Deputados bolsonaristas tentam manobra na CCJ para aprovar “home schooling” ou “escola em casa”

A presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, deputada Bia Kicis (PSL-DF) tenta manobrar para aprovar um projeto que altera o Código Penal. A ideia é facilitar a aprovação do Projeto de Lei (PL) nº 2401/2019 encaminhado pelo governo, que regulamenta o ensino domiciliar (home schooling), uma promessa de campanha do presidente Bolsonaro.

A manobra inclui aprovar o projeto que altera o artigo 246 do Código Penal, exatamente o artigo que caracteriza como crime o ato de famílias optarem pelo ensino em casa. Este projeto, PL 3262/19, está na pauta desta quinta-feira (10) da Câmara, de autoria de Kicis e das deputadas Chris Tonietto (PSL-RJ) e Caroline de Toni (PSL-SC). Se aprovado, na prática, fica autorizado aos pais não mandarem os filhos para escola.

A manobra legislativa ficou clara porque este PL estava inicialmente apensado ao texto do home schooling, que visa instituir a modalidade de ensino residencial no Brasil. Ele foi desanexado e agora tramita independentemente..

Para Janine Ribeiro, ex-ministro da Educação no governo de Dilma, é uma pauta para desviar o foco das verdadeiras questões da educação que deveriam estar sendo priorizadas pelo governo. Por exemplo, ampliar o processo de alfabetização, ter salas de aula com menos alunos para que os professores possam dar mais atenção, ou, ainda, tornar a carreira dos professores mais atrativa. “A profissão tem sido depreciada, em especial na questão salarial”, diz.

“O estrago pode ser grande”, afirma o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo. “Se vigorar uma lei assim no Brasil, teremos um aprofundamento das desigualdades social e educacional. Poderá haver evasão escolar”, completa.

“Daí pra frente haverá um aumento da violência e da desproteção a crianças e adolescentes já que o Estado estará desobrigado de garantir o direito humano à educação”, prevêHeleno. Ou seja, se é permitido deixar a criança em casa, sem nenhuma responsabilização, fica sem efeito o direito a ter acesso ao ensino.

Também a segurança alimentar das crianças ficará comprometida com a educação domiciliar. “Tem muita família de baixa renda em que as crianças têm na escola suas principais refeições do dia. Sempre dissemos isso – que matricular a criança na escola garante a segurança alimentar dela”, afirma Heleno.

“A escola poder ter defeitos, precisa melhorar, se tornar mais atraente, ter novos métodos de ensino, tudo isso é verdade. Mas a escola ainda é uma grande invenção para socializar a criança”, avalia o ex-ministro Janine.

Para ele, cada um de nós nasce em um ambiente único, fechado e por melhor que seja, está limitado a um grupo cultural, religioso, de classe social e a escola é uma maneira de perceber que existem outras formas de vida além da própria. “Esses fatores são de vital importância para o desenvolvimento intelectual e cognitivo da criança”, completa.

Sobre o papel dos docentes, Janine é enfático: “O professor é preparado para ensinar. Isso é pedagogia, é conduzir a criança para o conhecimento. É extremamente difícil que um pai ou uma mãe vá conseguir cominar todas as matérias para ensinar o filho. E não basta conhecer o assunto, tem que ter formação, tem que saber ensinar”.

Se aprovado na CCJ, o PL seguirá para votação no Plenário da Câmara. Por não incluir a questão “educação” diretamente no texto, já que propõe alterar apenas o texto do código penal, o PL não passará pela Comissão de Educação.

A secretária de Finanças da CNTE, Rosilene Correia, avalia que “é um absurdo o governo trazer essa questão como pauta prioritária em plena pandemia, enquanto milhares de estudantes estão sem acesso à escola virtual durante a crise sanitária, por falta de condições, sem internet, nem material de acesso.

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