Carestia permanecerá no semestre, com provável alta de juros, dizem analistas

Em junho, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 0,53%, em patamar inferior a maio. Mas o acumulado dos últimos doze meses está em 8,35%. Especialistas avaliam que a carestia permanecerá neste semestre, com provável alta de juros

A inflação oficial, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), registrou alta de 0,53% em junho, acumulando alta de 8,35% nos 12 meses encerrados no mês passado, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados ontem.

O indicador desacelerou em relação a maio, quando registrou alta de 0,83% e ficou abaixo das previsões do mercado. A energia elétrica foi a principal vilã e fez o grupo Habitação ter o maior peso no IPCA, de 0,17 ponto percentual. Analistas alertam que o indicador deverá acelerar em julho, porque o reajuste de 52% na bandeira tarifária da conta de luz por conta da crise hídrica e o recente aumento nos combustíveis e no gás de cozinha vão fazer o IPCA subir entre 0,70% e 1% neste mês.

A mediana das projeções do mercado para a inflação de 2021 está em 6,1%, mas algumas apostas giram em torno de 7%, porque as pressões inflacionárias dos preços administrados estão resistentes e devem ajudar a disseminar a alta dos preços na indústria, no comércio e nos serviços em geral, na medida em que a demanda for aumentando.

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“O IPCA de junho veio um pouco abaixo das estimativas, mas, em julho, deverá avançar em torno de 1% por conta do recente reajuste na gasolina, no diesel e no gás de cozinha”, alertou o economista André Braz, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), que previa alta de 0,65% no IPCA de junho. Pelas estimativas dele, o indicador poderá chegar perto de 9% no fim deste mês e ultrapassar esse percentual em agosto. “A partir de setembro, haverá uma desaceleração e a inflação oficial poderá encerrar o ano em torno de 7%”, apostou. “A energia continua cara e há efeitos indiretos na produção industrial e no frete, por conta do diesel, e isso deverá ajudar a pressionar os preços, principalmente, dos alimentos no segundo semestre deste ano”, destacou. Segundo o analista do FGV Ibre, a crise hídrica deverá afetar os preços dos alimentos, porque há quebra na safra do milho em algumas regiões e o produtor já está tendo que entrar com ração na alimentação dos bovinos.

A alta nos preços das carnes, junto com a gasolina e a energia elétrica, deve continuar ajudando a pressionar o IPCA, alertam especialistas. Eles destacam que a disseminação da inflação continua elevada, em 64% dos itens pesquisados. Ademais, há uma tendência de que a inflação de serviços ganhe força quando o setor ensaiar uma retomada, com o avanço da vacinação. O IPCA em serviços passou de -0,15%, em maio, para 0,23%, em junho, segundo o IBGE. “Ainda que pressões mais relevantes sejam esperadas apenas no ano que vem, a inflação de serviços deve seguir em recuperação parcial nos próximos meses, acompanhando o cenário de atividade e de vacinação”, avaliou a economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria.

Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust, calcula que, apesar da desaceleração em junho, o IPCA vai surpreender para cima nos próximos meses, o que deverá acrescentar um impacto de 0,20 a 0,40 ponto percentual nas projeções do Banco Central. Isso obrigará a autoridade monetária elevar a projeção atual de inflação, de 5,80% para algo entre 6% e 6,20% em setembro. “A demanda ainda está fraca, mas existe uma persistência inflacionária que não foi amenizada pelo câmbio mais desvalorizado em junho, mas que está vinculado ao cenário político imprevisível, e, portanto, deverá continuar mais valorizado”, explicou Velho, que prevê alta em torno de 7% no IPCA deste ano, acima da projeção anterior, de 6,71%. “O que poderá dar uma refrescada na inflação deste ano é se houver uma continuidade da queda do dólar. Só assim será possível evitar que o IPCA fique acima de 7% neste ano e acima de 4% em 2022”, acrescentou.

Pobres sentem mais

O IPCA mede a inflação das famílias com renda de cinco a 40 salários mínimos. Enquanto isso, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede o custo de vida dos mais pobres e corrige o piso salarial, mostra que a carestia está doendo mais no bolso das famílias com renda mensal de até cinco salários mínimos.

O INPC registrou alta de 0,60% em junho em relação ao mês anterior e acumulou alta de 9,22% em 12 meses, o maior patamar desde agosto de 2016, conforme os dados do IBGE, com Recife e Salvador liderando a alta mensal, de 0,90%, e Brasília com a menor variação entre as 16 capitais pesquisadas, de 0,14%.

Essa forte alta nos preços tem feito a família da estudante Christiany Paschoal, 42 anos, mudar vários hábitos. Ela está desempregada, e, para manter o sustento dos quatro filhos, monitora as luzes dos cômodos. A renda da família, que mora na Bahia, vem apenas do marido atualmente “Antes, dormíamos todos os dias com o ar condicionado ligado. Estamos evitando isso. O bom é que as temperaturas de Salvador caíram um pouco e dá pra levar. Banho com chuveiro elétrico somente durante o dia e com a água gelada mesmo”, disse.

José Uendel de Souza, 22, morador de Palmas (TO), trabalha na área de comunicação em dois empregos e mudou os hábitos de compra. “Desde a pandemia, muitos alimentos vêm ficando cada vez mais caros. O jeito é partir para a substituição dos produtos mais caros, como queijo, óleo, feijão e maionese por alimentos alternativos que tenham um valor nutricional igual ou semelhante e que estejam com preço mais baixo no supermercado”, afirmou.

Fonte: CB

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