Com reforma administrativa, governo ataca estabilidade em momento de ‘assédio institucional’

Representante dos servidores avalia debate sobre a PEC 32 como “esquizofrênico”, pois seus defensores não conseguiram mostrar como o projeto do governo melhora o serviço público

Representantes dos servidores que participaram de mais uma audiência pública sobre a “reforma” administrativa, nesta terça-feira (2), afirmaram que o projeto do governo, não traz nenhuma melhoria ao serviço público. À comissão especial da Câmara, alguns voltaram a pedir o arquivamento da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32, apresentada pelo Executivo em setembro do ano passado. Segundo o presidente da Casa, deputado Arthur Lira (PP-AL), a PEC deve entrar na pauta do plenário até o final deste mês.

Trata-se de um “debate completamente esquizofrênico”, disse o presidente do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), Rudinei Marques. “Ninguém até o momento conseguiu mostrar exatamente, de forma inequívoca e com base em evidência, como a PEC 32 melhora o serviço público. Em quê a mudança de vínculos melhora a prestação de serviço público? Afinal, o que nós estamos discutindo? O ministro Paulo Guedes esteve aqui nessa comissão, ele admitiu que a estabilidade é um instituto importante…”

O servidor como inimigo

Para Marques, sem a estabilidade, denúncias de corrupção, por exemplo, não viriam à tona. É um fator importante, acrescentou, “quando temos um assédio institucional sem precedente na história da República”. Algo que acontece em vários órgãos, segundo ele, citando o caso de Alexandre Saraiva, da Polícia Federal. O superintendente foi afastado após enviar ao Supremo Tribunal Federal uma notícia-crime contra o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Mas, em razão da estabilidade, manteve-se no cargo e foi transferido para Volta Redonda (RJ). “Trabalho sob demanda é o que aguarda o servidor público”, afirmou ainda o presidente da federação, apontando outro possível efeito da reforma.

Para o presidente da Associação dos Delegados da Polícia Federal (ADPF), Edvandir Félix de Paiva, o projeto tramita no momento inadequado e de forma errada. “A base principal desse texto é a desmoralização do servidor público. Parte-se da premissa de que o servidor é o inimigo, parasita, o principal mal da economia e dos problemas sociais do Brasil. Por que não foi feito um pacto entre os poderes para fazer uma reforma ampla? Essa reforma não combate privilégio nenhum.”

Nenhum benefício

A secretária de Finanças da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Rosilene Corrêa Lima, avalia que a “reforma” administrativa será “mais danosa” que a da Previdência. “Não é verdade que vai atingir apenas os novos (funcionários). Os atuais também serão fortemente atacados. Será a volta do clientelismo, do oba-oba, da ocupação de cargos por cunho político “, afirmou.

Também para a deputada Erika Kokay (PT-DF), a reforma proposta não proporciona melhoria, mas muda a concepção de Estado. Que passaria, de um instrumento de proteção social, a ser uma “propriedade do governante”. “Esse é o sentido que tem o rompimento da estabilidade. Essa é a PEC da República Velha, do compadrio. Submete o Estado aos interesses privados e à lógica do governante”, acrescentou.

Já o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS) disse que as seguidas reformas propostas nos últimos anos vão obrigar a se acrescentar um neologismo nos dicionários: “deforma”. “Tudo isso é desmonte, não é outra coisa senão a deforma e a deformação do processo.”

Pela proposta do governo Jair Bolsonaro, a estabilidade no serviço público deverá se limitar às chamadas carreiras típicas de Estado. Mas isso dependerá de lei complementar. Os demais seriam contratados por tempo determinado ou indeterminado. Mesmo a efetivação dependerá de avaliações de desempenho. O relator é o deputado Arthur Oliveira Maia (DEM-BA).

RBA

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