A presidenta Dilma Rousseff não podia ter sido mais assertiva em seu último discurso no Palácio do Planalto, no dia 31 de agosto de 2016. As forças políticas, financeiras, empresariais e midiáticas haviam removido a barreira de proteção social, representada pelo governo petista, para impor a mais nociva pauta neoliberal. Com a ascensão do golpista Michel Temer à presidência da República, o Brasil começou sua descida no precipício. A queda foi tão forte que travou as contas públicas, amarrou todos os gastos sociais, incluído saúde e educação, e arrastou os direitos dos trabalhadores para o ralo. O cenário ainda viria a piorar com a prisão do ex-presidente Lula, sua interdição eleitoral e a chegada de Jair Bolsonaro ao poder. O país virou um pária internacional, o governo assumiu seu interesse em destruir todas as políticas públicas, construídas com sangue, suor, lágrimas e lutas ao longo de décadas, incluído a destruição do meio-ambiente. A economia ruiu e o desemprego aumentou. Não ficou um setor de pé. Como disse a coordenadora do Núcleo de Base Marisa Letícia do Congresso Nacional e integrante do Núcleo em Defesa da Democracia (NDD), Cláudia Regina, “a gente não teve um dia de tranquilidade. Não teve luto para chorar a nossa luta. A gente precisava continuar nas ruas tentando evitar outras perdas”.
E não houve mesmo tempo para chorar mágoas e ressentimentos. As dores ficaram mais agudas a cada dia, exigindo do NDD e de diversos outros coletivos do campo progressista uma ação cada vez mais unificada. O então presidente Michel Temer mal sentou na cadeira, ainda no afastamento provisório da presidenta Dilma Rousseff, e já impôs ao país a emenda constitucional do teto de gastos, congelando por até 20 anos as despesas com saúde, educação, saneamento, habitação, cultura, ciência e tecnologia, além dos gastos com proteção e direitos das mulheres, dos negros, dos indígenas, dos LGBTQIA+, dentre outros absurdos. A reforma trabalhista praticamente acabou com a CLT, extinguiu direitos do povo, aprofundando a precarização do trabalho e criando o regime intermitente – aquele que o trabalhador fica à disposição e recebe pelas horas efetivamente trabalhadas. Isso para ficar em poucos exemplos. O Núcleo em Defesa da Democracia Margarida Alves continuou na Praça dos Três Poderes, enfrentando o governo golpista de Michel Temer e discutindo com outras forças democráticas uma forma de unificação da luta.
A deposição do governo Dilma e a ascensão de Temer, com sua pauta conservadora, não eram as únicas questões a serem enfrentadas pelo campo progressista. A operação Lava-jato, coordenada pelo ex-juiz Sérgio Moro, sentiu-se em plenas condições para continuar subvertendo a lei e perseguindo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Apenas 14 dias após a deposição do governo, o procurador Deltan Dallagnol apresentou o conhecido “show” do power point onde dizia não ter provas, mas convicções sobre Lula. E depois de várias investidas de Moro e dos procuradores, Lula foi preso no dia sete de abril de 2018. Nesse momento, as forças progressistas já haviam se unido na praça, nas grandes manifestações de rua, no entendimento sobre tudo que acontecia no país, desde o golpe de 2016. Foi criado o Comitê Nacional Lula Livre, iniciativa que repercutiu em todos os estados e também no Distrito Federal. No caso do DF, com o trabalho de articulação desenvolvido pela coordenadora Maria Fernanda, que exerceu a presidência da Caixa Econômica Federal no período de 2006 a 2011.
O NDD Margarida Alves recebeu um forte apoio dos partidos de esquerda: PT/DF, PCO, Psol, PCdoB, PCB e Unidade Popular. A interação com a CUT-DF, Sindsep-DF e MST, dentre outras, se aprofundou. E os atos na Praça dos Três Poderes ganharam mais peso. As bancadas petistas no Congresso Nacional e na Câmara Distrital, que já apoiavam o grupo na praça, ficaram mais coesas. Outros Núcleos de Base passaram a atuar de forma institucional, como foi o caso do Núcleo de Base Marisa Letícia do Congresso Nacional, dos coletivos “Rosas pela Democracia”, e “Mulheres com Lula”. A participação do ex-ministro Gilberto Carvalho ajudou a aglutinar muitas forças e a impulsionar o trabalho do NDD nas instâncias partidárias e nos diversos coletivos. Nesse período, foram criados os comitês Lula Livre em todo o país. Além de participar das ações pelo Lula Livre na capital federal, o NDD manteve presença constante na Praça dos Três Poderes. Com a prisão injusta de Lula, os atos que eram realizados as segundas, mudaram para as quartas-feiras diante do Supremo Tribunal Federal, onde frequentemente a defesa do ex-presidente buscava julgamentos favoráveis. Essa ideia de realizar a vigília na frente do Supremo, proposta por Gilberto Carvalho, foi imediatamente aceita pelo NDD e mostrou-se acertada. O Sindsep-DF passou a fornecer o som utilizado na praça, semanalmente. E a CUT-DF programou as reuniões semanais de seu comitê Lula Livre para as quartas-feiras, antes de sair para as manifestações do NDD, para onde levava propostas a serem discutidas e incorporadas pelo Núcleo em Defesa da Democracia.
