*Por Érika Kokay
O troca-troca imoral de parlamentares na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara não foi o único instrumento utilizado por Michel Temer para se livrar da denúncia de corrupção passiva apresentada pela Procuradoria-Geral da República. Como denunciado diversas vezes pela oposição democrática no parlamento, Temer tem utilizado dinheiro público para se salvar.
De acordo com dados do SIGA Brasil, sistema de informações sobre o orçamento público federal, da consultoria de Orçamento do Senado Federal, houve um crescimento vertiginoso da liberação de emendas parlamentares nos últimos meses.
O levantamento mostra que houve um esquema de distribuição de emendas que beneficiou fartamente partidos e parlamentares da base do governo. Somente entre os meses de abril e junho de 2017 foram distribuídos cerca de R$ 755 milhões aos 19 partidos aliados do governo. Entre os que mais receberam recursos estão o PMDB (1º), PSDB (2º), PP (3º), PSD (4º), PR (5º), DEM (6º), PSB (7º), PTB (8º), PRB (9º), SD (10º).
Chama atenção o fato do PSC, partido de Jair Bolsonaro, ter sido o que mais recebeu recursos quando a análise leva em consideração o montante recebido por cada parlamentar (cerca de R$ 3 milhões) no comparativo com outros parlamentares da base que receberam uma média de R$ 2,2 milhões (PMDB), R$ 2 milhões (PSDB) e R$ 2 milhões (PP). Nenhum dos parlamentares dos dez partidos que mais receberam foram agraciados com montantes inferiores a R$ 1,4 milhão.
Representantes do governo têm dito que os recursos estão sendo distribuídos de forma republicana entre os parlamentares da base e da oposição, o que não se sustenta quando são analisados os números.
Bem diferente dos montantes destinados aos partidos aliados, os recursos da oposição somam volumes muito menores. No mesmo período de abril a junho de 2017, os principais partidos da oposição PT, PDT, PCdoB, PSOL e Rede, tiveram acesso a um valor em emendas ao Orçamento cerca de 12 vezes menor ao que foi distribuído aos partidos aliados de Temer.
Contra fatos não há argumentos. Temer além de utilizar o Palácio do Planalto como trincheira para se proteger e se manter no cargo, não tem tido escrúpulo algum em lançar mão do dinheiro do povo brasileiro para promover a obstrução da justiça a partir do impedimento da admissibilidade das investigações na Câmara Federal.
Ao mesmo tempo em que Temer abre os cofres públicos para impedir qualquer tipo de investigação, o governo promove o aumento das alíquotas de PIS/Cofins para oscombustíveis, principal medida para atingir a meta fiscal de 2017, que tem rombo de R$ 139 bilhões. Ora, justo um governo que surgiu de um golpe fundamentado na tese de um crime de responsabilidade (que nunca existiu) por não cumprimento da meta fiscal?
Temer foi alçado ao Palácio do Planalto apoiado pela FIESP e empresários com o compromisso de não aumentar impostos. Ao optar pelo aumento dos combustíveis, Temer tenta tapar o rombo das contas públicas aumentando o custo de vida e penalizando os mais pobres. Ao mesmo tempo em que não mexe em nada no injusto modelo tributário brasileiro (fortemente regressivo), tal medida também gera um impacto negativo numa economia estagnada e em crise, pois promoverá um efeito cascata no custo de diversos produtos e serviços.
Não é demais lembrar que o aumento de impostos não tem reflexo algum na melhoria das políticas públicas, uma vez que a Emenda Constitucional 95 congelou os gastos públicos com saúde e educação por inaceitáveis 20 anos, mas não mexeu em uma vírgula dos gastos com juros e amortizações da dívida pública, que já consomem mais de 50% do orçamento público brasileiro.
Nesse contexto de crise política, econômica e ética, o que mais preocupa é que o balcão de negócios não parece ter fim. Parlamentares estão em gôndolas e precificados, ao mesmo tempo em que o governo fraco e débil de Temer tem que pagar cada vez mais caro pelo apoio dos fisiologistas.
A estratégia de usurpar recursos públicos para impedir o andamento de investigações certamente custará muito caro ao erário público e ao povo brasileiro. Temer, além da denúncia de corrupção passiva, em análise na Câmara, ainda poderá sofrer ao menos duas outras denúncias por parte da Procuradoria-Geral da República (PGR) por lavagem de dinheiro e obstrução da justiça. Ou seja, as negociações que estão sendo feitas hoje não valerão daqui a alguns dias, quando as novas denúncias forem apresentadas.
A tal “governabilidade” tão propalada por Temer como um trunfo para o mercado foi definitivamente para o espaço. Temer terá de renegociar com a “base” a cada nova denúncia. Não há governabilidade real, mas a compra explícita de apoio transitório e fictício.
Resta saber se restará dinheiro nos cofres públicos para alimentar as inúmeras transações tenebrosas que Temer terá de fazer para se manter cambaleante no cargo.
*Erika Kokay é deputada federal e presidenta do PT-DF
Artigo publicado originalmente em Carta Capital
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