MANUCA FERREIRA
“Esse homem amou o Brasil”, grita Elza Sento Sé, interpretada pela atriz Maria Marighella, em uma das cenas finais de Marighella – O Filme, baseado na biografia escrita pelo jornalista Mário Magalhães. Neta do líder revolucionário e hoje vereadora pelo PT de Salvador, a fala de Maria sintetiza as mais de duas horas de duração da obra e a vida do líder revolucionário baiano. Carlos Marighella amou o Brasil. Ontem à noite, na pré-estreia em Salvador, terra natal do comunista, o espírito de Marighella esteve presente na volta pra casa.PUBLICIDADE
“Essa é a minha terra, mas essa é sobretudo a terra de Carlos Marighella”, disse um emocionado Wagner Moura sobre o palco do Teatro Castro Alves. “Esse filme não é só sobre aqueles que resistiram na ditadura militar nos anos 60 e 70. Esse filme é sobre aqueles que estão resistindo agora no Brasil”
Após dois anos de perseguição e censura pelo governo Bolsonaro e sua autoritária secretaria especial de Cultura, o primeiro filme dirigido pelo ator, roteirista e diretor Wagner Moura estreou não por acaso na cidade do guerrilheiro assassinado pela ditadura em uma emboscada em São Paulo há 52 anos, em 4 de novembro de 1969. “Essa é a minha terra, mas essa é sobretudo a terra de Carlos Marighella”, disse um emocionado Wagner sobre o palco do Teatro Castro Alves, que, pela primeira vez desde o início da pandemia, recebia um público daquele tamanho (50% da capacidade, com máscara e vacinação).
“Esse filme não é só sobre aqueles que resistiram na ditadura militar, nos anos 60 e 70. Esse filme é sobre aqueles que estão resistindo agora no Brasil”, afirmou. “É inacreditável que um produto cultural receba tantos ataques violentos e sofra tanta resistência por parte do governo federal. Isso diz muito mais sobre o estado das coisas no Brasil hoje do que sobre o filme.”
O discurso de Wagner Moura teve endereço certo: o enfrentamento ao autoritarismo bolsonarista, que censura e persegue quem pensa diferente, como é o caso dele mesmo, que teve o lançamento do filme adiado reiteradas vezes por entraves burocráticos. Assistindo o filme, uma audiência que reagiu de forma catártica. Um homem na plateia gritou lembrando que, também num 25 de outubro, mas em 1975, a ditadura assassinou o jornalista Vladimir Herzog. Gritos ainda de “Fora Bolsonaro”, acompanhando os créditos, fizeram a apoteose final.
As pessoas presentes mostraram que a história de Marighella tem a capacidade de afetar um público diverso que mantém viva a luta dele por um Brasil mais justo. Líderes de movimentos sociais, como a Coalizão Negra Por Direitos, artistas que questionam em suas obras as estruturas do patriarcado, do capitalismo e do racismo, como Hiran, Tatau, Margareth Menezes e Vandal; a Brigada Marighella, torcida do Vitória, time por quem Marighella torcia (assim como Wagner); e familiares de Marighella: o filho Carlinhos e os netos Pedro e Maria Marighella.
Foi um reencontro de parte da população soteropolitana com a trajetória de Marighella que, como afirmou Moura, foi apagada dos relatos da história oficial brasileira, contada pelas forças dominantes que tentam diminuir todas as potências de transformação do país. Considerado o inimigo número um da ditadura civil-militar do Brasil, Marighella foi poeta, deputado federal e líder da resistência armada ao regime.
No palco do TCA, também parte do elenco do filme: Bruno Gagliasso, que interpreta o delegado Lúcio, a atriz Bella Camero, que faz a personagem Bella, Ana Paula Bouzas, que interpreta a personagem Ana (os personagens da resistência armada têm os nomes dos atores) e Matheus Araújo, ator que interpreta Carlinhos Marighella no filme. As cenas entre pai e filho, aliás, estão entre os pontos altos. O lançamento de Marighella é uma vitória de todas aquelas e aqueles que reivindicam memória, verdade e Justiça. É a história de um homem que amou o Brasil, um diálogo com todas as pessoas que sonham e lutam por um país que respeite as múltiplas existências.