e urgente é o de terras de povos indígenas isolados que ainda não foram demarcadas, e que agora podem perder o único instrumento que as protege: as restrições de uso. Essas restrições são um mecanismo que legalmente proíbe a exploração e a entrada de pessoas não autorizadas no território. Mas elas precisam ser renovadas periodicamente ou devem permanecer vigentes até a demarcação definitiva.As terras indígenas Piripkura (MT), Jacareúba/Katawixi (AM), Pirititi (RR) e ItunaItatá (PA) estão com suas restrições de uso prestes a vencer. Sem as restrições de uso e garantia de sua correta implementação, os povos indígenas isolados que vivem nesses territórios podem ser exterminados e uma área de cerca de um milhão de hectares de floresta amazônica pode ser completamente destruída.Para impedir esse genocídio, as organizações Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI), com o apoio das organizações parceiras Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a Survival International e o Instituto Socioambiental (ISA), lançaram em agosto a campanha #IsoladosOuDizimados. A campanha tem o objetivo de pressionar a Funai a renovar as portarias e avançar com os processos de demarcação definitiva dos territórios.Como parte das ações da campanha, um voo realizado em outubro sobre a Terra Indígena Piripkura registrou um cenário de invasão e destruição nunca antes visto: fazendas bem instaladas e em pleno funcionamento com gado e pastagens, movimentação de caminhões, áreas desmatadas, indícios de queimadas recentes e até mesmo uma pista de pouso. Nos últimos dois anos houve uma explosão no desmatamento que registrou um aumento de 27.000%. Imagens de satélite também mostram que novas áreas dentro da terra começaram a ser preparadas para pastagem. Após grandes incêndios registrados entre julho e setembro deste ano (o primeiro passo para “limpar” o terreno para receber gado), uma área contendo aproximadamente 1,3 milhão de árvores foi totalmente destruída e está agora pronta para receber a “boiada”.Um cenário parecido de invasão e exploração ilegal está sendo registrado também nos outros três territórios foco da campanha. Em uma denúncia recente, foi constatada a existência de postes de energia dentro da Terra Indígena Ituna/Itatá, instalados ilegalmente pela empresa Equatorial Energia. Há anos a situação de Ituna é crítica: em 2019, foi a terra indígena mais desmatada do país e a pressão política para a abertura desse território conta com o suporte do senador e pastor evangélico Zequinha Marinho (PSC-PA).Desmatamento e ocupações ilegais também foram registrados nas terras Jacareúba/Katawixi e Pirititi. O monitoramento realizado pelo Instituto Socioambiental identificou um grande ramal de desmatamento crescendo em direção à Terra Indígena Pirititi. No total, já foram devastados 129 hectares muito próximos aos limites do território. Esse território também está ameaçado pelo projeto de construção do Linhão do Tucuruí que, se aprovado, irá cortar a Terra Indígena Waimiri Atroari (AM-RR), passando bem próximo a Pirititi. A construção do linhão traria novas frentes de desmatamento e invasões e aumentaria o risco de contato com os isolados desse território.No caso de Jacareúba/Katawixi, outro fantasma da ditadura assombra a região: a BR 319. Um dos projetos do governo Bolsonaro é completar o asfalto dessa rodovia que liga Manaus a Porto Velho. Nos últimos anos, o desmatamento na região se intensificou, assim como as invasões e a grilagem de terras. Isso agravou os problemas ambientais e afeta diretamente os povos indígenas que vivem próximos à cicatriz que a estrada faz na floresta. A pavimentação da rodovia permitiria a abertura de outros ramais de desmatamento e levaria à invasão de áreas ainda intactas da floresta. As áreas preservadas do território Jacareuba/Katawixi são essenciais para a sobrevivência e a continuidade do modo de vida autossuficiente desses indígenas isolados.Como disse o indígena Felipe Tuxá em entrevista à Survival: “Existem formas diretas de matar e existem formas de não deixar que a gente viva”. Também é genocídio não garantir o direito fundamental de proteção das terras de povos indígenas isolados. Deixar que a destruição avance livremente sobre esses territórios é também condenar esses povos ao extermínio. Não promover a vigência das restrições de uso até a finalização da demarcação dessas terras é pavimentar o caminho para a aniquilação desses indígenas isolados.Por isso precisamos ecoar nossas vozes nos quatro cantos do mundo dizendo: #AssinaFunai!Editarum relato publicado em vídeo pela Survival International, Rita Piripkura, a única pessoa de seu povo em contato frequente com pessoas de fora, descreve como seus parentes foram massacrados em um ataque realizado por madeireiros, e conta que seu irmão e seu sobrinho, Baita e Tamandua, ainda vivem isolados dentro do território. Mas agora eles estão sob risco de serem assassinados por invasores ilegais.