Cada vez que havia sessão no STF para julgar a situação do Lula a praça enchia. Com apoio do Partido dos Trabalhadores e dos diversos coletivos, ocorreram shows, recitais de poesia, performances artísticas. E, sempre, com muita ou pouca gente, os atos semanais na praça eram encerrados com o famoso “boa noite, presidente Lula!”, com a participação especial do Fabiano Leitão (Trompetista). O NDD Margarida Alves e os demais coletivos organizaram várias caravanas de apoio a Lula para as cidades de Curitiba (duas vezes), Porto Alegre (julgamento no TRF4) e São Bernardo do Campo (recepção a Lula). Em Curitiba, foram realizados atos em frente à sede da Polícia Federal, onde o ex-presidente Lula se encontrava preso, injustamente. As viagens serviram também para visitar e apoiar o acampamento Marisa Letícia – símbolo mundial de resistência. Em uma das caravanas a Curitiba, a organização levou artistas do DF para o Festival Lula Livre, dentre eles, a orquestra e coral do maestro Joaquim França, que havia gravado o vídeo “Canção pela Libertação”, em setembro de 2019.
Lula ficou 580 dias preso na sede da PF de Curitiba. Mas, a medida que o tempo passava, ficou mais evidente para a sociedade brasileira que havia uma perseguição ao ex-presidente, pois em nenhum momento foram apresentadas provas contra ele. Apesar da extensa devassa, realizada pela Força-Tarefa da Lava-jato na vida de toda a família do ex-presidente, no Brasil e no exterior, durante mais de cinco anos. Outra questão evidente em tudo que ocorreu foi o objetivo de impedir que Lula concorresse às eleições de 2018. A coincidência das datas entre o golpe de 2016 e o dia em que o Tribunal Superior Eleitoral vetou a candidatura Lula mostra que nada ocorreu por acaso. O julgamento do TSE foi no dia 31 de agosto de 2018, exatamente dois anos após o golpe de 2016. Por 6 a 1, o TSE vetou Lula – um dos principais objetivos do golpe. Nada é por acaso. Nesse dia, houve uma grande passeata em Brasília até a sede do TSE para acompanhar o julgamento. O movimento foi representativo e plural, com a participação do NDD Margarida Alves e dos demais coletivos do setor progressista, partidos políticos e militantes da democracia.
O NDD Margarida Alves recebeu um forte apoio dos partidos de esquerda:
PT/DF, PCO, Psol, PCdoB, PCB e Unidade Popular. A interação com a CUT-DF, Sindsep-
DF e MST, dentre outras, se aprofundou. E os atos na Praça dos Três Poderes
O golpe de 2016, a atuação ilegal do juiz Sérgio Moro e dos procuradores na Lava-jato e a decisão do TSE em relação a Lula selaram o destino do Brasil com a vitória do genocida Jair Bolsonaro para a presidência do Brasil. Com a posse de Bolsonaro, o Núcleo em Defesa da Democracia Margarida Alves, em conjunto com outros coletivos e entidades e o Comitê Lula Livre DF, incorporou o Fora Bolsonaro em suas bandeiras. Continuou o trabalho pela libertação do Lula e apoiando os movimentos que, unidos, vieram a enfraquecer o governo Bolsonaro diante de suas ações contra o Brasil e os brasileiros.
Cada vez que havia sessão no STF para julgar a situação do Lula a praça enchia.
Com apoio do Partido dos Trabalhadores e dos diversos coletivos, ocorreram shows,
recitais de poesia, performances artísticas. E, sempre, com muita ou pouca gente, os
atos semanais na praça eram encerrados com o famoso “boa noite, presidente Lula!”,
Para os inoxidáveis do NDD, que se defendiam dos ataques e xingamentos desde 2016, a mudança de humor das ruas começou a ser mais perceptível devido a dois fatores: o desgoverno Bolsonaro e a divulgação da VazaJato pelo portal do The Intercept, em parceria com veículos de imprensa. A partir de nove de junho de 2019, começaram a ser publicadas as matérias sobre o conluio entre o juiz Sérgio Moro e os procuradores da Lava-Jato, subvertendo o arcabouço jurídico do país para perseguir o ex-presidente. Mostrou também as mensagens trocadas em que o juiz orientava a acusação, dirigia os trabalhos, numa tabelinha prejudicial à defesa do acusado – o que tornou o processo totalmente suspeito. Expôs o empenho da organização pela eleição de Jair Bolsonaro e o uso da justiça para influir na sua vitória. Moro viria a se tornar ministro de Bolsonaro com a promessa de uma vaga no Supremo Tribunal Federal. E acabou sendo declarado juiz suspeito pelo STF.
O humor das ruas e das instituições começava a mudar.
Leia na próxima matéria o trabalho do NDD Margarida Alves e demais coletivos pela democracia, presentes na Praça dos Três Poderes e nas ruas, nessa nova fase da luta pela libertação de Lula.#