Distrito Federal

“Flávia e Damares são farinha do mesmo saco”

Entrevista com Rosilene Corrêa por Brasília Capital

A ex-diretora do Sindicato dos Professores (Sinpro-DF) e diretora licenciada da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), professora Rosilene Corrêa (PT), aposta na vitória contra as duas bolsonaristas líderes nas pesquisas eleitorais na disputa pela vaga de senadora do DF nas eleições de 2 de outubro.

“Elas representam o que nós estamos vivendo hoje no nosso País. Eu represento o oposto, que é trazer o outro Brasil de volta e avançarmos”, disse ela em entrevista aos jornalistas Orlando Pontes e Paulo Miranda no programa Brasília Capital Notícias – Eleições 2022, uma parceria da TV Comunitária com o Brasília Capital e o blog do Chico Sant’Anna.

Como será essa reta final de campanha para tirar a diferença que separa você das duas líderes nas pesquisas? – Não temos espaço na grande mídia. Era natural nesse primeiro momento nossa campanha sofrer com o desconhecimento do nosso nome. Mas quando iniciamos a campanha com aparições na televisão isso mudou. No jogo político, quem tem estrutura leva vantagem. Mas não tenho dúvida de que na medida em que as pessoas estão tomando conhecimento que tem outra candidata, uma professora que representa a classe trabalhadora, é defensora da educação e representa um projeto antagônico ao que elas representam, nosso nome vai crescer. O que elas representam é o que nós estamos vivendo hoje no nosso País, e eu represento o oposto, que é trazer o outro Brasil de volta e avançarmos.

O candidato Hélio José disse que poderia ter havido um acordo do campo progressista de uma candidatura única ao Senado. Ainda há chance disso ocorrer? – A nossa federação se esforçou muito para que isso acontecesse. Infelizmente não foi possível. Da nossa parte continua a posição de que seria o mais razoável, o mais responsável. Aliás, quero registrar aqui a grandeza do gesto do PSB com a retirada da candidatura do Rafael Parente para apoiar o Leandro Grass ao GDF.

Inclusive, pesquisa do Instituto Veritá, publicada pelo Brasília Capital já aponta o Grass em segundo lugar. Você sente isso na rua? – O tempo todo. É muito diferente de uma semana anterior para agora. Eu andei pelo Setor Comercial com o Leandro um dia desses, no corpo a corpo, e a recepção foi muito boa. As pessoas já nos identificam como os candidatos do Lula ao GDF e ao Senado. As pessoas estão insatisfeitas com o que está aí.. E quando a gente coloca a necessidade de fazer diferente, de inovar, desperta o interesse das pessoas.

Então você acredita que dá pra virar esse jogo? – Nós ainda temos um quadro muito indefinido. As pesquisas têm um percentual alto de indefinição em que se vai votar. É esse tempo que teremos para nos apresentarmos e dizer mostrar a importância do voto para o Senado. Para mim, o grande desafio é inverter a lógica do distanciamento que a população tem do Senado. Serei uma senadora que será vista e lembrada pelo eleitor e pela população. Terei uma atuação parecida com a de uma vereadora, que realmente estará onde as pessoas estão. Vou abrir um canal de diálogo para ouvir a população. Vamos debater educação, saúde e cultura com as pessoas.

Como seria feito isso? – Andando pelo Distrito Federal, estou vendo o tanto que tem gente organizada, sobrevivendo, fazendo o que o Estado não faz. E claro que tendo uma senadora parceira, como aqui na nossa TV Comunitária, nas rádios comunitárias, na mídia alternativa, a gente pode estreitar essa relação e fortalecer também esse campo. Então, nós temos muito o que fazer. Para isso, precisa de um Senado que esteja junto, perto.

Vamos decifrar o que é este antagonismo de que você fala entre a sua candidatura e as das duas líderes nas pesquisas… – Na medida em que a gente anda, a gente conversa e vê de perto as necessidades das pessoas. Existe no DF gente que não tem água potável em plena capital do País. Como senadora, vou lutar fortemente para que nenhuma mulher fique sem teto. E quando falo mulher, é porque nós temos nas comunidades carentes uma maioria de mulheres que cuidam de seus filhos. Mas nosso projeto é ninguém sem teto, todo mundo com água potável e nenhuma criança sem creche. A política de construção de creches públicas está abandonada desde a derrubada da presidenta Dilma. Tínhamos esse programa em andamento, algumas poucas foram concluídas depois disso e não se fala mais. Queremos uma juventude cuidada, que tenha uma educação de qualidade, cursos profissionalizantes que capacitem para o mercado de trabalho.

