Transmissão comunitária da Delta é realidade no DF; médicos alertam para riscos

Quatro dias após confirmar a chegada da variante Delta da covid-19, identificada primeiro na Índia, o Governo do Distrito Federal (GDF) registrou transmissão comunitária da nova cepa na capital do país. Dos 45 casos identificados pela Secretaria de Saúde até o momento, 26 envolvem servidores do Hospital de Apoio do de Brasília (HAB), que enfrenta surto da doença. Representantes da pasta acreditam que o contágio local resultou do contato de parentes dos pacientes com outras pessoas. No entanto, essa possibilidade está sob investigação. Para especialistas, o momento é de apostar na vacinação e de reforçar a cobrança do uso de máscaras, bem como a manutenção do distanciamento social — inclusive para vacinados.

Além dos 26 servidores do HAB, o Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen-DF) identificou outros 13 casos no fim de semana. O reconhecimento das seis primeiras infecções ocorreu na última quarta-feira (21/7). Contudo, os primeiros sintomas apareceram entre 28 de junho e 22 de julho. Três pessoas morreram. “Eram de pacientes que estavam internados e tinham comorbidades. Um deles estava vacinado com uma dose e precisava tomar a segunda. Os outros casos estão sendo apurados em relação à vacinação”, afirmou o secretário de Saúde, Osnei Okumoto, nessa segunda-feira (26/7), em coletiva no Palácio do Buriti.

O chefe da pasta pediu que a população reforce as medidas de prevenção, mas não anunciou novas restrições ou possíveis decretos. “As vacinas possibilitam ter imunidade a partir da segunda dose ou da dose única, mas há uma pequena probabilidade de o vírus ser propagado. Vamos trabalhar com fiscalização, para que não tenhamos aglomerações e para que (as pessoas) usem máscara e álcool em gel”, declarou.

Médico da Sociedade Brasileira de Infectologia, Julival Ribeiro afirma que o aumento de detecções da nova variante gera preocupação. “Principalmente entre os jovens e os não imunizados. Algumas vacinas só têm efetividade contra a cepa após as duas doses”, destaca. Ele alerta que a chegada da Delta fez o número de casos disparar em outros países e que, caso o mesmo aconteça no Distrito Federal, há risco de haver novo colapso do sistema de saúde. “Precisamos ter prevenção e vigilância. É necessário que o governo monitore mais os casos e, caso eles aumentem repentinamente, volte com restrições”, recomenda.

Julival destaca que infecção pela Delta não inclui alguns dos sintomas clássicos da covid-19 e que a cepa é até 60% mais transmissível. “Ela não dá tanta tosse. Dá mais dor de cabeça, dor de garganta e febre. As únicas esperanças são a vacina e que as pessoas continuem com as medidas preventivas, principalmente com uso de máscaras e garantia do distanciamento social”, completa o especialista.

Surto

No domingo (25/7), o Hospital de Apoio divulgou nota informando que passa por um surto da covid-19. Por isso, suspendeu novas internações por sete dias. As equipes da unidade de saúde tomaram outras medidas, como restrição de visitas, isolamento de funcionários públicos e terceirizados que testaram positivo para o novo coronavírus, além de alta temporária dos pacientes assintomáticos.

Até segunda-feira (26/7), houve identificação de 51 casos da doença entre servidores, dos quais 45 tiveram sintomas. Trinta e dois deles foram levados ao Lacen-DF, para sequenciamento de material genético coletado. Nesse grupo estavam os 26 infectados pela variante Delta. Outros três contraíram a cepa Gama — conhecida como P1 —, identificada primeiro em Manaus. “Todos são servidores imunizados, à exceção de quatro pessoas que não tinham tomado a segunda dose. Eles estão sob acompanhamento”, comentou Osnei Okumoto. Dos 390 funcionários do HAB, 180 foram testados e 190 devem fazer exames até sexta-feira (30/7). O secretário reforçou a necessidade da vacinação contra a covid-19, principalmente da segunda dose, para garantir proteção contra um possível agravamento da doença.

Situação

Entre domingo (25/7) e segunda-feira (26/7), o DF teve mais 636 casos confirmados de covid-19 e 10 mortes provocadas pela doença. Cinco delas ocorreram nessa segunda-feira. Com isso, o total de infectados chegou a 446.772, enquanto as vítimas são 9.567. A taxa de transmissão fechou o dia em 0,98 — cada grupo de 100 pessoas com o vírus é capaz de transmiti-lo para outros 98 indivíduos. Com as atualizações, a média móvel de casos subiu 5% em relação a 14 dias antes, o que indica estabilidade. O indicador referente aos óbitos mortes ficou em 10,86, valor 1,2% menor do que o registrado duas semanas atrás.

