As deputadas Professora Rosa Neide (PT-MT) e Margarida Salomão (PT-MG), Erika Kokay (PT-DF) e o coordenador do Núcleo de Educação do Congresso Nacional, deputado Waldenor Pereira (BA) classificaram como cínica e mentirosa a declaração postada pelo presidente Jair Bolsonaro em sua conta no Twitter, nesta quarta-feira (22), em que tenta se colocar como o responsável pela aprovação do Novo Fundeb (PEC 15/15). Os parlamentares lembraram que, desde que tomou posse em janeiro de 2019, nem o presidente Bolsonaro ou qualquer de seus quatro ministros da Educação até aqui (Ricardo Vélez, Abraham Weintraub, Carlos Decottelli ou o atual Milton Ribeiro) deram qualquer contribuição às discussões do texto debatido, votado e aprovado na Câmara. Segundo os parlamentares, o governo Bolsonaro somente jogou contra o Novo Fundeb.
No tuíte postado em seu perfil oficial, Bolsonaro disse o seguinte: “Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Um governo que faz na educação. Transformamos o Fundeb em Permanente, aumentamos os recursos e o colocamos na Constituição”. Segundo a deputada Professora Rosa Neide, vice-presidente da Comissão Especial que analisou a PEC do Novo Fundeb (PEC 15/15), a declaração de Bolsonaro não corresponde à verdade.
“O governo Bolsonaro não participou de nenhuma discussão para a construção do Novo Fundeb. O substitutivo da deputada Professora Dorinha (DEM-TO) passou praticamente o ano todo de 2019, e até agora em 2020, em discussão na Câmara e em todo País. Nas poucas reuniões que fizemos no Ministério da Educação, com então ministro (Abraham) Weintraub, ele não deu nenhuma importância (ao tema), parecia que tratar de 63% dos recursos investidos em educação no Brasil não eram da responsabilidade dele”, revelou.
Além do desprezo do governo Bolsonaro na construção do Novo Fundeb, debatido na Câmara dos Deputados em mais de 100 audiências públicas com especialistas, profissionais da educação e entidades ligadas ao setor, a parlamentar lembrou que o governo ainda tentou destruir o texto aprovado na Comissão. No último sábado (18), já sabendo que o Novo Fundeb (PEC 15/15) seria votado a partir da segunda (20), o ministro Luiz Eduardo Ramos (da Secretaria de Governo da Presidência da República) enviou uma proposta alternativa ao líderes partidários.
Com apoio da equipe econômica do governo (leia-se ministro Paulo Guedes), a proposta empurrava para 2022 o início da vigência do Fundo, que termina no dia 31 de dezembro deste ano. Em nenhum momento o governo falou o que iria acontecer com os repasses de recursos para a educação básica em 2021.
O governo ainda propôs que 5% dos 10% a mais que o texto do Novo Fundeb obrigava o governo a investir na educação básica, pudesse ser aplicado no Renda Brasil, para financiar a entrada de crianças em situação de extrema pobreza em creches, mediante ao pagamento de um voucher (vale) de R$ 250. O objetivo do governo com a manobra era para escapar da Lei do Teto de Gastos, uma vez que os gastos com o Fundeb não são alcançados pela lei.
As duas propostas foram prontamente rechaçadas por especialistas, profissionais da educação e gestores públicos, que sempre defenderam que os recursos do Novo Fundeb fossem aplicados exclusivamente na educação básica.
O governo ainda propôs alteração no texto da PEC que reservava, no mínimo, 70% do Fundo para o pagamentos dos profissionais da educação. A proposta do governo colocava o percentual de 70% como o máximo a ser gasto com profissionais do setor, e ainda permitia que estados e municípios incluíssem nesse montante o pagamentos de aposentadorias e pensões. Apesar da tentativa, todas as alterações no texto da PEC do Novo Fundeb foram rejeitadas.
“O governo Bolsonaro é cínico! Depois de ser derrotado pelo movimento em favor da educação pública de qualidade tenta se apropriar do Fundeb. A única coisa que Bolsonaro fez foi tentar impedir que a educação vencesse”, declarou Erika Kokay.
