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“Lula Livre, Marielle Vive” dá o tom do 8M no DF e afronta propostas de Bolsonaro

Pelo Twitter, o presidente de extrema direita Jair Bolsonaro disse, nesse 8 de março, que é preciso respeitar o “feeling da mulher” (feeling significa intuição, em inglês) antes de apresentar propostas a elas. Na mesma declaração, ele denominou as mulheres como “jóias raras”, um adjetivo altamente questionável quanto ao significado, totalmente despolitizado e completamente destoante da verdadeira realidade das mulheres, vítimas de feminicídio, assédios, rebaixamento da força de trabalho, repressão de seus costumes e corpos. Enquanto Jair Bolsonaro tornava pública sua verborragia, mulheres do Distrito Federal e de todo o Brasil, do campo e da cidade, cis e trans, de forma unificada, foram às ruas apresentar suas pautas, que estão longe de se ancorarem em sentimentos intuitivos. Ao contrário, são reivindicações respaldadas por números sólidos e alarmantes motivados pelo machismo, o desrespeito e a desvalorização.

No Distrito Federal, as pautas urgentes e reais das mulheres foram apresentadas em ritmo de carnaval, no Cortejo do Dia Internacional de Luta das Mulheres. Com o lema “Pela vida de todas as mulheres, resistiremos!”, elas se concentraram em frente à rodoviária do Plano Piloto, desceram em marcha pela Esplanada dos Ministérios até próximo à Alameda das Bandeiras e terminaram o ato na Praça dos Prazeres (201 Norte). “Lula Livre, Marielle Vive” foi um dos principais gritos durante o primeiro 8 de março no governo Bolsonaro.

“Lula foi o primeiro presidente que colocou a luta pelo direito das mulheres, pela igualdade de gênero, como política pública. E fez isso criando uma Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, com status de ministério, com vários programas: desde o empoderamento econômico das mulheres, através do Bolsa Família, da aposentadoria das trabalhadoras rurais, até o Minha Casa Minha Vida, o Conselho da Mulher, o fortalecimento das conferências. Lula entendeu que a emancipação da mulher era fundamental para a emancipação do povo brasileiro”, disse a presidenta do PT Nacional, deputada Gleisi Hoffmann, ao justificar por que Lula Livre foi uma das pautas deste 8 de março.

Já a porta-voz da ala “Justiça para Marielle”, Leonor Soares, que integra o Coletivo de Mulheres Jornalistas do DF, trazer para este 8 de março a memória da vereadora do PSOL executada no Rio de Janeiro por milicianos, “traz o peso das pautas que Marielle Franco lutava: em defesa dos direitos humanos, das mulheres faveladas, das mulheres cis, lésbicas, trans e bissexuais”. “Marielle foi assassinada pelo que ela representava. Mas se eles pensaram que iam nos amedrontar, que iriam nos calar, eles estão muito enganados. Prova disso é a quantidade de mulheres negras que estão aqui hoje”, disse.

E foi gritando “Lula Livre, Marielle Vive”, que as mulheres do DF também exigiram o fim do feminicídio (assassinato de mulheres pelo fato de serem mulheres), o fim da reforma da Previdência, a revogação da reforma trabalhista, a defesa da Lei Maria da Penha e seus aparelhos, o combate à lei da alienação parental, o fim do racismo, uma escola democrática, a proteção à vida das mulheres LBTs, o fim da criminalização dos movimentos sociais, o embarreiramento do avanço do capital e suas consequências socioeconômicas culturais, o fim do genocídio indígena e de quilombolas.

Embora o machismo seja cultural e a desigualdade entre homens e mulheres seja historicamente escrachada, todos os problemas que têm as mulheres como alvo central levantados neste 8 de março, são consequência das políticas de Jair Bolsonaro, iniciada por Michel Temer, ou, no mínimo, aprofundados por eles. Foi o que disse a secretária de Mulheres da CUT Brasília, Sônia de Queiroz.

 

“Bolsonaro e Temer golpista deram início ao retrocesso no que diz respeito aos direitos e à dignidade da mulher. Leis, as reformas trabalhista e a da Previdência, o aumento dos casos de feminicídio, a repressão à livre expressão da mulher, a maior desvalorização de sua força de trabalho através da precarização das relações trabalhistas e tantas outras questões foram criadas ou, na menor das hipóteses, acentuadas por Bolsonaro e Temer. Políticas que, inclusive, vêm sendo fielmente seguidas no DF pelo governador Ibanez Rocha. E é por isso que este 8 de março é um marco na história do DF e do Brasil. Nós mulheres, não vamos nos calar enquanto pelo menos uma de nós for vítima do machismo e da misoginia”, disse a sindicalista.

Em carta divulgada nas redes sociais, o presidente Lula disse que o 8 de março é “dia de marcar posição frente aqueles que hoje no poder tentam deslegitimar a luta de quem tem como ideal a igualdade de direitos”. “De onde me encontro, sigo em resistência pela construção da sociedade que sonhamos juntos, de um Brasil com oportunidades iguais para todos e todas”, escreveu Lula.

Reforma da Previdência

O governo Bolsonaro encaminhou ao Congresso Nacional, no dia 20 de fevereiro, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 06/2019, que dá origem à reforma da Previdência. Se as novas regras forem aprovadas, mais uma vez, as mulheres serão as mais prejudicadas.

