Por Antônio Carlos de Almeida Castro – Kakay *
“O Presidente da República, embora possa muito, não pode tudo.”
Ministro Celso de Mello
Não posso esconder as lágrimas que correm livremente enquanto assisto ao Live GLOBAL CITIZEN. E olhe que nem conheço esses cantores. O que me comove é a solidariedade. O mundo inteiro demonstra respeito, gratidão e até amor a todos os que se entregam, com risco pessoal e com o sacrifício de não ver/encontrar as pessoas queridas, em nome do enfrentamento a este vírus maldito, a esta tragédia.
Os países se dão as mãos sem credo ou ideologia. Todo final da tarde, no mundo inteiro, as pessoas vão para as varandas aplaudir, bater panela e cantar em homenagem aos trabalhadores da saúde, da segurança hospitalar e de todos os que se dedicam e se expõe para o enfrentamento da pandemia.
Não sou dos que acreditam que o mundo sairá melhor desta. O homem é naturalmente ruim, mal, mas é um fato que, neste momento, as pessoas estão mais dispostas a serem menos piores, com mais sentimento humanista. É muito tocante ver a música, pelos mais diversos sons e atores, os mais inimagináveis, falar um único som: o som da solidariedade. O mundo, de alguma forma, querendo dar chance à vida. Mas, infelizmente, temos que registrar: qual é a nota fora do concerto mundial? O que desafina? Meu Deus, aqui no Brasil, nós não temos tido tempo de sermos só solidários, de só sofrermos pela dor, certamente hoje já próxima de todos e de cada um, pela morte ou doença de alguém querido. Não podemos sequer acompanhar o movimento mundial de tentar sair deste buraco, deste drama. Nós temos que acompanhar diariamente, em tempo real, um psicopata inimputável, que já havia esvaziado a ciência em tempos normais, aprofundar o grau de ignorância em tempo de guerra.
Nós, brasileiros, não conseguimos falar a língua universal da fraternidade. Esse governo fascista e assassino nos distrai. Nós não conseguimos ter solidariedade com nossos irmãos, nem no medo, nem na angústia. Em todo mundo, os partidos e os políticos baixaram as armas. Há um inimigo comum. Vejam Portugal, onde um partido da oposição cumprimenta o governo por ter trabalhado bem. Sem uso da política. Com lealdade à gravidade do momento.
Aqui perdemos a maior parte do tempo discutindo os absurdos do Presidente. Isso não é correto. Este pústula do Presidente não nos deixa sequer sermos humanos, não nos deixa chorar de desespero pelos mortos. Não nos deixa sermos simples. Este inimputável politizou o vírus. Ele, que despreza a inteligência, a pesquisa, o estudo, que é um cultor da morte, da tortura, da treva, não permite sequer que o país sofra o drama que se abateu sobre a humanidade. Ele é tão mesquinho que politizou o uso ou o não uso de tal ou qual remédio.
É claramente um homem sem nenhum compromisso com qualquer enfrentamento humanitário. E o pior é que ele faz tudo de maneira deliberada. Esse é o jogo político dele. Esse é o campo político deste inimputável. Ele continua com um bom percentual de apoio. Pessoas que vão às ruas para dizer que não existe o vírus, não existe a doença. Meu Deus. Esse é o rebanho dele. A posição dele de enfrentamento é clara e pensada. Por isto, todos nós, que temos ainda lucidez e capacidade de análise, devemos tomar uma decisão. É preciso tirá-lo da Presidência. Por um tempo eu defendi que não era possível pensar em outro impeachment. Nenhum país suporta 3 impeachments em um tempo tão curto e o impeachment não é a maneira constitucional de tirar da Presidência um incompetente. Mas, no caso, não estamos tratando de incompetência tão somente. Reconheço que subestimei o grau de idiotice, de perversidade, de bandidagem desse miliciano que ocupa a Presidência.
Não se trata mais de falar só em incompetência. Se não existirem condições políticas para o impeachment, e penso que há, cabe a nós, operadores do direito, darmos uma solução constitucional para o caso. Mas temos que enfrentar esta dura e cruel realidade, não podemos permitir que este inimputável siga à frente do governo. A história nos cobrará pela omissão. Proponho que avaliemos uma denúncia, fácil de fundamentar, com os inúmeros crimes de responsabilidade deste Presidente, a ser apresentada junto a Corte Suprema.
Nenhum Presidente, nem ninguém, tem o poder de propor reiteradamente políticas genocidas. E defender essa política desdenhando de um povo. Ele ofende a todos, inclusive os que o apoiam. Tornar inimputável e afastar um Presidente eleito legitimamente por 57 milhões de brasileiros, com uma interpretação constitucional e com uma visão dos Tratados Internacionais, não é tarefa fácil. Mas nós, operadores do direito, que militamos no dia a dia no Supremo e que conhecemos sua jurisprudência, já vimos “milagres” serem feitos, quando a Corte quer, em nome de uma interpretação da Constituição.
A história e o momento exigem esta coragem. Senão, para que vale o Direito, para que vale a evolução internacional da consciência humanista? Uma denúncia que propicie a oitiva não só do Ministério Público Federal, que, talvez, mais uma vez falte à nação, mas que ouça o Congresso Nacional, nossa Casa Soberana. Se o Congresso e o Supremo entenderem que não podemos continuar caminhando docilmente para a morte, para a catástrofe, nós teremos como afastar este homem que faz da morte o seu legado. Para os que questionarem, de maneira óbvia, sem olhar o mar revolto onde estamos, a falta de jurisprudência ou algo assim, eu responderei com Clarisse Lispector: “Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas continuarei a escrever”. Com a palavra, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal.
Antônio Carlos de Almeida Castro – Kakay é advogado