*Por Marcelo Pires Mendonça
A sociedade brasileira, nesse momento, vivencia mais um processo eleitoral, certamente um dos mais conturbados e decisivos para a história do país. Na esteira do golpe de 2016, que esquartejou a democracia, expôs a parcialidade de nossas instituições e colocou no centro do debate nacional o caráter seletivo do sistema judiciário e as entranhas de um poder legislativo corrupto e clientelista que não possui nenhum compromisso com a sociedade, as eleições de 2018 irão determinar nosso destino enquanto nação. E a escola está no centro dessa encruzilhada.
Na escola encontram-se o passado, o presente e o futuro de um país. Ali vivenciamos as consequências de décadas de descaso, falta de investimentos estruturais e desvalorização dos docentes. O presente da escola reflete o desalento do Brasil atual: desemprego; precariedade das condições de trabalho (dos professores e das famílias dos estudantes); acirramento da violência; degradação das condições de vida com a erosão da renda das famílias e o rebaixamento das políticas sociais e de combate à desigualdade; a intolerância e a fascistização da sociedade brasileira, refletida em programas como o “Escola Sem Partido” – que combate a escola laica e o livre pensamento no processo ensino-aprendizagem – e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que nega a formação integral dos estudantes, apresenta uma série de retrocessos, desrespeita os processos históricos da educação brasileira e o diálogo com a sociedade.
O futuro do país são as crianças e os jovens, afirma o jargão exaustivamente repetido pela mídia, pelos políticos e pela sociedade.
Logo, o futuro do Brasil está na escola, nas salas de aula e irá trilhar os caminhos que assentamos na política. O desemprego desestrutura as famílias e precariza a vida dos estudantes, o sucateamento do SUS priva nossas crianças do acesso ao direito fundamental à saúde (da vacinação aos tratamentos de alta complexidade) e compromete sua qualidade de vida, a violência expõe os jovens à criminalidade (inclusive no espaço da escola) e o genocídio da juventude negra vulnerabiliza 54% dos estudantes do ensino básico, a precarização do mercado de trabalho repercute no aumento dos índices de trabalho infantil, submete as famílias a piores condições de trabalho e compromete as perspectivas futuras de acesso dos jovens ao emprego, assim o, conservadorismo que norteia o debate atual sobre o sistema de ensino afasta os estudantes da discussão sobre os impactos da política na vida cotidiana e compromete o espaço à diversidade na escola, dificultando o enfrentamento de problemas como o bullying, a homofobia, o racismo e as desigualdades. Por outro lado, a problematização da chamada “ideologia de gênero” esvazia o debate na escola sobre machismo, misoginia, direitos sexuais e reprodutivos, gravidez na adolescência e violência contra a mulher.
Na escola pública em que ensino testemunho todos os dias que as manchetes que lemos nos jornais, nas redes sociais, são a cruel realidade cotidiana daquelas crianças e adolescentes que moram e estudam numa das Regiões Administrativas com os piores indicadores sociais do Distrito Federal, localizada a apenas 22 km de distância do centro do poder federal. Por isso, a escola é o país. Tudo chega às escolas porque tudo chega às crianças e jovens, inclusive a pobreza, a violência e o desalento, como nos revelou recentemente a Unicef em pesquisa que constatou que 60% das crianças e adolescentes são pobres no Brasil e portanto vulneráveis, com dificuldade de acesso a seis direitos básicos: 1) educação, 2) informação (acesso à internet e também à TV), 3) água, 4) saneamento básico, 5) moradia e 6) proteção contra o trabalho infantil. Essa é a realidade das minhas salas de aula. O processo eleitoral, marcado pelo avanço da direita conservadora e golpista no país, será decisivo para a manutenção ou a ruptura desse cenário.
Todos os caminhos levam à escola e a sala de aula é um reflexo contundente das nossas escolhas políticas e caminha, preocupantemente, na contramão da democracia, da liberdade de pensamento e da construção de um projeto de sociedade voltado ao combate das desigualdades, das injustiças, dos preconceitos e de construção do pensamento crítico.
Como nos disse Bertolt Brecht, no Elogio do Aprendizado:
“Frequente a escola, você que não tem casa!
Adquira conhecimento, você que sente frio!
Você que tem fome, agarre o livro: é uma arma.
Você tem que assumir o comando.”
*Marcelo Pires Mendonça é professor de História e Geografia da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal.
+ There are no comments
Add yours