“Na última hora o governo quis esquartejar o texto, mas a mobilização da educação no Brasil foi muito forte. Vendo que iria perder, o governo acabou cedendo e participou da votação. Agora quer surfar na onda da aprovação do Novo Fundeb”, observou Rosa Neide.
Para Waldenor Pereira, a vitória da permanência definitiva do Fundeb foi resultado da pressão das entidades da educação (CNTE, UNE, UBES, ANDIFES, CONSED e UNDIME), dos parlamentares da oposição ligados ao setor e do apoio de 20 governadores.
“Valeu a nossa mobilização, porque foi o conjunto das forças envolvidas na defesa do Fundeb que impôs nova derrota acachapante ao governo Bolsonaro, que queria tirar 5% dos recursos para o projeto Renda Brasil, incluir os gastos com pagamentos dos inativos e desvincular o percentual mínimo de 70% para os trabalhadores da educação. Isto acabaria com Fundeb. Mas a pressão foi muito forte, os parlamentares receberam milhares de e-mails e mensagens e acabaram nos apoiando”, comemora Waldenor Pereira.
Cinismo de Bolsonaro
A deputada Margarida Salomão lembrou que além de não ter participado da construção do Novo Fundeb, até o último momento o governo tentou derrubar a votação do texto na Câmara. “Eu vejo essa declaração como uma demonstração de um cinismo revoltante. Mais uma vez Bolsonaro aposta na ignorância e no desconhecimento de quem não acompanhou todo o processo de construção dessa proposta, para criar uma falsa narrativa”, afirmou.
De acordo com a parlamentar, Bolsonaro tenta se apropriar de uma vitória que é “da sociedade, dos trabalhadores da educação e também dos parlamentares que construíram essa articulação dentro da Câmara que impediu a manobra do governo e conseguiu derrotá-la”.
Em 2019, o repasse de 10% do governo federal para o Fundeb foi responsável pela aplicação de R$ 16 bilhões na educação básica. Após intensa pressão da sociedade e de entidades ligadas à educação, foi firmado um acordo no qual o governo aceitou que a sua participação no financiamento do Fundeb aumentasse dos atuais 10% para 23%, até 2026. O substitutivo da deputada Professora Dorinha (DEM-RJ) inicialmente estipulava essa participação em 20%.
Senado
A batalha agora será no Senado, onde a PEC 15/15 passa a tramitar e pela mobilização e a urgência do projeto, Waldenor Pereira acredita que vai a plenário sem demora. É que o Fundeb como foi criado, terminaria em dezembro próximo, mas a PEC o torna permanente. O deputado explica que a proposta precisa ser votada antes do segundo semestre legislativo, porque é preciso incluir os recursos do fundo nas leis orçamentárias (LDO e LOA).
Criado em 2006 como temporário, Fundeb tem vigência só até dezembro deste ano. Ele financia cerca de R$ 6,5 de cada R$ 10 investidos nas escolas públicas brasileiras. Hoje, 90% dos recursos do Fundeb vêm de impostos coletados nos âmbitos estadual e municipal, e os outros 10% vêm do governo federal. O Fundeb foi criado pelo Governo Lula, tendo Fernando Haddad como ministro da Educação, para toda a educação básica e pública brasileira. Veio substituir o antigo Fundef, do Governo FHC, que contemplava apenas o ensino público fundamental.
Apesar do acordo, o primeiro turno da votação da PEC contou ainda com 7 votos contrários à aprovação do Novo Fundeb, todos de deputados confessadamente bolsonaristas. São eles: Bia Kicis (PSL-DF), Chris Tonietto (PSL-RJ), Filipe Barros (PSL-PR), Junio Amaral (PSL-MG), Luís Phellipe de Orleans e Bragança (PSL-SP), Márcio Labre (PSL-RJ) e Paulo Martins (PSC-PR). No primeiro turno de votação o placar foi de 499 votos favoráveis ao novo Fundeb e 7 contrários. Já no segundo turno, foi de 492 votos a favor da PEC 15/15 e seis contra.
Héber Carvalho do PT na Câmara