A ameaça constante em que vivem Baita e Tamandua é semelhante a de outros povos indígenas isolados do país. E imagens publicadas recentemente mostram que a situação piorou drasticamente nos últimos dois anos. Existe um risco iminente de que terras de povos indígenas isolados sejam destruídas em nome do agronegócio.
Existem mais de cem povos indígenas isolados vivendo na parte brasileira da floresta amazônica, mais do que em qualquer outro lugar do mundo. Esses indígenas não possuem contato regular com pessoas de fora de seus grupos.MAIS INFORMAÇÕESInvasão de centenas de garimpeiros na Amazônia expõe tolerância do Brasil com crime ambiental
Ao contrário do que muitas pessoas imaginam, esses povos sabem da existência da sociedade que os rodeia. E, mesmo assim, muitas vezes eles deixam claro que desejam se manter isolados. Em muitos casos essa decisão é resultado de violentos encontros do passado e da contínua invasão e destruição de sua floresta –e uma estratégia de sobrevivência.
O encontro com pessoas de fora tem se mostrado repetidamente desastroso para indígenas isolados. Quando invasores forçam esse contato, trazem a violência, o roubo de terras e doenças, contra as quais os isolados não possuem imunidade. São os povos mais vulneráveis do planeta. É comum que metade de um povo seja dizimado no período de um ano após o primeiro contato.
Além disso, como disse Sydney Possuelo, experiente sertanista e um dos responsáveis por criar a política de não contato adotado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em 1987, sobre as consequências desse encontro com a nossa sociedade: “No primeiro contato, você começa a destruir o universo deles. Eles não podem avaliar as ilusões do nosso mundo. Tenho para mim que só quem vivenciou sabe, com que velocidade destruímos o conjunto de valores que os mantinha vivos, unidos e diferenciados.”
Os povos indígenas isolados prosperam quando suas terras estão protegidas. Eles são alguns dos mais importantes guardiões da biodiversidade amazônica pois vivem há inúmeras gerações em uma relação de simbiose com a floresta. Por isso, proteger suas terras de invasores é também uma das medidas mais eficazes para mitigar a crise climática.
Mas atualmente esses povos se encontram em uma situação de extrema vulnerabilidade –situação intensificada nos últimos três anos pelas ações e discursos racistas e anti-indígenas do atual governo. Sob Jair Bolsonaro, a Funai, órgão responsável por “proteger e promover os direitos dos povos indígenas”, tem negado a devida proteção dos territórios e das vidas desses povos isolados e tem encorajado ativamente a abertura dessas terras para a exploração comercial.
Um dos casos mais flagrante e urgente é o de terras de povos indígenas isolados que ainda não foram demarcadas, e que agora podem perder o único instrumento que as protege: as restrições de uso. Essas restrições são um mecanismo que legalmente proíbe a exploração e a entrada de pessoas não autorizadas no território. Mas elas precisam ser renovadas periodicamente ou devem permanecer vigentes até a demarcação definitiva.