Na segunda-feira (26/7), a rede pública de saúde teve 78,44% de ocupação dos leitos em unidades de terapia intensiva (UTIs) voltados para o tratamento de indivíduos infectados pelo novo coronavírus. Das 224 vagas, 131 tinham pacientes, 36 estavam livres e 57, bloqueadas. Na rede particular, a taxa chegou a 81,86%, — dos 270 leitos, 168 tinham pessoas internadas e 38 estavam disponíveis.

Atraso na confirmação

Com a Delta, há seis variantes da covid-19 em circulação no Distrito Federal. São elas: Gama (P.1), identificada primeiro em Manaus; Zeta (P.2, Rio de Janeiro); Alpha (B.1.1.7, Inglaterra); além da B.1.1.28 e da B.1.1.143, as primeiras sequenciadas na capital federal. Em fevereiro, o Correio antecipou a informação de que a cepa da Inglaterra havia chegado ao DF. A informação constava no site oficial da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Apesar disso, a Secretaria de Saúde só confirmou a primeira infecção em março.


Palavra de especialista

A variante Delta é extremamente mais transmissível que todas as outras cepas da covid-19 identificadas até agora. Para exemplificar, uma pessoa infectada pelo vírus original podia transmiti-lo para outros dois ou três indivíduos. Agora, alguém com a Delta pode passá-la para cinco ou oito pessoas, se não houver qualquer controle. Esse é o principal problema. Além disso, o contágio dela começa mais cedo. Antes, o período de incubação era de seis dias. Atualmente, com essa, são quatro. No início da contaminação, ela tem carga viral mil vezes maior do que as outras variantes. Ainda não se sabe se ela é mais letal. Isso depende muito do local analisado. Porém, ela pode deixar mais pessoas doentes, e isso pode acarretar em superlotação do sistema de saúde, mesmo com as pessoas vacinadas. Mas não entenda errado. Não é que as vacinas não funcionam. Funcionam e evitam que se tenha a forma grave da doença. Porém, isso só ocorre com quem está com o ciclo vacinal completo, ou seja, com as duas doses aplicadas — ou uma, no caso da Janssen. Por isso, é preciso ter cuidado e prevenir.

Fernando Lucas Melo, pesquisador da Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec) da Universidade de Brasília (UnB)

A Secretaria de Saúde do Distrito Federal aguarda, entre esta terça e quarta-feira (27 e 28/7), a chegada de 43.110 doses de vacinas contra a covid-19. Com a nova remessa, a pasta pretende iniciar a vacinação de pessoas com 35 anos ou mais na quinta-feira (29/7). O atendimento ocorrerá sem agendamento e, assim como no mutirão do último fim de semana, terá 100 pontos de atendimento.

Das 43 mil doses, mil serão destinadas à aplicação do reforço em grávidas. Até segunda-feira (26/7), o DF tinha 1,2 milhão de pessoas vacinadas com a primeira dose e 465,5 mil com o reforço. Além delas, 50.853 receberam o imunizante de dose única.

Nessa segunda-feira (26/7), o secretário-chefe da Casa Civil, Gustavo Rocha, anunciou que, a partir desta terça-feira (27/7), mais de 6 mil profissionais de educação vacinados com a AstraZeneca entre 21 de maio e 2 de junho poderão antecipar a segunda dose. Eles não serão reconvocados. Basta comparecer aos postos de atendimento e apresentar documento de identificação com foto, crachá e cartão de vacinação.

Quem não conseguir ir aos pontos de vacinação hoje poderá se imunizar nos próximos dias. O chefe da Casa Civil também informou que haverá repescagem para 1,9 mil profissionais de educação que, por algum motivo, não receberam qualquer dose. O chamamento será de quinta-feira a sábado (29 a 31/7). É necessário que o nome do servidor público conste em lista divulgada pela Secretaria de Educação. O funcionário deverá comparecer ao ponto de atendimento indicado no documento, com crachá e cartão de vacinação.

A infectologista da clínica Quality Life Joana Darc Gonçalves afirma que a antecipação do reforço teve como base estudos e recomendações técnicas e, por isso, não oferece risco. “É até melhor, pois isso acelera o processo de imunização e não prejudica o desenvolvimento de anticorpos”, argumenta. Ela ressalta que, no caso da AstraZeneca, a antecipação tem previsão na bula. “É uma estratégia razoável e pode gerar algo benéfico, que é diminuir a quantidade de pessoas não protegidas no DF”, finaliza.

Fonte: CB

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