Quem duvida que a economia e os interesses em conflito continuam sendo a base material da luta político-ideológica não precisa ler ou revisitar Marx: basta observar o conteúdo das propostas e o perfil de renda, instrução, cor e sexo dos manifestantes dos dias 12 (Marcha das Margaridas), 16 e 20 de agosto.
A luta de classes não é o único, mas é o principal motor da história humana, ainda que as relações e contradições sejam mais complexas e não se reduzam a apenas patrões e empregados.
Além dela, há a luta dos movimentos sociais contemporâneos em defesa do meio ambiente (que também possui componente classista) e da igualdade de direitos (urbanos, rurais, humanos, sociais, mulheres, orientação sexual, crianças, adolescentes, jovens, idosos, pessoas com deficiência, negros, índios etc.).
Além disso, é só constatar os ataques e o ódio manifestado contra o PT e suas lideranças pela oposição de direita e a elite branca conservadora, presente em setores minoritários da sociedade, mas dominante no Estado e nos meios de produção e comunicação. O PT é identificado com o mundo do trabalho, os pobres e excluídos e os movimentos sociais.
Guardadas as diferenças históricas, programáticas e organizativas, o PT de hoje, com seus erros e acertos, é o partido de esquerda a ser abatido pela direita como foi o PCB no passado. Com sua influência nos sindicatos, seu histórico insurrecional e sua vinculação ao PC soviético, o PCB despertava ódio da direita e da corporação militar em razão da insurreição comunista que liderou em 1935, mesmo, posteriormente, tendo proposto aliança com a burguesia industrial nascente nos anos 1940/1950 e criticado a via armada para derrubar a ditadura militar de 1964.
O antigo PCB cumpriu seu papel histórico: é a matriz da esquerda brasileira, com seus erros e acertos. Mas o PT, ao contrário do PCB no passado, é um partido de massas, socialista, pluralista e não centralizado, inserido no Estado Democrático de Direito: é um partido da ordem democrática. O PT teve origem no bojo das novas lutas operárias deflagradas na década de 1970, no ABC paulista. Dessas lutas, nascia um novo sindicalismo que combatia o antigo peleguismo sindical e confrontava com greves a classe patronal para negociar a pauta de reivindicações dos trabalhadores.
Na crise atual, mais política que econômica, agrupamentos políticos de direita e ultradireita saíram do armário como bem escreveu o sociólogo Emir Sader. Fantasiaram-se de combatentes contra a corrupção que nunca combateram quando estiveram à frente do governo. Agora mesmo, numa manobra regimental, seus deputados votaram a favor do financiamento empresarial de campanhas, raiz do caixa dois e da corrupção eleitoral. Até o ministro Gilmar Mendes, tão cioso com as contas de campanha da presidente Dilma, já aprovadas, se cala diante das contas do Aécio e não se manifesta em processo que tramita no STF sobre a inconstitucionalidade do financiamento empresarial.
Mas, apesar dessas iniciativas flagrantemente golpistas, os donos do capital não são burros e não querem marola de alto risco que possam comprometer a estabilidade política, social e econômica do país, sendo que o Brasil hoje é respeitado por todos os países de todos os continentes. Por isso mesmo, não parecem seduzidos por esses segmentos radicais antidemocráticos que tentam subtrair o mandato popular legitimamente conquistado pela presidente Dilma Rousseff, na eleição de 2014.
Sem base legal e moral, o PSDB e seus aliados, derrotados nas últimas eleições, parecem não desistir de golpear a Constituição, apoiados por braços políticos nos meios de comunicação e em instituições do Estado. O objetivo é abater a Dilma, o Lula e o PT, mas podem estar dando um tiro no pé, a história não acabou, o governo tem fôlego e o PT ainda tem papel histórico, ao lado de outros partidos de esquerda, para além da formação e organização política da classe trabalhadora sindicalizada.
Hoje, o PT precisa compreender as novas demandas da classe média, aprofundar relações com outros partidos de esquerda e movimentos sociais e incorporar à política os segmentos populares, antes empobrecidos, que ascenderam socialmente beneficiados pelas políticas públicas empreendidas pelos governos Lula e Dilma, construindo uma agenda política de garantia de direitos junto ao governo.
A luta de classes não é a única variável em jogo, mas é parte integrante da luta atual e o PT é o partido que sofre oposição sem trégua da direita, agressões sistemáticas e atentados criminosos.
Osvaldo Russo é conselheiro da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra).
Artigo publicado no Correio da Cidadania e América Latina en Movimiento – 26/08/2015