As terras indígenas Piripkura (MT), Jacareúba/Katawixi (AM), Pirititi (RR) e ItunaItatá (PA) estão com suas restrições de uso prestes a vencer. Sem as restrições de uso e garantia de sua correta implementação, os povos indígenas isolados que vivem nesses territórios podem ser exterminados e uma área de cerca de um milhão de hectares de floresta amazônica pode ser completamente destruída.
Para impedir esse genocídio, as organizações Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) e Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI), com o apoio das organizações parceiras Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a Survival International e o Instituto Socioambiental (ISA), lançaram em agosto a campanha #IsoladosOuDizimados. A campanha tem o objetivo de pressionar a Funai a renovar as portarias e avançar com os processos de demarcação definitiva dos territórios.
Como parte das ações da campanha, um voo realizado em outubro sobre a Terra Indígena Piripkura registrou um cenário de invasão e destruição nunca antes visto: fazendas bem instaladas e em pleno funcionamento com gado e pastagens, movimentação de caminhões, áreas desmatadas, indícios de queimadas recentes e até mesmo uma pista de pouso. Nos últimos dois anos houve uma explosão no desmatamento que registrou um aumento de 27.000%. Imagens de satélite também mostram que novas áreas dentro da terra começaram a ser preparadas para pastagem. Após grandes incêndios registrados entre julho e setembro deste ano (o primeiro passo para “limpar” o terreno para receber gado), uma área contendo aproximadamente 1,3 milhão de árvores foi totalmente destruída e está agora pronta para receber a “boiada”.
Um cenário parecido de invasão e exploração ilegal está sendo registrado também nos outros três territórios foco da campanha. Em uma denúncia recente, foi constatada a existência de postes de energia dentro da Terra Indígena Ituna/Itatá, instalados ilegalmente pela empresa Equatorial Energia. Há anos a situação de Ituna é crítica: em 2019, foi a terra indígena mais desmatada do país e a pressão política para a abertura desse território conta com o suporte do senador e pastor evangélico Zequinha Marinho (PSC-PA).
Desmatamento e ocupações ilegais também foram registrados nas terras Jacareúba/Katawixi e Pirititi. O monitoramento realizado pelo Instituto Socioambiental identificou um grande ramal de desmatamento crescendo em direção à Terra Indígena Pirititi. No total, já foram devastados 129 hectares muito próximos aos limites do território. Esse território também está ameaçado pelo projeto de construção do Linhão do Tucuruí que, se aprovado, irá cortar a Terra Indígena Waimiri Atroari (AM-RR), passando bem próximo a Pirititi. A construção do linhão traria novas frentes de desmatamento e invasões e aumentaria o risco de contato com os isolados desse território.
No caso de Jacareúba/Katawixi, outro fantasma da ditadura assombra a região: a BR 319. Um dos projetos do governo Bolsonaro é completar o asfalto dessa rodovia que liga Manaus a Porto Velho. Nos últimos anos, o desmatamento na região se intensificou, assim como as invasões e a grilagem de terras. Isso agravou os problemas ambientais e afeta diretamente os povos indígenas que vivem próximos à cicatriz que a estrada faz na floresta. A pavimentação da rodovia permitiria a abertura de outros ramais de desmatamento e levaria à invasão de áreas ainda intactas da floresta. As áreas preservadas do território Jacareuba/Katawixi são essenciais para a sobrevivência e a continuidade do modo de vida autossuficiente desses indígenas isolados.
Como disse o indígena Felipe Tuxá em entrevista à Survival: “Existem formas diretas de matar e existem formas de não deixar que a gente viva”. Também é genocídio não garantir o direito fundamental de proteção das terras de povos indígenas isolados. Deixar que a destruição avance livremente sobre esses territórios é também condenar esses povos ao extermínio. Não promover a vigência das restrições de uso até a finalização da demarcação dessas terras é pavimentar o caminho para a aniquilação desses indígenas isolados.
Por isso precisamos ecoar nossas vozes nos quatro cantos do mundo dizendo: #AssinaFunai!