O verdadeiro pacto de sangue de Lula, que incomoda seus adversários, propensos a destruí-lo de qualquer maneira, é com o povo brasileiro. DigoLula porque não me refiro somente a um ex-presidente. Destes já temos um punhado, alguém como Lula, não. Lula é o único presidente que o povo chama pelo apelido, e de maneira não pejorativa ou irônica. Não é conhecido pelo sobrenome ou pelas iniciais e tampouco é chamado pelo povo pelo primeiro nome e pelos estudiosos pelo último, como aconteceu com Getúlio Vargas. E, se ainda sim fosse conhecido pelo sobrenome, teria em Silva um sobrenome comum a muitos trabalhadores. O nome de Lula foi dado na luta, e por si só já está na História.
Apenas por ter a história de vida amplamente conhecida que tem, e ter chegado onde chegou, já é uma das maiores subversões possíveis ao nosso modelo político, construído com base na exclusão e feito para garantir antigos privilégios, obtidos nas mais cruéis formas de violência. O retirante nordestino, operário, que perdeu um dedo em uma prensa, grevista na época da ditadura -preso por ela e que ao sair fundou o maior partido de esquerda da América do Sul- sacudiu, indiscutivelmente, a política brasileira.
Uma parte importante do golpe é associar a nossa cultura política viciada, rechaçada por toda população, que envergonha a todos, a Lula, quando, na verdade, está intimamente ligada às nossas estruturas. E qualquer simplificação nesse sentido é uma injustiça.
Chegam ao ponto de chama-lo de “chefe da corrupção”. E sabem que estão mentindo.
Ao longo dos anos, foi do interesse das elites dirigentes que o povo não elegesse seus representantes. Com a Lei Saraiva, de 1881, que proibia os analfabetos de votar (o que só fizeram em 1985), as classes populares foram alijadas dos processos decisórios, uma vez que a escolaridade na época era quase exclusividade das camadas mais elevadas.
E em Lula, as classes populares encontraram, finalmente, seu representante, e é isso que incomoda. Ainda que várias das mudanças que sonhávamos não tenham acontecido, a chegada de Lula ao cenário político foi a maior resposta já dada ao modelo político brasileiro, historicamente clientelista. E não apenas pela sua história de vida.
Durante os governos petistas, o salário mínimo teve aumento real de 72%, os investimentos em Educação foram triplicados e 36 milhões de pessoas saíram da condição de miséria, enquanto 42 milhões chegaram à classe média. Saímos do mapa da fome da ONU. O número de jovens negros no Ensino Superior foi triplicado, graças a Lei de Cotas, o Prouni, o Fies e a expansão universitária. A transposição do Rio São Francisco, dita como necessária por Dom Pedro II, foi finalmente tirada do papel, garantindo água a quem antes dependia da “bondade” de coronéis e de seus interesseiros carros-pipa.
Foram também os governos Lula e Dilma que tornaram possíveis ampliações das ações da Polícia Federal contra a corrupção, algo jamais que foi permitido pelos governos conservadores,
Assim como os procuradores da Lava-Jato, Antonio Palocci também sabe que está mentindo. Sabe que cometeu erros individuais e fez, ele sim, um pacto de sangue com as elites. Passou a corroborar com o juiz Moro e a Lava Jato que tenta emplacar a tese de que Lula é o responsável pela invenção da corrupção de um sistema falido e criado pelas elites brasileiras para permanecerem no poder.
Não se trata de que Lula não poderia ser corrupto pelo que representa. Faltam provas e ele está sendo julgado pelo que representa para o povo sob a alegação de representar a maneira com que a política é, historicamente, realizada no Brasil. Dada as origens de todos os seus adversários, todos eles têm muito mais responsabilidade nisso do que Lula. Aliás, o PT nasceu para rejeitar esse modelo eleitoral e ser uma alternativa e esse deve ser seu rumo.
A mesquinhez de parcela da elite não suporta a política de empoderamento popular como arma do desenvolvimento econômico, por meio de políticas sociais. Enquanto o pacto de Lula com o povo é inseparável – pois foi o povo quem criou essas quatro letras que viraram a pedra no sapato dos setores da elite brasileira – quem, historicamente, teme a democratização do poder, recorre a golpes, tanto no Brasil, quanto no restante de nosso continente.
E a nova investida contra Lula se dá justamente no final da Caravana pelo Nordeste, em que o ex-presidente percorreu a região recebendo carinho, apoio, solidariedade e o descontentamento do povo com o governo golpista.
Está cada vez mais claro que a senha para obter acordos é dizer o nome de Lula. Palocci mudou seu depoimento quando percebeu que só poderia sair do cárcere se envolvesse o ex-presidente em uma trama, que ele próprio não pode provar. O depoimento dado no mês de abril, em que sinalizou que poderia entregar ilícitos do mercado financeiro e de “grandes empresas de comunicação”, não surtiu efeito na República de Curitiba como o de setembro. Hoje, envolvendo Lula, Palocci pode sonhar com a liberdade.
Mas, essa cruzada será inglória. O pacto de sangue que querem imputar a Lula não é o que ele firmou. Como ele mesmo disse, somente o povo brasileiro é quem poderá decretar, se quiser e através do voto, o seu final. E, segundo as todas as pesquisas eleitorais, não é o que o povo deseja.
Reginaldo Lopes é deputado federal (PT-MG)
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