Em meio à pandemia de Coronavírus, a Câmara Federal aprovou, na madrugada desta quarta-feira (15/4), a Medida Provisória 905, que cria a carteira de trabalho verde e amarela, flexibiliza direitos trabalhistas e é considerada uma continuidade da reforma trabalhista, ou seja, mais um golpe contra a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A deputada Erika Kokay (PT-DF) votou contra a medida, aprovada na forma de uma emenda do relator, deputado Christino Aureo (PP-RJ). A MP, que ainda precisa ser analisada pelo Senado, perde a validade no próximo dia 20.
Por considerar que a matéria estava na contramão dos esforços que a Câmara vinha desempenhando para ajudar o Brasil a atravessar a crise do Coronavírus, a oposição criticou duramente a medida, denunciou os retrocessos contra os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras e obstruiu os trabalhos durante todo o dia.
“É uma crueldade o que estão aprovando. Diminuir direitos não vai gerar oportunidades e fazer a economia crescer. O momento é de garantir proteção, emprego e renda em meio à pandemia e não de arrancar direitos”, afirmou Kokay.
A deputada disse, ainda, que os parlamentares negam a realidade. “Alguns criam uma dicotomia que é falsa ao se contrapor direitos e empregos. Nós tínhamos em novembro do ano passado, quando a MP foi editada, 11,2% de desempregados. Em março deste ano, tínhamos 11,6%. Apesar de estar em vigor há cinco meses, a MP não gerou empregos e não apresentou resultados nem no nível geral de empregos, nem na faixa etária de 18 a 29 anos”, argumentou a parlamentar.
“O que vai acontecer é a substituição de até 25% dos trabalhadores e trabalhadoras de uma determinada empresa por trabalhadores com menos direitos”, explicou a parlamentar.
“Nós já estamos fartos dessa cantilena de que retirar direitos gera empregos. Usaram esse mesmo argumento na reforma trabalhista, quando anunciavam a criação de 6 milhões de empregos que nunca existiram. Repetiram o mesmo na reforma da previdência e os empregos nunca vieram”, afirma a parlamentar, ao criticar que a MP não tem o objetivo de desburocratizar contratações, mas unicamente de precarizar ainda mais as relações de trabalho.
“Ao invés de estarmos aqui destruindo direitos, deveríamos cobrar o imediato pagamento por parte do governo Bolsonaro do auxílio emergencial aos que mais precisam, do socorro ao Estados”, cobrou a deputada.
Bancários
A parlamentar alertou, ainda, que o aumento de jornada de 6h para 8h vai gerar demissões de bancários e bancárias.
“Sabem o que isso vai significar? Demissão na categoria bancária”, disparou.
A MP autoriza também que bancários e bancárias trabalhem aos sábados, domingos e feriados.
Outros retrocessos
Encargos
O programa está previsto para durar de 1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2022, mas como os contratos serão de 24 meses, podem terminar após esse prazo.
Segundo o texto, o salário máximo nas contratações será de 1,5 salário mínimo. As empresas serão isentas da contribuição previdenciária (20%) e das alíquotas do Sistema S (de 0,2% a 2%).
Aureo retirou a isenção do salário-educação (2,5%) e a redução do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), que iria para 2% do salário e permanece em 8%.
Somando-se tudo, as reduções implicam economia para o empresariado de cerca de 70% dos encargos (de 39,5% para 12,1% sobre a folha). No texto da comissão, a redução chegava a 94% (de 39,5% para 2,4% sobre a folha de pagamentos).
Após 12 meses de contrato, se houver aumento de salário, o trabalhador poderá continuar sob esse modelo, mas as isenções para as empresas serão limitadas a 1,5 salário mínimo.
Antecipações
No texto da emenda aprovada inicialmente, o relator havia retirado a permissão para o contratado receber, a título de antecipação mensal, os valores proporcionais do 13º salário, do um terço de férias e da multa indenizatória do FGTS.
