Após cobrança de reitores e parlamentares, MEC acena com desbloqueio e recomposição do orçamento das universidades federais

Reitores e entidades sindicais alertaram que as universidades públicas podem fechar as portas no segundo semestre deste ano, caso não seja executada a recomposição e desbloqueio do orçamento destinado ao setor. O alerta foi feito, nesta quarta-feira (2), durante audiência pública realizada pela Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara que debateu o tema. O deputado Leo de Brito (PT-AC) foi um dos proponentes do debate.

O quadro caótico apresentado pelos debatedores levou o secretário Adjunto de Educação Superior do Ministério da Educação, Tomás Dias de Sant’ana, ao final da reunião, a acenar com a possibilidade de desbloqueio dos recursos e a recomposição do orçamento das universidades federais.

O deputado Leo de Brito comemorou o resultado da audiência. “Essa é uma bandeira do nosso mandato e só vamos descansar quando nós tivermos as universidades federais funcionando como devem funcionar atendendo nossos estudantes”, afirmou.

O parlamentar lembrou o papel estratégico das universidades para o País. Ele disse ainda que além do desbloqueio e da recomposição do orçamento, é necessário mais investimentos nas universidades.

“Queremos que haja expansão porque as universidades precisam chegar em todos os cantos do Brasil, como aconteceu nos governos Lula e Dilma quando foram abertos 173 novos campis e 18 novas universidades federais foram criadas, tivemos o dobro de matrículas naquele período, o que permitiu com que jovens tivessem acesso às universidades com bolsas de assistência estudantil, que estão sendo retiradas agora. Precisamos de investimento para fortalecer as universidades federais, para isso a Emenda Constitucional 95 que retira recursos da educação precisa ser revogada”, defendeu o deputado acriano.

Durante o debate, a reitora da Universidade Federal do Acre (UFAC), Margarida Aquino Cunha, representando a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), explicou que este é o quinto ano que as universidades vêm sofrendo redução orçamentária. E essa redução, segundo ela, ocorre nos quesitos investimento e custeio. Ela conclamou o Congresso Nacional para ajudar nessa jornada.

“Os parlamentares aqui representados podem nos ajudar, apresentando um PLN suplementando o valor no nosso orçamento, lutando junto conosco nesse dia a dia que tá tão difícil, auxiliando nessa recomposição, na verdade, do orçamento”, sugeriu a reitora, no que foi prontamente atendida.
Justificativa

Ao justificar a proposição do debate, o deputado explicou que a verba disponível para investimentos e manutenção em 2021 caiu ao patamar de 2004. “No entanto, o Brasil agora tem mais que o dobro de alunos de 17 anos atrás. Por isso, algumas das mais importantes instituições, como UFRJ e Unifesp, já falam em interrupção das atividades a partir de julho”, argumentou Leo de Brito em seu requerimento de informação ao Ministro da Educação sobre o orçamento defasado para as universidades federais.

Painel orçamentário

O parlamentar aponta que, segundo o Painel do Orçamento Federal, estão livres em 2021 o montante de R$ 2,5 bi para as 69 universidades e 1,3 milhão de estudantes. “Esse valor é praticamente o mesmo do orçamento de 17 anos atrás (com os valores atualizados pelo IPCA). No entanto, naquele momento, eram 574 mil alunos e 51 instituições”, esclareceu o deputado em sua justificação.

Leo de Brito destaca o pedido de socorro da reitoria da Unifesp. “Para se ter ideia, a principal ação orçamentária, onde se encontram alocados os recursos para funcionamento da universidade, incluindo as despesas básicas como energia elétrica, água, limpeza, manutenção, vigilância, insumos para laboratórios de graduação, entre outros, que em 2020 foi de R$ 66 milhões, hoje, na prática, é de R$ 21,1 milhões, suficientes para manutenção das atividades até o mês de julho”, informa a instituição.

Cortes consecutivos

A representante da Andifes Margarida Aquino Cunha lembrou que o Ministério da Educação teve um corte de R$ 1 bilhão em relação à Lei Orçamentária de 2020. “Isso tem uma consequência muito grande. Uma consequência onde a gente não vai ter uma capacidade de pagamentos de terceirizados e a gente fala que a universidade ela gera emprego também, e esses anos todos, nós estamos reduzindo contratos e, com isso, pais e mães de família desempregados. É mais um ano que a gente vai viver um ano drástico, se isso permanecer”, lamentou.

Segundo ela, o bloqueio de 13% do orçamento, feito pelo governo Bolsonaro, tem gerado angústia nos reitores das universidades públicas. Ela explicou que esses reitores têm denunciado nos órgãos de imprensa que, com o corte e o bloqueio orçamentário, umas universidades chegam até agosto, outras até setembro.

