Nestes últimos dias de julho, passei a conviver com a angústia das dúvidas do porvir a partir de agosto, quando o tempo será contado – pelo menos para mim – em frações do dia. Poderá não haver tempo para reflexão, revisão e nem mesmo para crítica ou autocrítica. Um tempo curto, mas que será intensamente vivido. Cada dia será como o último. Não falo da minha vida pessoal ou profissional, mas da vida política do país.
Da minha juventude trouxe a inspiração das lutas iniciadas no movimento estudantil de 1968. De lá trouxe a progressiva consciência e engajamento por uma sociedade mais justa e democrática, sem explorados e exploradores. De lá ergui a bandeira da reforma agrária. Na fé cristã consolidei o sentimento de justiça; no debate das ideias abracei a ideia do socialismo; nas lutas democráticas aprendi a respeitar o pluralismo das ideias.
Em quatro momentos históricos estive na ponta das mudanças institucionais. Em 1985, no governo Sarney, como diretor do Incra, na superação do regime autoritário e na reconstrução da democracia. Em 1987, como coordenador da Abra, nos debates da Assembleia Nacional Constituinte. Em 1993, no governo Itamar, como presidente do Incra, no restabelecimento institucional pós-impeachment do Collor.
Em 2003, no governo Lula, inicialmente como chefe de Gabinete do Ministro da Educação e depois, no Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, como secretário nacional de Assistência Social, contribuindo na construção de um novo projeto de desenvolvimento com distribuição de renda e equidade social.
Hoje, com um olho na mídia, nas redes sociais e nas ruas e outro nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, sinto segurança em defender a Democracia e o Estado de Direito. Mas, em outros momentos, me sentia mais protagonista. Talvez esse sentimento venha das limitações de onde olho e da imprevisibilidade do porvir ainda que os cenários estejam expostos pelas circunstâncias políticas e sociais.
Mas ainda tenho um tempinho para refletir e ouso dizer que as forças de oposição à direita querem subtrair o mandato da Dilma pelas seguintes razões e projeções:
a) não confiam se será igual ou pior o cenário político, social e econômico em 2018;
b) não querem “pagar pra ver”, sabendo que o governo ainda tem instrumentos de ação, inclusive credibilidade externa, para recuperar a economia no médio prazo;
c) temem o potencialização da força social do PT e a possível candidatura do Lula, que até o “Sobrenatural de Almeida” reconhece o seu favoritismo;
d) querem aproveitar a escandalização operada pela mídia em relação à corrupção apontada pela Operação Lava Jato, manipulando informações para atingir o governo Dilma e o PT, em cujas gestões as instituições fiscalizadoras e policiais efetivamente funcionaram combatendo a corrupção como nunca antes no país;
e) querem aproveitar e amplificar a insatisfação conjuntural da maioria da população em relação ao governo Dilma, conforme pesquisas amostrais divulgadas;
f) torcem e distorcem as conclusões que virão do Tribunal de Contas da União (TCU) em ralação às propaladas “pedaladas fiscais” que sempre socorreram os governos;
g) torcem e distorcem as conclusões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em relação ao julgamento das contas de campanha eleitoral da candidata Dilma Rousseff;
h) não possuem escrúpulos em tentar organizar, com base em maioria circunstancial, o desrespeito ao Estado Democrático de Direito, golpeando a Constituição e depondo uma presidente legitimamente eleita na única pesquisa que tem valor universal: a do voto livre, democrático e secreto de mais de 54 milhões de eleitores em todo o país;
i) E, por fim, estão ansiosos e com pressa para dar um passo atrás no país.
O Congresso Nacional também vive uma crise de credibilidade. Se assegurassem os tanques nacionais ao alcance e a frota estadunidense por perto, como em 1964, não tenho dúvidas que apostariam tudo, sem olhar o futuro, repetindo a história. Não duvido, infelizmente, que o PSDB, que nasceu socialdemocrata, hoje seja herdeiro do velho udenismo golpista e entreguista. E que, apesar de desacreditada, a grande imprensa tem alto poder de influência quando focalizada e instrumentalizada.
Só que o Brasil mudou: com mais de 200 milhões de habitantes e a sétima economia do mundo, os avanços sociais recentes retiraram o país do Mapa da Fome e hoje somos respeitados como liderança planetária por todos os países de todos os continentes – Lula é referência mundial.
Acho improvável, mas se tentarem a aventura antidemocrática do golpe, com o nome fantasia que quiserem dar, não duvido que haja resistência política de instituições, organizações e movimentos democráticos e populares.
O embate de ideias e projetos faz parte da democracia e o diálogo é sempre possível. Eu, por exemplo, defendo a recomposição das forças democráticas e de esquerda com uma nova plataforma programática, mas a legalidade democrática precisa ser respeitada. O Brasil não pode perder o respeito internacional, duramente conquistado desde a redemocratização, em 1985 e, sobretudo, impulsionado nos últimos 12 anos.
O calendário político-eleitoral é determinado pela Constituição. É preciso respeita-la.
Osvaldo Russo é conselheiro da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra).
Artigo publicado no Correio da Cidadania e América Latina en Movimiento