A advogada Fernanda Giorgi, da LBS Advogados, destaca que a reforma da Previdência de Bolsonaro ataca as mulheres muito além da idade mínima para a aposentadoria, que, pelo texto, passaria de 60 para 62 anos.

“A reforma da Previdência atinge as mulheres quando dificulta e diminui o valor do BPC (Benefício de Prestação Continuada), pois são majoritariamente as mulheres que trabalham no cuidado das pessoas idosas. A reforma prejudica as mulheres do campo ao, praticamente, extinguir suas aposentadorias. Por causa do trabalho de reprodução e da dupla, tripla jornada de trabalho, as mulheres têm uma entrada e saída muito grande no mercado de trabalho, dificuldade de se manter nesse trabalho e, consequentemente, dificuldade de chegar no tempo de contribuição exigido. Sabemos que o tempo mínimo de contribuição exigindo é de 20 anos, mas para conseguir atingir esse tempo, é preciso trabalhar muito mais. A reforma da Previdência ataca as mulheres em todos os pontos. É uma crueldade mesmo”, afirma a advogada.

Segundo a dirigente do Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra, Sandra Maria da Silva Catanhede, “a reforma da Previdência é um ataque frontal às mulheres do campo”. “Estamos resistentes e viemos mostrar isso neste 8 de março. Nosso recado é: esse governo não nos representa. Ele Não!”

Vidas negras importam

De acordo com o seminário “Mulheres Negras Movem o Brasil: visibilidade e oportunidade”, promovido pela Câmara dos Deputados, em 2018, as mulheres negras no Brasil são as que mais sofrem com o feminicídio, a violência doméstica e obstétrica, a mortalidade materna e a criminalização do aborto. E isso pode ficar ainda pior com a aplicação das políticas de Bolsonaro.

“Quando um governo assume que uma mulher negra, trabalhadora, não terá seus direitos garantidos e que, com certeza, essa mulher vai morrer no seu trabalho e esse trabalho não vai ser valorizado profissionalmente, é caótico”, avalia a professora aposentada Neide Rafael, da Frente de Mulheres Negras do Distrito Federal e Entorno, uma das manifestantes do ato desse 8 de março.

Ela lembra dos governos de Lula e Dilma, reforçando que eles respeitaram “aluno cotista, mulher trabalhadora, a cultura nacional”, e afirma que, no atual governo, não se tem sequer respeito.

“Eu gostaria que, minimamente, essas trabalhadoras negras fossem respeitadas; que suas carteiras fossem assinadas, que seu tempo de trabalho fosse respeitado, que elas não fossem violentadas – inclusive por outras mulheres. São as negras e negros que movem, majoritariamente a indústria, o comércio; pegam seus trens, ônibus e metrôs todos os dias às 4h da manhã. E ainda se ouve que as negras não são tão esforçadas”, diz a professora.

Fundamentalismo religioso

Totalmente desatrelado dos princípios de amor e caridade, pertinentes a qualquer religião, Jair Bolsonaro e oportunistas religiosos que os seguem fizeram dos fiéis massa de manobra para vencer as eleições presidenciais de 2018. Desse grupo, foram as mulheres que deram o maior número de votos a Bolsonaro.

De acordo com a pastora Wall, que integrou a ala Estado Laico no ato desse 8 de março, o “fundamentalismo religioso causa uma separação entre as mulheres que não integram nenhuma organização religiosa e as mulheres que frequentam essas organizações”. Os resultados, segundo ela, são desastrosos e de difícil reparo.

“Não podemos, enquanto movimento social de mulheres, esquecermos que dentro dessas organizações religiosas têm mulheres que estão sendo oprimidas, vítimas de violência doméstica, que estão sendo usadas por lideranças religiosas para que eles façam das organizações religiosas um mercado e com isso enriqueçam, explorando essas mulheres”, disse a pastora Wall.

Não é feeling, é realidade

Ainda nesse 8 de março, durante cerimônia de comemoração do Dia Internacional da Mulher, no Palácio do Planalto, Bolsonaro disse que a equipe ministerial está “equilibrada” ao ter ” 20 ministros e 2 ministras. A justificativa foi de que cada ministra vale por “dez homens”.

Essa noção de igualdade pode agravar ainda mais a situação das mulheres brasileiras.
Segundo estudo do Banco Mundial, apenas 6 das 187 nações têm paridade total direitos econômicos entre homens e mulheres. E o Brasil, nem de longe, está neste grupo de apenas um dígito.

Em documento divulgado no último dia 7 pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), foi comprovado que as mulheres ganham, em média, salário 20% menor que o dos homens. No Distrito Federal, as mulheres a partir dos 14 anos recebem, em média, 71,5% do salário dos homens. No contracheque, isso representa uma diferença de R$ 1.334, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em contraponto, segundo o instituto, mulheres trabalham, por semana, três horas a mais que os homens, já que são as principais responsáveis pelo cuidado de pessoas e afazeres domésticos.

De acordo com levantamento do Datafolha feito em fevereiro, nos últimos 12 meses, 1,6 milhão de mulheres foram espancadas ou sofreram tentativa de estrangulamento no Brasil, enquanto 22 milhões (37,1%) de brasileiras passaram por algum tipo de assédio. Entre os casos de violência, 42% ocorreram no ambiente doméstico. Só em janeiro de 2019, foram registrados 119 casos de feminicídio. Dos quase 200 países, o Brasil é o quinto mais violento contra as mulheres.

Fonte: CUT Brasília
Fotos: Rodrigo Pilha

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