O procurador da República Camões Boaventura deu parecer pela determinação de abstenção de qualquer comemoração relativa ao golpe de 1964, que instaurou a ditadura militar no País, e pediu que a ordem judicial ‘não se abstenha a 2020, para expurgar de vez do imaginário estatal nacional celebrações desse viés’. No documento, o procurador aponta que o agente público que ‘despreza as atrocidades’ do regime de exceção de durou até 1985 – marcado por censura e tortura – tem conduta que ‘foge da ética, é desleal e eivada de má-fé’.
Boaventura pede ainda uma ‘atuação rápida e enérgica do Poder Judiciário’ para ‘cessar escalada de tentativas vis de reavivamento de práticas estatais autoritárias’ observadas no País.
A manifestação foi apresentada neste sábado, 4, no âmbito de uma ação popular proposta pela Deputada Federal Natália Bonavides que pede liminar para retirar do site do Ministério da Defesa, documento que exaltava o golpe de 1964 como ‘marco para a democracia brasileira’. O parecer de Boaventura é favorável à retirada do conteúdo.
“Toda e qualquer iniciativa estatal de celebrar o regime ditatorial, minimizar a gravidade do período ou reescrever a história, além de contrariar o texto constitucional e o sistema protetivo internacional de direitos humanos, é contraditória com reconhecimentos e confissões anteriores do Estado brasileiro. Trata-se de uma reiteração de graves lesões às vítimas diretas do regime, a elas impondo novos sofrimentos. Cuida-se, ainda, de sonegar de toda uma sociedade o usufruto do direito fundamental à memória e verdade. Dedica-se, por fim, em incutir em todo um corpo social a aflição de um possível reavivamento de um estado de exceção”, afirma o procurador no parecer.
Boaventura considerou que a ordem do dia assinada pelos ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e pelos comandantes das Forças Armadas e questionada pela deputada Natália Bonavides, é reiteração de conduta violadora, tendo em vista que em 2019, a Justiça Federal determinou à União que se abstivesse de comemorar o aniversário de 55 anos do golpe que instaurou regime de exceção no País.
“A reprodução da herança colonial e autoritária pelas instituições nacionais só será efetivamente desbaratada mediante a implementação de uma Justiça de Transição que se afigure como uma política de Estado, não de governos específicos, e para tanto se faz necessário o desenvolvimento de uma pedagogia pela cidadania que reflita sobre o passado, realize direitos e reinvente as instituições, por via da consolidação de uma agenda educacional que seja capaz de formar agentes públicos (incluídos os magistrados) com criticidade suficiente para a plena efetivação dos direitos humanos, que reclama não apenas retórica, mas uma prática intransigente”, pondera ainda o procurador.
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