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Proteção integral é direito

 Osvaldo Russo

Na contramão da tendência mundial de promover o desenvolvimento humano e fortalecer os direitos da infância e da adolescência, a bancada da bala no Congresso Nacional está liderando a onda conservadora que quer remendar a Constituição reduzindo a maioridade penal e instituindo um retrocesso civilizatório no Brasil.

Os adolescentes são mais vítimas que agressores. A violência urbana atribuída a eles está associada à prevalência de desigualdades sociais, sendo que, segundo dados do Ministério da Justiça, apenas 0,5% dos homicídios são praticados por adolescentes. No DF, em 2012, de todos os óbitos por agressão, 54,5% foram de jovens entre 15 e 29 anos. Dos óbitos decorrentes de agressão contra jovens, 92,5% atingiram garotos e homens, dos quais 88,1% eram negros. Em vez de jovens mais cedo na cadeia e mais tempo nas celas, a solução está nas políticas públicas de proteção social e educação.

Até a promulgação da Constituição de 1988 e o advento da Lei Orgânica de Assistência Social (Loas), em 1993, a assistência social não era concebida como política pública, mas como um conjunto de ações isoladas, improvisadas e descontínuas. Em 2005, com a implantação do Sistema Único de Assistência Social (Suas) e, em 2011, com a sua incorporação à Loas, institui-se um modelo descentralizado e participativo que regula e organiza a rede de serviços socioassistenciais em todo o território brasileiro.

O Suas confere à assistência social força suficiente para, ao lado da previdência e da saúde, formar, de maneira sólida, o tripé da seguridade social. Hoje, a assistência social é direito do cidadão, com a consolidação de uma rede de proteção social em todo o país, garantindo à população acesso aos benefícios e serviços socioassistenciais.

Segundo o IBGE, em 2013, os Centros de Referência de Assistência Social (Cras), responsáveis pela proteção básica à população, totalizavam 7.986 unidades em 5.437 municípios do país, sendo que, em 2.032 municípios já estão funcionando 2.229 Centros Especializados (Creas), garantindo atendimento às famílias e aos indivíduos em situação de violência física, psicológica e sexual, tráfico de pessoas, entre outras violações.

As 14 milhões de famílias beneficiárias do Bolsa Família formam o público prioritário do Suas, sendo que 16 de milhões de crianças e adolescentes são mantidos estudando nas escolas. As políticas sociais implantadas, principalmente a partir de 2003, não só reduziram a miséria e a pobreza, como constituíram um sistema público de proteção social, mediante a universalização da oferta de benefícios e serviços à população.

Mas é preciso avançar mais qualificando os serviços, combatendo as desigualdades e garantindo os direitos dos segmentos sociais mais vulneráveis, especialmente crianças, adolescentes e jovens. Adolescentes pobres, negros ou pardos e fora da escola formam o perfil da população juvenil encarcerada no Brasil, o que reforça a importância da educação na prevenção e na ressocialização dos jovens autores de atos infracionais.

Em 2013, a Codeplan (Companhia de Planejamento do DF) e a Secretaria da Criança entrevistaram 1.126 adolescentes e jovens, de 13 a 20 anos, que cumpriam medidas socioeducativas, sendo que 539 em medida de internação, 450 em liberdade assistida, 59 em semiliberdade e 78 prestavam serviços à comunidade. Do total, 92,3% eram do sexo masculino, 80,6% negros, 79,3% de famílias com renda mensal de até três salários mínimos e 74,9% não tinham instrução ou não completaram o Ensino Fundamental.

Quanto à formação e qualificação profissional, 47,3% dos internos declararam gostar ou gostariam de cursar informática, 28% mecânica de automóveis e 14,1% eletroeletrônica. Quanto a planos para o futuro, 93,5% achavam que daqui a 10 anos terão uma vida melhor, daqui a cinco anos 95,9% estariam trabalhando e 93,1% achavam que ir à escola pode mudar a sua vida, o que reforça a importância da educação.

Os adolescentes que praticam ato infracional querem estudar e possuem sonhos, mas é preciso adotar métodos mais eficazes de ressocialização para além dos limites da internação, conforme diretriz do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase). Em vez de retroceder, é necessáriopreservar as conquistas do nosso marco legal civilizatório, que protege de forma integral a infância e a adolescência no Brasil.

Osvaldo Russo foi secretário de Desenvolvimento Social do Distrito Federal e membro do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente.

 

Artigo publicado no Correio da Cidadania – 27/04/2015

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