E a questão da fome? – Nada justifica o Brasil ser um dos maiores produtores de soja e País registrar os aumentos que nós temos tido no litro de óleo que compramos para nossa cozinha. Só se pensa em exportação. Que política é essa que você tem em plena pandemia o aumento dos super ricos, que ficaram mais ricos, e mais novos super ricos, enquanto a pobreza aumenta. São 33 milhões de pessoas passando fome. Então, tem muita coisa a ser feita. Por isso que gente precisa ter todo cuidado na hora de fazer essa escolha. Será apenas uma cadeira a ser renovada no Senado para os próximos oito anos.

Como será seu posicionamento em relação às privatizações, por exemplo, dos bancos públicos e do setor elétrico? – É importante discutirmos que País nós queremos, que nação nós queremos. Nós queremos ou não queremos soberania? Ai, botam a bandeira do Brasil e dizem que são patriotas. Como é que eu posso me intitular patriota se estou entregando o Brasil e nossas riquezas naturais e patrimoniais. Como é que vamos ter soberania se não temos tecnologia própria, se não investimos em pesquisas?

Além dos cortes de recursos das universidades públicas… – São cortes naquilo que pode desenvolver o País. Ordem e Progresso passa por investimento, e não pelos cortes. E se eu sou patriota, preciso fortalecer o Estado brasileiro. Ele precisa de fato ser soberano. E ser soberano é você fazer pra dentro, sem comprometer a sua relação com o exterior.

Como você explica a ausência de opositores a Bolsonaro nas comemorações do 7 de Setembro? – Primeiro, medo. E eu falo isso por mim mesma, do meu receio de sair pelas ruas, de me contrapor a isso e ser agredida, porque hoje é esse o risco que nós corremos. E já tivemos provas disso. Gente sendo assassinada porque se manifestou politicamente. Hoje, o crime político realmente é uma ameaça.

Então, a maioria silenciosas está com Lula? – As pessoas estão tendo cuidado. E esse cuidado é porque você precisa se preservar, inclusive para se contrapor a isso. Não é por estar em campos opostos que precisa ser inimigo. Isso não é divergência. É ódio. Pessoas estão sendo movidas pelo ódio e aí nós não reagiremos da mesma forma. E nesse sentido a gente acaba ficando na fragilidade. Eu entendo que no 7 de Setembro a decisão da maioria das pessoas foi essa: deixa que eles façam a exposição deles. Ficou muito claro qual era a intenção: o presidente fazendo o discurso, transformando aquilo num comício. E falou para os dele de sempre, e aí a troca entre eles.

Usurparam o Dia da Pátria? – É algo assim. De 7 de Setembro, de comemorar o bicentenário da Independência não tinha nada. A independência do Brasil só virá com o nosso povo educado, com o combate ao analfabetismo, com todas as crianças na escola, com todos os jovens na universidade. É esse Brasil que vai ser independente.

Como você pode contribuir para isso? – Por isso a importância de termos, pela primeira vez no DF, uma senadora da educação. Mas não se trata de ter como única bandeira a educação, embora se a gente tiver como bandeira a educação, a educação vai impactar em tudo. O compromisso que eu faço é de batalhar muito para mais recursos para a educação em todo o Brasil, com o cuidado especial pela educação do DF. Precisamos colocar o DF para andar para a frente, de forma que inclua as pessoas. Não dá para termos gestões públicas como estamos tendo, de exclusão, de abandono. Esse modelo não serve. O projeto das minhas adversárias é esse que nós estamos vivendo agora. É esse que nós precisamos derrotar.

O ex-senador Cristovam tinha essa bandeira. Sem ele, ficou o vácuo. Ele apoia a sua candidatura? – Estive com ele, conversamos bastante e vamos continuar essa conversa. Ele já me deu várias dicas. A gente se complementa, porque o professor Cristovam tem uma experiência acadêmica muito grande. Agora, tem a Rosilene professorinha lá da escolinha de Samambaia, lá do chão da escola, e a minha experiência também na Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE). De conhecer, portanto, o que é educação nesse Brasil afora, inclusive a educação do campo.

Ele também declarou voto ao Lula… – Esse é o movimento da sensatez, das pessoas percebendo o que está acontecendo no Brasil. É o movimento da seriedade diante da gravidade do que nós estamos vivendo. Não dá para manter alguns rancores e desavenças ou divergências que são naturais na política, na vida. O momento é de defender o Brasil ou ficar do lado de quem está acabando com o nosso país.

