Jornal GGN – O Banco do Brasil anunciou, no início do mês, a venda de carteiras de crédito de R$ 2,9 bilhões, a maior parte em perdas, a um fundo administrado pelo banco BTG Pactual, fundado nos anos 80 pelo hoje ministro de Bolsonaro, Paulo Guedes. A operação chamou a atenção por se tratar da primeira cessão de carteira do Banco do Brasil a uma entidade financeira que não integra o conglomerado e pela falta de transparência sobre os possíveis lucros, ou como o BTG teria a capacidade de recuperar as perdas desse suposto crédito podre.
A única informação divulgada pelas entidades financeiras sobre o tema foi um comunicado emitido pelo BB ao mercado, no dia 1º de julho, justificando, de forma generalizada, de que se tratava de um “piloto” de “um modelo de negócios recorrente” que o Banco do Brasil estaria desenvolvendo “para dinamizar, ainda mais, a gestão de portfólio de crédito”.
Sem trazer explicações sobre como a cessão dessa carteira de créditos traria benefícios ao Banco do Brasil ou até mesmo os interesses do BTG nessa aquisição, o comunicado dirigido ao mercado somente informava o valor contábil de R$ 2,9 bilhões da carteira e um impacto financeiro de R$ 371 milhões ao BB, que constarão no balanço do terceiro trimestre deste ano.
O GGN entrou em contato com os bancos para esclarecer os interesses na venda pelo Banco do Brasil e na compra pelo BTG Pactual, mas ambas entidades não quiseram dar detalhes da operação. “Para saber mais detalhes sobre o processo de venda da carteira, sugerimos que você consulte o Banco do Brasil”, informou o BTG ao GGN. E o Banco do Brasil se restringiu a afirmar que “prestou todas as informações sobre o assunto” no comunicado ao mercado e às entidades reguladoras, reproduzido acima.
A operação não somente foi manchetes do noticiário econômico, como também impactou associações e sindicatos de funcionários e bancários, que se manifestaram questionando o suposto favorecimento dado pelo Banco do Brasil ao BTG nesta transação e cobrando a transparência desta informação.
O diretor executivo do Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo, Osasco e Região, João Fukunaga, afirmou, em nota, que a cessão das carteiras de crédito é, “no mínimo, suspeita”.
“A venda da carteira de crédito para o BTG Pactual, dita de vanguarda, é bastante suspeita ao beneficiar, pela primeira vez, um banco fora do conglomerado e que justamente foi criado pelo ministro bolsonarista. Como saber se o BB não está sendo usado para interesses escusos do Paulo Guedes?”, questionou Fukunaga, que é também coordenador da Comissão de Empresa dos Funcionários do Banco do Brasil (CEBB).
O Sindicato consultou a economista Cátia Uehara, do Dieese, sobre a suspeita da transação, que apontou a falta de transparência no lucro que o BTG irá obter. Uehara afimou que, como justificado pelo BB, a cessão de créditos podres é feita periodicamente com o objetivo de limpar os balanços, reduzir os custos e o índice de inadimplência das perdas das carteiras.
Entretanto, os compradores obtêm lucro na diferença entre o preço da compra pago ao banco e o que conseguem resgatar na cobrança dessas dívidas. “Todavia, no caso da operação realizada pelo BB com o BTG Pactual, não fica claro se o valor da carteira cedida de R$ 2,9 bilhões é justo, pois o BB não explica qual o tipo da carteira e menciona somente que ela é ‘majoritariamente em perdas’, não havendo transparência na operação”, alertou.
Nesse sentido, não há tampouco explicações do Banco do Brasil sobre a instituição ter capacidade superior ao BTG Pactual de cobrar as dívidas dessa carteira. A justificativa de “limpar os balanços” ou “reduzir a inadimplência” ainda são confrontadas por operação recente do próprio BB, que adquiriu no mesmo período outras carteiras, desta vez do Banco BV (antigo Votorantim), no valor de R$ 240,5 milhões, que exige que o BB cumpra com os pagamentos independente da inadimplência que pode deter.
O Sindicato dos Bancários de Bauru e Região também emitiu nota, afirmando que essa cessão “é, no mínimo, duvidosa, pelo conflito de interesses envolvidos”. “O BB deveria explicar por que está fazendo essa cessão de créditos pela primeira vez para uma empresa de fora do conglomerado, e por que o banco escolhido foi justamente um fundado por Paulo Guedes”, escreveu o sindicato.
Outra entidade a se manifestar foi a Associação Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil (ANABB), que após criticar a falta de transparência, enviou um ofício diretamente ao vice-presidente de Gestão Financeira e de Relações com Investidores do Banco do Brasil, Carlos Hamilton Vasconcelos Araújo, solicitando explicações sobre esta venda a uma instituição privada.
“Diante da pouca transparência na negociação, tendo em vista que não houve divulgação de qualquer processo de concorrência e nem de securitização, que transforma os ativos em títulos, a ANABB encaminhou os questionamentos”, diz o ofício.
Entre as perguntas enviadas a Carlos Hamilton Araújo, a Associação questionou se houve leilão, ou seja, se outras instituições financeiras privadas também tiveram a oportunidade de participar desta compra de créditos podres e como ocorreu; se a negociação seguiu as normas legais e com o aval do Tribunal de Contas da União, do Banco Central e da Controladoria-Geral da União; os detalhes da carteira e qual foi o objetivo dessa venda pelo Banco do Brasil.
Saliente-se que, em 2001, a revista Veja acusou o atual presidente do BB, Rubens Novaes, de negócios pouco lícitos com o então Banco Pactual – que tinha como então sócios André Esteves e Paulo Guedes. A reportagem era algo inverossímil, mas as relações de negócio de Novaes eram bem explicitadas.