Quem conhece o Partido dos Trabalhadores sabe que uma de suas principais características é a pluralidade de ideias e movimentos – todos fundamentais na construção de propostas, por meio de debates. Os “inoxidáveis” fazem parte desse processo. Quando todos estavam inquietos, alguns surpresos e confusos com o uso político dos protestos de junho de 2013 para atingir a presidenta Dilma Rousseff, eles já começavam a se mexer. A percorrer ministérios, a conversar com pessoas, a perceber que aquilo poderia vir a desembocar em algo maior. Apesar da reeleição de Dilma Rousseff e de sua posse, em 2015, eles enxergaram os movimentos conspiratórios em andamento. Os inoxidáveis, que se reuniam sempre em horários de almoço ou após o expediente, ficaram tão incomodados que decidiram formalizar algo que fosse suprapartidário na busca de dar conta da realidade conspiratória das elites endinheiradas do país com (nada mais, nada menos!) o vice-presidente Michel Temer (MDB-SP). O NDD – Núcleo em Defesa da Democracia foi criado após discussões ocorridas ao final de 2015, antes da aceitação do processo de impeachment pelo então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha. O grupo começou a aglutinar maior número de pessoas de outros partidos, núcleos e movimentos a partir de suas próprias ações e pela presença organizada, constante e persistente na Praça dos Três Poderes, desde março de 2016. O objetivo inicial foi defender o mandato popular da presidenta Dilma Rousseff, mas isso foi só o início. Nessa época, eles não eram conhecidos como “inoxidáveis”.
Após a leitura das cinco matérias anteriores, você já deve ter concluído sobre o significado do nome para esse grupo de ativistas. Segundo o dicionário, o termo representa algo que não sofre oxidação; incapaz de enferrujar, de criar ferrugem. Logo, se pode associar àqueles militantes mais experientes, de maior acúmulo de lutas e, por consequência, de cabelos prateados. Esse conceito surgiu como uma brincadeira, quando um blog de direita usou do deboche para falar mal do grupo que se manifestava na Praça dos Três Poderes. Apesar de serem todos e todas muito experientes na luta partidária, na vivência de emoções no contato com a população, nem todos eram aposentados. Desde o início, o NDD também contou com a participação de pessoas da ativa, de jovens a idosos. Todos com muita vontade de contribuir com a luta.
Os inoxidáveis podem ser definidos como um grupo de militantes que “verga, mas não quebra”. Que tem uma resistência capaz de sofrer com as intempéries do ambiente político, mas que se mantém de pé, de cabeça erguida e com a disposição de enfrentar o cenário, por mais adverso que seja. E antes que alguém peça a palavra, é bom registrar que os inoxidáveis são apenas um exemplo desse perfil de militância que existe em todo o país. Pessoas de todos os gêneros, raça, crença e faixa etária que demonstram a mesma disposição, nos mais diversos ambientes de trabalho, em suas comunidades e nas instâncias partidárias.
Essa força interior e a leitura política sobre o que estava acontecendo nutriram a esperança e fizeram com que eles e elas não desistissem de tudo a cada derrota – como foram a perda do governo popular da presidenta Dilma Rousseff e a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A certeza de estar do lado certo da história, o acúmulo de lutas, o vínculo de construção das diversas políticas públicas e o conhecimento do que havia sido feito pelos governos petistas foram fundamentais para seguir em frente.
Pedro Rodrigues, fundador do PT Santa Maria resumiu sua experiência dizendo que “a praça foi a maior universidade de formação política dos últimos anos”. Ele sabe que a luta continua. Apesar da pandemia e dos cuidados necessários, o NDD persiste em atividade, participando de todas as manifestações pelo “Fora Bolsonaro” e em defesa da democracia. O Núcleo em Defesa da Democracia virou uma referência de luta no Distrito Federal. É por isso que gostaríamos de homenagear todos aqueles que, de alguma forma, participaram das manifestações. Diante da impossibilidade, faremos isso a partir dos militantes que mais se destacaram na luta, sem prejuízo de novos acréscimos (veja lista após a nota do redator).
E foi nesse tom de homenagem mútua e de agradecimento que um grupo de aproximadamente 30 inoxidáveis do Núcleo em Defesa da Democracia Margarida Alves (NDD) foi recebido pelo ex-presidente Lula. A temperatura estava alta no Distrito Federal – os termômetros chegaram a 33oC, na sexta-feira, oito de outubro de 2021 – último dia de uma semana de debates, conversas e contatos políticos realizados por Lula na capital federal. Os inoxidáveis foram recebidos pelo ex-presidente às 9:15, num clima de reconhecimento pela luta realizada, pela pedreira que ajudaram a quebrar e, sobretudo, pela esperança que se descortina no país e que, certamente, impulsionará novos movimentos inoxidáveis em todo o país.