Entretanto, por meio de um destaque do PSL, aprovado por 248 votos a 214, essa antecipação retornou ao texto, assim como a diminuição da multa do FGTS de 40% para 20%. A proposta apresentada nesta terça-feira por Christino Aureo era de 30%.
A lei estipula que essa indenização é devida na demissão sem justa causa, e a MP determina o pagamento em qualquer situação de desligamento.
Na rescisão, entretanto, o trabalhador demitido sem justa causa não leva metade do salário a que teria direito até o fim do contrato, como previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para os contratos com prazo definido de duração.
Fonte: Agência Câmara de Notícias
Limites
Poderão ser contratados com a carteira verde e amarela até 25% dos trabalhadores da empresa, apurados mensalmente. Aquelas com até 10 trabalhadores serão autorizadas a contratar duas pessoas pelo programa (20%), inclusive se as empresas tiverem sido abertas depois de 1º de janeiro de 2020.
Se o trabalhador contratado por essa modalidade for demitido sem justa causa e o contrato durou ao menos 180 dias, ele poderá ser admitido novamente mais uma vez com essas regras.
A MP proíbe que trabalhadores já em atuação com outras formas de contrato sejam admitidos pelo programa Verde e Amarelo antes de 180 dias de sua demissão.
O candidato poderá ser admitido no âmbito do programa mesmo que tenha sido menor aprendiz ou tenha sido contratado por período de experiência, trabalho intermitente ou avulso.
Quanto às horas extras, o texto permite a criação de banco de horas como alternativa ao pagamento de 50% a mais, desde que a compensação ocorra em seis meses. Nesse sentido, o relator retirou do texto a possibilidade de esse acerto ocorrer por meio de acordo individual. Agora, somente com acordo ou convenção coletiva.
Acidente em percurso
Aureo incluiu na lei dos benefícios previdenciários (Lei 8.213/91) uma restrição que considera acidente de trabalho (na ida e volta de casa ao trabalho) apenas se houver dolo ou culpa e ocorrer em veículo fornecido pelo empregador.
Originalmente, a MP apenas excluía qualquer situação de acidente no percurso como acidente de trabalho.
Um novo artigo incluído pelo relator na lei especifica que o acidente sofrido em qualquer meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado, resultará no pagamento de benefícios previdenciários com as mesmas regras do acidente de trabalho.
O artigo faz referência à reforma da Previdência (Emenda Constitucional 103/19), fixando o benefício por incapacidade permanente em 100% da média dos salários de contribuição.
Jurisprudência
Outro retrocesso no relatório é que acordos e convenções de trabalho devem prevalecer sobre a legislação ordinária, sobre súmulas e jurisprudências do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e de tribunais regionais do trabalho, exceto se contrariarem a Constituição federal.
Auxílio-acidente
A MP 905/19 remete ao regulamento do INSS a definição de situações em que o pagamento do auxílio-acidente ocorrerá em razão de sequelas que impliquem a redução da capacidade de trabalho.
Somente se essas condições persistirem é que o trabalhador receberá o auxílio até sua transformação em aposentadoria por invalidez ou até o óbito. A lista de sequelas será atualizada a cada três anos pelo Ministério da Economia.
Seguro-desemprego
Ao contrário do previsto no texto original, a versão aprovada em Plenário torna facultativo o pagamento de Previdência social sobre os valores recebidos de seguro-desemprego. Se o desempregado escolher pagar a alíquota de 7,5% sobre o seguro, o tempo contará para fins previdenciários.
Mesmo que não faça a opção no momento e futuramente deseje contar o tempo para aposentadoria, ele poderá recolher as contribuições com juros moratórios e multa.
A vigência dessa regra será a partir do primeiro dia do quarto mês seguinte à publicação da futura lei.
Todas as mudanças feitas no projeto de lei de conversão valerão para os atuais contratos, exceto quanto ao programa Verde e Amarelo.
Com informações da Agência Câmara