A Universidade de Brasília (UnB) criou um projeto para desenvolver máscaras que inativam o vírus da covid-19. Esse é o primeiro material nacional que não depende de insumos de outros países a ser desenvolvido no Brasil. Batizado de Projeto Égide, a pesquisa para o desenvolvimento da máscara teve início em março de 2020 e agora, um ano depois, está em fase de teste clínico no Hospital Regional da Asa Norte (Hran). Desenvolvida em três camadas e com uso da substância quitosana, retirada da casca de crustáceos, como camarões e lagostas, as máscaras do projeto Vesta, como é nomeado pelos pesquisadores, têm a capacidade de inativar o vírus.
O mecanismo que permite essa propriedade é curioso: os materiais da máscara atraem o Sars-CoV-2 devido a uma atração eletrostática que, para o vírus, sinalizaria possibilidade de contaminação da célula do hospedeiro. Graças à quitosana, a membrana do novo coronavírus é envolvida e degradada. Isso faz com que o Sars-CoV-2 perca toda a capacidade contaminante.
A fase atual dos testes clínicos começou nesta segunda-feira (1°/3). As máscaras foram entregues aos profissionais de saúde da linha de frente no combate à pandemia, como pronto-socorros, enfermarias e Unidades de Terapias Intensivas (UTIs) da covid-19. Após o uso da máscara, os profissionais a recolhem em envelopes lacrados para que o material seja analisado em testes laboratoriais.
A expectativa é que o projeto obtenha o resultado dos testes clínicos no começo de abril. A Vesta já foi aprovada pelo Comitê de Ética e, quando obtiver os resultados dessa última fase, será direcionada para a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Dificuldades do projeto
No entanto, toda essa pesquisa multidisciplinar feita por profissionais da área da saúde e da engenharia não é fácil. Os pesquisadores sofrem com a falta de recursos para acelerar o desenvolvimento do processo. Em uma tentativa de contornar a situação, eles recorreram a uma vaquinha on-line na qual já arrecadaram R$ 40 mil, valor ainda insuficiente para todos os gastos demandados pela pesquisa.
O Projeto Égide também se submeteu a editais para conseguir financiamento da pesquisa realizada. Contudo, o valor ainda não foi entregue. A submissão ao edital foi realizada em maio de 2020 e a tramitação está com a Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec). No entanto, a burocracia torna lento um processo que deveria ser urgente. O edital está prestes a completar aniversário sem que os pesquisadores recebam o incentivo.
Aline Midori, terapeuta ocupacional, servidora da UnB no campus de Ceilândia e professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Reabilitação (PPGCR) é uma das participantes do projeto. Aline ressalta que o estudo é complexo e, por isso, requer dinheiro para gerar e continuar a pesquisa. “Nós, pesquisadores, estamos tendo que adotar várias estratégias para lidar com isso, uma delas é tirar dinheiro do nosso bolso para dar continuidade e fazer a vaquinha”, conta.
Apesar das dificuldades, Aline não desanima. “Vamos tocar o projeto, não importa como. Embora a maioria de nós estejamos fazendo um trabalho voluntário, sem nenhum tipo de remuneração porque não temos financiamento nem mesmo para o desenvolvimento da pesquisa, todos estão se doando ao máximo para agilizar essa pesquisa, que já foi feita em tempo recorde mesmo com todos esses desafios”.
Encontro de conhecimentos
Aline também pontua que a pesquisa é feita com a interação de conhecimentos de diversos campos. “É um casamento de diversos saberes, de diversos profissionais que se unem em prol de um único objetivo. A UnB está com o projeto em seus três campus, o Darcy Ribeiro, o de Ceilândia, focado nas áreas de saúde, e do Gama, que comporta as engenharias”, ressalta.
A pós-doutora em engenharia de materiais e professora visitante no Programa de Pós-graduação em Engenharia Biomédica da UnB do campus do Gama, Glécia Luz, explica que o objetivo do projeto é alcançar o melhor custo benefício para a comunidade. “O nosso objetivo é que a comunidade consiga utilizar essa máscara. Mas, claro, esse caminho de produção de conhecimento na universidade é um caminho longo e árduo, e, nessa fase clínica dos testes, o gasto é mais oneroso porque tem transporte, amostras a serem enviadas para a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e diversas outras despesas”.
Glécia confessa que, não fosse o apoio da comunidade, dos pesquisadores e dos profissionais de saúde não seria possível alavancar o projeto. “É toda essa equipe que faz o Vesta acontecer. Os pesquisadores que doam seu tempo e trabalho, os profissionais do Hran que fazem parte dessa pesquisa e estão contribuindo bastante conosco e, claro, a comunidade que ajuda no desenvolvimento com as doações e divulgações”, finaliza.
Como ajudar:
É possível acessar o link da vaquinha on-line e também realizar doações via PIX pelo CPF: 825.716.001-68, da coordenadora do Projeto Égide, Suelia de Siqueira Rodrigues Fleury Rosa.
Fonte: Correio Braziliense