“Nós conseguimos trazer o recurso do ano passado para esse ano, por isso a gente só conseguiu pagar energia, contrato de limpeza e segurança. No entanto, isso não, não vai contemplar o funcionamento das universidades no ano de 2021. E a solução, nesse caso, seria um decreto para o desbloqueio e uma compensação no âmbito do executivo, poupando aí essa restrição das universidades. Quem de fato pode fazer isso é o governo federal”, apontou.

Dever de casa

O reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), João Carlos Salles Pires da Silva, disse que as universidades brasileiras têm se defrontado com a situação de redução efetiva de orçamento. Para ele, as instituições de ensino superior têm feito o dever de casa. “As universidades, ao longo do tempo para enfrentar a defasagem, têm feito reduções no seu orçamento. Quais de nossas universidades não fizeram reduções de contratos que implicaram demissões de terceirizados? Quais não procuraram medidas de eficiência para diminuir, ou melhorar o gasto? Todos nós procuramos, com nossa sabedoria, com nossa inteligência na universidade, falta muita coisa, mas não falta inteligência. Então, nós procuramos, com toda a nossa força, fazer essas preparações”, esclareceu o reitor.

Visão amesquinhada

No entanto, João Carlos Salles afirmou que a redução de gasto não é projeto. “Só pode ser projeto a redução de gasto pra quem tem uma visão amesquinhada de universidade”. Segundo ele, a redução é método, é meio de enfrentar dificuldades, “não podemos fechar os olhos, a crise atual que enfrentamos, sem dúvida alguma, mas o nosso projeto não pode ser uma redução de o que precisa expandir-se ainda exatamente para cumprir de maneira digna, correta, adequada, aquelas metas elevadas que todos nós aqui estamos afirmando”.

Asfixia

O reitor da UFBA lembrou que as universidades têm hoje é um corte afetivo, temos um bloqueio afetivo. “Temos uma situação de asfixia, além de outros elementos políticos que não são afeitos a essa, a essa audiência e eu não posso deixar de fazer esse apelo aos senhores parlamentares, dizendo exatamente da urgência, da gravidade desse momento. Nunca tivemos um momento tão grave para as universidades públicas que podem, sim, se desestruturar, sim, ser levadas a situação extrema, de sacrifício da sua própria natureza”, sentenciou.

Apagão no ensino superior

A reitora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Denise Pires de Carvalho, relatou um quadro dramático que o corte orçamentário pode causar na educação superior do País.
“Com esse corte em 2020, 2021 impede o nosso funcionamento básico. O pagamento de contas de água, de luz, a redução nas contas de luz da Universidade Federal do Rio de Janeiro foram muito pequenas, mostrando que a menor parte da universidade é a sala de aula com a luz acesa e o ar condicionado ligado. A maior parte está nos laboratórios de pesquisa, mais de mil e quinhentos [alunos, professores, pesquisadores, trabalhadores] na Universidade Federal que não pararam nenhum dia. O ensino está remoto, mas as atividades de pesquisas estão acontecendo diariamente nos nossos laboratórios, atendendo, continuamos trabalhando pra atender as demandas da sociedade”, explicou.

Para ela, não haverá como pagar a conta de luz, a conta de água e os terceirizados. O que afetará diretamente na economia do País, uma vez que aumentará também o número de desempregados quando rescindir os contratos de limpeza e manutenção dos campi, “estamos aumentando o desemprego no País, o que nenhum de nós quer”.

Educação é investimento

Denise Pires de Carvalho também fez um apelo aos parlamentares para que se lute pela recomposição e desbloqueio do orçamento à educação. “Recomposição orçamentária mesmo entendendo que o País passa por um momento de dificuldade financeira, de ajuste fiscal, a um teto de gastos, mas nós não somos gastos, nós somos investimentos”, ponderou.

O reitor da Universidade Federal De São Paulo (Unifesp), Nelson Sass, também é da opinião que a educação deve ser entendida por todos como investimento no futuro do País. “Do ponto de vista das universidades como um todo, que sejam entendidas, realmente, como investimento”.

Ele defende que a qualificação da metodologia do planejamento orçamentário, a cada ano, seja baseada em evidências. “Aqui se fala em evidências, a gente fala em evidências científicas, mas também, nós precisamos ter modelo, nós precisamos atuar baseado em evidências, uma gestão baseada em evidências e que respeite esse papel fundamental das universidades, mas que também respeite as singularidades, as necessidades e o papel estratégico do sistema universitário para desenvolvimento do País”, afirmou.

Benildes Rodrigues

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