Além de Lula, participaram da audiência a presidenta do PT Gleisi Hoffmann, o presidente do PT-DF Jacy Afonso e o ex-ministro Gilberto Carvalho. O coordenador do NDD Margarida Alves, Raimundo Nonato, relatou ao presidente a alegria daquele encontro após tantos anos de luta na Praça dos Três Poderes e nas manifestações de rua. “Enfrentamos o sol, a chuva, a fúria dos bolsomínions e a repressão da polícia em defesa da democracia, do Lula Livre e contra o golpe de 2016. Não arredamos o pé porque sabíamos que estávamos no lado certo da história”, disse. Lula ouviu atentamente, elogiou a postura aguerrida do grupo, agradeceu pela confiança em sua inocência e contou que está disposto a continuar na resistência. “A militância do PT é uma coisa extraordinária. Se não fosse a militância eu não sei o que seria do partido.” Lula pediu que a militância nunca abandone os símbolos. “Não tenham medo de sair com a estrela vermelha. É preciso dar visibilidade constante a nossa luta”, disse Lula. Uma luta que é do PT, dos partidos progressistas, dos coletivos democráticos e dos movimentos sociais. Foi um dia histórico. Quente e vibrante de afeto, carinho, estímulo e esperança.
Nota do redator
Quando fui provocado pelo secretário de Comunicação do PT-DF, Jacques Pena, para escrever esta série sobre os “inoxidáveis”, aceitei de imediato. Enxerguei a possibilidade de contribuir com o meu trabalho para que novos movimentos se inspirassem de duas maneiras: primeiro, que a luta é para sempre e precisamos estar sempre preparados para enfrentar as derrotas, pois a realidade é cíclica. Segundo, que é extremamente necessário contar as histórias dos inúmeros movimentos políticos e populares na luta das mulheres, dos estudantes, dos negros, dos LGBTQIA+, dos povos indígenas, dos ambientalistas e por aí vai. O movimento progressista precisa registrar o que faz, se orgulhar da luta e inspirar novas gerações.
Para escrever sobre os inoxidáveis realizei dez entrevistas com os militantes e uma série de pesquisas na internet. Como o tempo decorreu alguns anos, a memória pode não guardar a precisão exata de fatos e datas como todos gostariam. Busquei checar as informações e fazer a aproximação possível. No entanto, caso haja alguma incorreção, imprecisão ou mesmo ausência de fatos relevantes, a culpa é inteiramente deste redator. Peço a gentileza de ser informado pelo atento leitor ou leitora. Conte-me tudo, se possível, envie documentos, imagens ou o que achar necessário para o email: franzeribeiro@gmail.com. Para facilitar, no campo referente ao assunto, escreva: “Série Inoxidáveis”. Serei eternamente grato pelas suas contribuições que poderão ser utilizadas na produção de outra publicação a respeito do tema. Eu sou Franzé Ribeiro, jornalista de formação e milito no Partido dos Trabalhadores há mais de 30 anos. Meu agradecimento ao secretário Jacques Pena e ao presidente do PT-DF Jacy Afonso pela confiança.
As imagens publicadas nesta série foram cedidas por Raimundo Nonato, Fabiano Leitão e Pedro Rodrigues, de seus arquivos pessoais.
Os Inoxidáveis
Abaixo, a relação de companheiros e companheiras que se dedicaram na organização e, principalmente, tiveram presença constante nas vigílias semanais da Praça dos Três Poderes. Com estas citações, pelo nome de guerra, homenageamos a todos e todas que, de alguma forma, contribuem com o Núcleo em Defesa da Democracia:
Adevaldo, Agatha, Alfredo(UP), Ana Bicalho, Ana Saraiva, Andreza, Bete Ramos, Beth Galvão, Benildes, Benoni, Bruno, Cacau, Camila Tenório, Cilidia, Claudia Regina, Darly, Deusanir, Di Lucio, Dora, Edna, Edson, Elenize, Eliseu, Élsio, Elzevir, Fabiano Leitão, Fábio Oliveira, Fátima de Deus, Fenelon, Flávia Rodrigues, Francisco Neri, Gecina, Gilberto Carvalho, Hudson Cunha, Humberto, Inês Bettoni, Inês Ulhoa, Irene, Isa, Jacy Afonso, Jesser, Jessica, Jô, Joãozinho da Vila (em memória), Joaquim, Joca, Julimar, Kathia Garcia, Klebão, Lêda Freitas, Lene, Leninha, Linda Abadia, Luizão, Lunguinho, Lurdinha, Marcão, Márcia Kummer, Maria Fernanda, Maria Júlia, Márcio Apolinário, Mariana Rosa, Marília, Mariza Borges, Marília, Marlene, Nazaré Brito, Orlando Ribeiro, Paulinha, Pedro Rodrigues, Pietra, Pireli, Rafael Fernandes, Rafael, Raimundo Nonato, Renan, Ricardo Valle, Ricardo, Rita, Rodrigo Pilha, Rodrigo Rodrigues, Samuel, Sessé, Socorro Leitão, Sheila Campos, Socorro Sales, Sônia, Sueli Mendes, Tércio, Thelma, Tolentino, Walmor, Walter Matos, Wert, Wlamir, Zé Carlos, Zé Cesar, Zé Wilson, Zezé Weiss, Zuleide Sertão e Zuleika.#