Vários países do mundo estão abandonando a produção de eletricidade com fonte nuclear. Mas no Brasil, mesmo em meio à crise pandêmica anuncia-se uma festa em Caetité (Bahia), no início de dezembro, para saudar a retomada da mineração de urânio, exigido pela tecnologia das usinas nucleares, ou “chaleiras radioativas”.
Erros de engenharia na cava da jazida Cachoeira, primeira lavra a céu aberto, exigiram a interrupção da mineração, há 6 anos. A exploração de um veio subterrâneo na mesma jazida mostrou-se inviável. Agora começa no Engenho, a exploração da segunda jazida a céu aberto. A comemoração prevê até concurso entre os trabalhadores da Indústrias Nucleares do Brasil (INB) que quiserem tirar foto ao lado do ministro das Minas e Energia.
No seu delírio, os nucleopatas querem gastar mais de R$ 15 bilhões para concluir a obra da terceira “chaleira” em Angra dos Reis (Angra 3), construir outras 6 novas na beira do Rio São Francisco e iniciar também a mineração de urânio em Santa Quitéria, no Ceará.
Não se sabe ainda de onde virá esse dinheiro. Mas o que todos sabem é que 20 anos depois de iniciar a mineração na Bahia, a INB nunca apresentou publicamente um relatório de encerramento da exploração da primeira mina de Caetité, os prejuízos que teve e os estragos deixados na área, poluindo águas superficiais e subterrâneas, contaminando o solo, o ar, a flora e a fauna, provocando câncer e outras doenças na população.
Além de todas as outras mentiras que contam, a tecnologia das “chaleiras radioativas” não é segura, nem barata e muito menos limpa. O “lixo” radioativo que sai delas, como combustível usado, precisa de milhões de anos para se desfazer. Só o plutônio, que está nesse lixo, precisa de 24.100 anos para que a metade da sua massa deixe de ser radioativa.
Há muitos estudos sobre os efeitos daninhos da mineração de urânio na Bahia:
2007 – Universidade Estadual de Santa Cruz (Ilhéus/Ba) mostrou que a incorporação do urânio em dentes de moradores de Caetité é 100 vezes maior que a média mundial;
2008 – Relatório do Greenpeace provou contaminação da água no entorno da mina, comprovada depois pelo então Instituto de Águas da Bahia;
2013 – Pesquisa da Fiocruz indicou 21 casos de câncer (17 mortos e 4 pessoas em tratamento) em povoados próximos à mina da INB, e 113 casos suspeitos de nexo com a atividade da mineração;
2015 – Oncologista Marcelo Cruz, do Hospital São José (SP) registrou índice de câncer em pulmão causado por radônio – gás liberado por minerais, em especial em mineração do urânio – 19 vezes mais alto em Caetité que no resto do estado da Bahia, e dezenas de vezes mais alto que o limite aceitável pela ONU;
2015 – Segundo o Instituto Multidisciplinar em Saúde da Universidade Federal da Bahia (Vitória da Conquista), a presença de urânio em amostras de leite materno, coletadas em 131 mulheres, é duas a 300 vezes acima do limite das 30 miligramas aceitável pela OMS;
2018 – Laboratório de Pesquisa e Informação Independente sobre Radioatividade, da França indicou nível de urânio mais elevado que 15% (taxa de referência) em amostras de cabelo de 7 trabalhadores da ativa e um ex-trabalhador, sendo em um deles quase 70 vezes maior;
2019 – Pesquisadores da Universidade Federal da Bahia avaliaram o impacto da mineração sobre o ambiente e sobre a saúde de trabalhadores e das populações do entorno da mina. A situação encontrada foi tão grave que recomendaram a imediata interdição da atividade atômica até que fosse garantido o controle absoluto do risco radioativo.
Segundo eles, a exposição à radiação ionizante na região não é causada só pela radiação natural, como a INB tenta fazer crer; e o descontrole nas atividades atômicas leva para fora dos limites da área da empresa o risco de exposição aos produtos resultantes da cadeia de decaimento do minério, como o radônio, o césio e o polônio, elementos mais perigosos que o próprio urânio.
Por conhecerem muito bem a tragédia que envolve o completo ciclo de produção da energia nuclear, Caetité, a Bahia e o Brasil repudiam e denunciam a insanidade com que o governo brasileiro tenta ampliar o uso da tecnologia das “chaleiras radioativas” em nossa matriz energética e exigem o fim do programa nuclear brasileiro, com reconhecimento público dos direitos dos atingidos, direta e indiretamente, pela contaminação radioativa, com indenização e assistência integral à saúde das vitimas.
1º de Dezembro de 2020
Articulação Antinuclear Brasileira
Coalizão por um Brasil Livre de Usinas Nucleares
Conexão Virtual Antinuclear