Uma teoria da conspiração a ser considerada

Por Romário Schettino*

É possível continuar vivendo no Brasil, portando todas as faculdades mentais, sem admitir que a teoria da conspiração esteja valendo para este momento histórico? Vamos aos fatos. No início de 2016, quando uma jornalista perguntou ao ministro Marco Aurélio sobre o que ele achava do impeachment de Dilma Rousseff, ele disse: “É um golpe, a acusação (pedaladas) não enseja impeachment”. Ponto. A repórter vai ar, na GloboNews, e diz que M. A. disse exatamente o contrário. O ministro, estranhamente, se cala.

O senador Romero Jucá (PMDB-RR) é flagrado em áudio dizendo que era necessário tirar Dilma da Presidência porque com ela seria impossível estancar a “sangria” da Lava-Jato. E disse mais, que o golpe seria feito com o “Supremo, com tudo”. “Já conversei com vários ministros, com alguns generais, e todos estão de acordo”. Estava desenhado o pacto para “mudar o governo e colocar o Temer”, ou seja, deter a Lava-Jato pela direita. A esquerda continuaria no cadafalso, como se verá mais adiante.

O problema para implementar o “pacto” era o ministro Teori Zavaski, relator da Lava-Jato, disse o interlocutor de Jucá na gravação, Sérgio Machado: “Ele (Zavazki) é um ministro muito durão, difícil”. E o que aconteceu? Teori, na sequência, morre num acidente de avião pra lá de suspeito. O STF aceitou, passivamente, que o suspeitíssimo Eduardo Cunha comandasse o processo contra Dilma.

Veio o impeachment, ou golpe parlamentar/judiciário/midiático, e qual foi a primeira decisão do governo Temer? Colocar em votação na Câmara dos Deputados o fim do regime de partilha do pré-sal, como queria o PSDB de José Serra. Foi, então, aprovada a entrega do pré-sal para as petrolíferas norte-americanas. Com o Supremo, com tudo.

Mas não parou aí. O TRF4, numa corrida contra o tempo, condena por unanimidade o ex-presidente Lula em segunda instância, não apenas mantendo a sentença de Sérgio Moro em primeira instância como ampliando a pena para impedir a liberdade do condenado durante os prazos recursais. O STF, por maioria, decide manter Lula preso numa votação em que a ministra Rosa Weber, em seu voto de Minerva, diz votar contra sua convicção para acompanhar a maioria do colegiado. Se era um voto de Minerva Weber faria a maioria. Que voto estranho! Olhando de fora, parece que os ministros do Supremo não se sentem à vontade, mas a ministra foi fartamente elogiada por “analistas” da mídia corporativa. A partir deste momento, todos os ministros do STF se submetem ao desejo da presidente Carmém Lúcia que acha “imprudente” libertar Lula.

As condenações de Lula são baseadas em delações, sem provas, de uma suposta ocultação de bens, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Onde estão os benefícios dados a Lula? Em que conta bancária está depositado o dinheiro “desviado”? Em qual cartório existe uma escritura, ainda que em nome de terceiro? Em que momento houve ocupação do apartamento, ainda que temporária? Não há nada no processo. Diz o juiz que o tríplex recebeu uma milionária reforma, não há provas disso. Pelo contrário, o pessoal do MST entrou lá e só viu um apartamento feioso, sem qualquer reforma. O que se diz é que uma empresa do Paraná de fachada deu notas (frias) fiscais de venda de um elevador que nunca foi instalado.

Por fim, não menos importante, vem o TSE, dois exatos anos depois do impeachment, e cassa a candidatura de Lula à Presidência da República, apesar de parecer da Comissão de Direitos Humanos da ONU recomendando o respeito aos seus direitos políticos.

Relator no TSE, o ministro Luiz Roberto Barroso apresenta um voto feito às pressas, atropelando as leis e os prazos, para ser discutido às vésperas do início da veiculação dos programas de rádio e televisão. Cinco ministros acompanharam o ministro sem ressalvas. Apenas Edson Fachin abre uma divergência conveniente e vota com o parecer da ONU. Sem nenhum puder, Barroso nem se deu ao luxo de contestar Fachin, deixou essa tarefa para Rosa Weber. Para não parecer que estava muito clara a manobra casuística, dra. Weber propôs que a exclusão do programa do PT com Lula Presidente só fosse feita depois de esgotados os recursos previstos em lei. Deu-se por derrotada, claro, sem sequer ter colocado sua proposta em votação.

De tudo isso, o que podemos concluir? Que há poderes supremos (maiores ainda que os do STF) comandando a vida nacional, daqui de dentro e lá de fora. A oligarquia brasileira tem interesse porque quer se aliar às corporações estrangeiras na esperança de ganhar mais dinheiro, mas o PT não abre mão da soberania. As multinacionais, especialmente as do petróleo, estão satisfeitas com o desmonte do pré-sal. E o sistema financeiro está radiante com o fim dos direitos sociais e com a aplicação das reformas neoliberais. Os corruptos nacionais já se dão por satisfeitos com o trabalho seletivo da Lava-Jato. Alguns foram condenados, mas suas mulheres e filhos estão protegidos. A maioria está em campanha para se reeleger. A grande imprensa brasileira, que a tudo acompanha e aplaude, também está contente com o desenrolar da trama macabra e, por que não, conspiratória, só esperam o enterro do PT, do petismo, do lulismo e de todos os partidos de esquerda, no Brasil e na América Latina.

Apostar todas as fichas na democracia que temos pode surtir algum efeito na atual campanha eleitoral, mas não está garantido que a conspiração contra a soberania popular vá acabar, qualquer que seja o seu resultado. Caso Fernando Haddad seja eleito, como o próprio sistema já admite diante do fracasso de seus candidatos, as pressões continuarão sobre o povo brasileiro. Tudo vai depender de como será construída a resistência.

*Romário Schettino é Jornalista, ex-presidente do Conselho de Cultura do DF, editor do site   brasiliarios.com ( https://brasiliarios.com)

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