Ministério da Saúde diz que revogação de portaria de saúde mental é “fake news”. Entidades e parlamentares reagem!

Por Erika Kokay

O Ministério da Saúde afirmou ser “fake news” a revogação de portarias que desmonta a saúde mental no Brasil. Parlamentares e entidades da sociedade civil reagiram à declaração feita, nesta quarta-feira (09/12), durante reunião da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Reforma Psiquiátrica e da Luta Antimanicomial e da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM). O encontro contou com a participação do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos (ACNUDH). 

A deputada federal Erika Kokay (PT-DF), coordenadora da Frente Parlamentar, lembrou que não houve qualquer posicionamento do Ministério da Saúde sobre a possibilidade de revogação de 100 portarias que regulamentam a política de saúde mental. Ela defendeu que nenhuma alteração seja feita sem um debate amplo e democrático com quem constrói a política de saúde mental no país. 

“O governo açoita a Constituição, usurpa o papel do Congresso e desconstrói a legislação brasileira, além de trazer de volta o holocausto dos hospícios e manicômios. O Ministério da Saúde agora financia choques elétricos e leitos psiquiátricos. Hospício cronifica a doença e priva o paciente do convívio com as pessoas. A liberdade é terapêutica”, declarou a parlamentar.

Kokay informou ter sido solicitada uma reunião com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM/RJ), além de um levantamento das condições jurídicas para impetrar uma ação popular na Justiça contestando o “revogaço”.

O deputado federal Helder Salomão, presidente da CDHM, seguiu na mesma linha. “Se é fake news, foi uma irresponsabilidade do ministério não ter desmentido imediatamente de forma oficial esse ‘revogaço’. É uma constante desse governo mudar de posição quando surge a pressão popular”, afirmou. 

Fake News

“Até o momento nada foi revogado, até agora são estudos. Hoje mesmo, foram liberados R$ 100 milhões para os Centros de Atenção Psicossocial. Ou seja, não queremos acabar com os Caps e até novembro habilitamos 83 novos centros. Quando há troca de governo, sempre há mudanças, é democrático. Hoje o manicômio é na rua, nos presídios. Faltam leitos para internação”, adiantou Raphael Parente, responsável pela Secretaria de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde.

O representante do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, informou ainda que não há previsão para discutir o tema nas próximas reuniões das Comissões Intergestores Bipartite e Tripartite.

Ele disse que “revogação e desmonte são fake News”. “Quanto tempo mais, essa semana, pessoas que tem um papel importante na sociedade vão passar discutindo coisas falsas?”, questionou. 

Em seguida, Maira Pinheiro, também do Ministério da Saúde, reiterou que “o que está sendo discutido é absolutamente mentira”. Porém, de forma contraditória afirmou quererem “revogar portarias obsoletas, acabar com o estigma do doente mental”. 

“É vergonhoso questionar a importância dessa reunião, é um desrespeito dos integrantes do governo federal dizer que estamos perdendo tempo discutindo fake news. Quando é para inaugurar exposição de roupas usadas, não é perda de tempo. É um desmonte, sim. Um retrocesso”, apontou Talíria Petrone (PSOL/RJ).

“Estamos indignados com as palavras do governo federal, desqualificando as entidades que lutam por uma saúde pública democrática e com controle social respeitado”, protestou Régia Prado, do Conselho Federal de Serviço Social (CFESS).

Ana Carolina Khouri, da Associação Nacional de Defensoras e Defensores Públicos (Anadep), ponderou estarem “extremamente preocupados com essa possibilidade de retrocesso no atendimento da rede psicossocial”. “A Corte Interamericana de Direitos Humanos já impôs, em 2006, ao Brasil, uma condenação por violência dentro de instituições psiquiátricas.” 

A assessora do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos (ACNUDH), Angela Pires Terto, citou relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) que recomenda mais investimentos por parte dos Estado em políticas de saúde mental. “O relatório demonstra preocupação com sistemas que têm se mostrado inefetivos, que apostam numa excessiva medicalização, na coerção e na institucionalização, o que favorece a estigmatização, a discriminação, o desempoderamento e o desamparo”, afirmou Angela, ao destacar os princípios da dignidade, da autonomia e da participação. 

Entre as sugestões encaminhadas durante a reunião estão: a garantia de que o Ministério da Saúde consulte os conselhos profissionais e entidades nacionais representativas das profissões do SUS e de usuários de saúde mental; que mudanças nas políticas públicas de saúde mental e drogas sejam debatidas na Comissão Intersetorial de Saúde Mental do Conselho Nacional de Saúde; e que o ministério retome a publicação do Saúde Mental em Dados. 

As recomendações foram recebidas por Raphael Parente. As alterações deverão ser debatidas em audiências públicas convocadas pelo Congresso Nacional e o ACNUDH deverá criar estratégias para que o tema se torne prioritário.

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