De que forma você conciliaria a demanda por moradia e a preservação da Floresta Nacional, que, segundo projeto aprovado por uma de suas adversárias, perderá 40% da cobertura para a legalização do Assentamento 26 de Setembro? – Com planejamento. Não tem outro jeito. Planejamento e um programa habitacional responsável. Hoje não tem nada que pode ser pensado que não seja numa lógica da sustentabilidade. É preciso ter um programa habitacional da sustentabilidade. É preciso gerar emprego, mas emprego sustentável. É preciso combinar isso. Não tem segredo, porque a demanda chega. O povo está aí. Ninguém pode ficar morando nas ruas. Mas é preciso planejar. O grande problema é existe um acumulo. E nós temos aqui uma responsabilidade muito grande do ponto de vista ambiental, porque o quadradinho do DF é de uma riqueza natural e de uma importância muito grande com as nascentes das três maiores bacias hidrográficas do Brasil, além do Cerrado. O ideal seria que não tivéssemos que levantar mais nenhuma parede. Mas isto não é possível. Tem gente que precisa de casa. O programa de governo da frente Brasil da Esperança trata disso com muita responsabilidade, que é o cuidado com as pessoas, mas preservando o meio ambiente. O que não se pode é querer mostrar responsabilidade com o meio ambiente derrubando casas, como a gente tem visto. A solução não pode ser esta.

A atual gestão do Buriti deu ênfase a grandes obras. Mas o funcionalismo, como um todo, ficou praticamente sem reajustes salariais. Isto mudaria num eventual governo da frente Brasil da Esperança? –

Na prática, é como se o último reajuste dos professores tivesse sido em setembro de 2015, considerando que nós só recebemos a última parcela em junho de 2022, de 3,7% depois de sete anos. Então você faz as contas: são sete anos e joga a inflação em cima disso. E o servidor federal também está na mesma coisa, de cinco a seis anos sem reajuste.

Dá para entender como Bolsonaro, segundo as pesquisas, lidera as intenções de voto para presidente em Brasília, uma cidade de servidores públicos? – O pior é que, mais do que o problema salarial, existe o problema das más condições de trabalho, dos assédios. Veja o caso da Caixa Econômica Federal. Não só assédio sexual, mas assédio moral acontecendo toda hora. Encontro gente na rua em campanha que me abraça e pede para não tirar foto porque se for vista nas redes sociais pode dar problema. Que democracia é essa? E esse e esses servidores sustentarem isso é muito triste.

Isso se reproduz no Palácio do Buriti? – Totalmente, o Ibaneis assumiu que é bolsonarista.  Finalmente teve coragem. Agora não fica dúvidas para ninguém de que o que temos aqui na verdade é um puxadinho do Planalto. Por isso insisto em dizer que se os eleitores não fizerem a sua parte, esse País vai sofrer por décadas, porque a “apropriação” que vai acontecer e a nossa democracia vai realmente para o espaço. Isso é bem grave.

Qual seria a sua mensagem para esse eleitor neste momento? – Primeiro, um apelo para que seja bastante criterioso. Que busque informações, especialmente sobre as candidatas ao Senado. Por onde andam e andaram Flávia Arruda e Damares Alves. Quem foi Damares no ministério? Vale lembrar que em plena pandemia ela deixou de executar 70% do orçamento para as políticas de proteção à mulher, os direitos humanos, a infância. Tudo que ela diz que quer fazer, ela foi ministra e fez exatamente o contrário. A Flávia foi a grande articuladora do Orçamento Secreto. Inclusive, agora, o governo anuncia o remanejamento de muito dinheiro da Farmácia Popular. Isto é remédio, é saúde do pobre, que está sendo remanejado para o Orçamento Secreto. Essas duas pessoas são farinha do mesmo saco, e a marca dessa farinha é Bolsonaro. E eu tenho de certeza que a população de Brasília não quer essa farinha no armário da sua casa, no seu prato. Eu até costumo dizer que essa farinha é podre, porque o resultado dela é fome, aumento do feminicídio, inflação alta. Vale lembrar qual foi a postura das duas durante a pandemia quando o presidente delas não tomou providencias para as vacinas, deixando tanta gente morrer: não fizeram nenhuma manifestação. O Brasil tem 80% das mortes de gestantes na conta mundial durante a pandemia. Isso significa que de dez mulheres grávidas que morreram pela covid, oito eram brasileiras. E não vi nenhum lamento nem da Flávia nem da Damares. Proteger mulheres significa sustentar políticas que empoderem as mulheres e que dêem a elas proteção, emprego, dê casa, creche para seus filhos, para que elas possam inclusive estar no mercado de trabalho. Esse Brasil é o Brasil que estamos vivendo e que não é o nosso Brasil, e não precisa ser. E a gente começa essa mudança nas urnas de 2 de outubro.

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