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Oposição chilena apresenta no Congresso um pedido de impeachment contra Sebastián Piñera pelos ‘Pandora Papers’

Um grupo de deputados de todos os partidos da oposição chilena apresentou nesta quarta-feira no Congresso uma denúncia para destituir o presidente Sebastián Piñera pela polêmica venda de uma mineradora em um paraíso fiscal confirmada nos Pandora Papers, publicados por este jornal e por um consórcio de veículos de comunicação nacionais e internacionais. A Câmara dos Deputados, controlada pela oposição, decidirá agora se aprova ou rejeita a acusação em uma votação a ser realizada na primeira semana de novembro. Se aprovada, a causa contra Piñera irá para o Senado, que teria de atuar como júri.

Piñera usou “seu cargo para negócios pessoais”, disse o deputado Tomás Hirsch ao apresentar a acusação na Câmara dos Deputados, a primeira etapa de um processo de impeachment que poderia durar várias semanas. A acusação constitucional, que segundo o presidente chileno “não tem fundamento algum”, se junta a uma investigação criminal aberta pelo Ministério Público há cinco dias pela mesma operação: a venda em 2010 da mineradora Dominga por Piñera a um de seus melhores amigos através de uma empresa offshore com sede nas Ilhas Virgens Britânicas. O pagamento da terceira parcela dessa venda estava sujeito à não declaração da área de operações como reserva natural, decisão que ficou nas mãos de Piñera quando já era presidente. A venda chegou à justiça em 2017, quando Piñera foi absolvido. No entanto, o documento em inglês desse contrato foi encontrado nos Pandora Papers. Como aquele processo só teve acesso à tradução de uma cópia, o Ministério Público considerou que há “elementos novos” para iniciar outra investigação contra o presidente. O Governo defende que o documento em inglês é um elemento associado ao mesmo negócio e não deve ser levado em consideração.

A legislação chilena não contempla nenhum tipo de imunidade ao presidente, que pode ser investigado e até preso durante o mandato. O processo de impeachment poderia começar a seis semanas das eleições gerais, e a apenas cinco meses de Piñera terminar seu mandato. A oposição poderia ter esperado até setembro do próximo ano para avançar sobre o presidente, mas optou por fazê-lo já. “Em nosso país, felizmente, existe o Estado de Direito e as instituições estão funcionando”, disse o deputado socialista Jaime Narango. “O Serviço de Impostos Internos e o Ministério Público estão fazendo o seu trabalho, nós também como Câmara e órgão fiscalizador. O presidente, que deve dar o exemplo, atenta contra a imagem do país. Causa-nos dor e tristeza que o Chile passe por esta situação por culpa do presidente”, acrescentou.

Com uma popularidade em torno de 20% e uma rejeição de 70%, Piñera termina seu segundo mandato com o Ministério Público em cima e sob a ameaça de destituição por um conflito que não conseguiu encerrardesde que chegou ao palácio de La Moneda em 2010: a difusa linha de separação entre seus negócios e a política. Os governistas, que não têm maioria parlamentar, consideram que o caso da mineradora Dominga é coisa julgada, mas a campanha eleitoral não ajuda Piñera a ganhar apoios. Sebastián Sichel, o candidato presidencial de La Moneda, terceiro colocado nas pesquisas, foi especialmente duro. Durante um debate de candidatos realizado em 11 de outubro, Sichel disse estar disposto a apoiar “as comissões de investigação que forem necessárias”, embora tenha esclarecido em seguida que, em sua opinião, “destituir um presidente, seja quando for, é um absurdo”.

A oposição, porém, argumenta que Piñera, como um dos empresários mais ricos do Chile, tem um longo histórico de conflito de interesses. “É um presidente chamado ao Ministério Público por corrupção e suborno. Pode-se pensar que as pessoas tomam decisões erradas, mas quando há antecedente, é impossível acreditar que não seja culpado”, disse o líder da bancada da Democracia Cristã no Congresso, Gabriel Ascencio. Caso ocorra o impeachment, Piñera será o primeiro presidente chileno a não terminar o mandato desde o retorno à democracia, em 1990.

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