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A participação do NDD na luta contra o golpe de 2016

A Praça dos Três Poderes pulsava. Não exatamente como previu o arquiteto Lúcio Costa quando enviou seus projetos para avaliação do concurso nacional. Ele pensou na autonomia e no equilíbrio dos três poderes. Projetou um triângulo equilátero, onde o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal representavam a base do triângulo e o Congresso Nacional o seu ápice. Mas, agora, a Praça dos Três Poderes pulsava pela presença dos inoxidáveis – militantes, ativistas e apoiadores da democracia. O Núcleo em Defesa da Democracia Margarida Alves passou a ocupar a praça todas as segundas-feiras, a partir de março de 2016, das 18h até 20h, juntamente com os demais coletivos, como o Núcleo de Base Marisa Letícia do Congresso Nacional, Rosas pela Democracia e Mulheres com Luta pela Democracia. Debaixo de sol ou chuva, com frio ou calor, eles e elas estavam lá, demarcando terreno, empunhando as bandeiras, gritando palavras de ordem, opondo-se ao golpe parlamentar, midiático e jurídico. Diante dos ônibus que trafegavam na via, lotados de trabalhadores e trabalhadoras, havia dezenas de gritos “não vai ter golpe; vai ter luta!”. A presença militante de cada um não foi tranquila. O embate foi sempre muito duro com as ruas. Afinal, o oligopólio da mídia batia no governo petista e no partido dia sim e no outro também. Os manifestantes tinham a consciência de que a vida não seria fácil na Praça dos Três Poderes. Os xingamentos eram constantes. Mas também havia momentos de satisfação, quando alguém os aplaudia, gritava palavras de incentivo, sinalizava com a mão e buzinava de dentro dos automóveis na avenida. Para cada xingamento, havia uma resposta pronta. E a cada apoio, uma chama de esperança que rendia alegria e gratidão.

O coordenador do NDD Raimundo Nonato relembra as atividades realizadas na praça e a participação dos inoxidáveis nas grandes manifestações realizadas no DF. “Organizamos rodas de conversa, vigílias culturais e comemorações de datas importantes. Apoiamos e estivemos presentes em todos os atos democráticos, organizados pelos movimentos: sociais, indígenas, mulheres, negros, além da Marcha das Margaridas e da Greve Geral”, diz. 

Após as duas primeiras reuniões no espaço coberto da sede do PT Nacional em Brasília, o grupo passou a realizar os encontros na praça. Foi lá que surgiram todas as ideias de mobilização. As propostas eram discutidas ao redor de um banco de alvenaria, ao ar livre, e submetidas a votação. Ações que levaram flores para Dilma (Palácio do Planalto), serenata para Dilma (Palácio da Alvorada) e café da manhã na despedida de Dilma foram aprovadas no espaço público da praça. Também foi realizado um culto ecumênico, os manifestantes, munidos de vassouras, escovão e rodo, lavaram a entrada do Supremo Tribunal Federal e assaram traíras, em alusão à conspiração pelo golpe de 2016.

Uma das atividades mais emocionantes foi denominada “Abraço da Democracia – mulheres com Dilma”. Organizado, inicialmente, pelo Núcleo de Mulheres “Rosas pela Democracia”, que pretendia entregar orquídeas para a presidenta no Palácio do Planalto, a ideia contagiou outros núcleos e precisou ser reformulada. No dia 19 de abril de 2016, dois dias após o vexame da votação na Câmara dos Deputados, mais de 400 pessoas, a maioria de mulheres, compareceram à frente do Palácio do Planalto. Cada pessoa segurava uma flor diferente. A emoção maior foi quando a presidenta Dilma Rousseff desceu a rampa do Palácio e se encontrou com os apoiadores e apoiadoras. Já era início da noite e a cena comovente de abraços, beijos, palavras de carinho e gritos de apoio contagiou Dilma que estava radiante. As luzes de celulares complementaram a energia do encontro que também contou com o apoio e a participação dos inoxidáveis.

Além de lutar pela democracia e de denunciar o Golpe de 2016, o NDD se pautou pela solidariedade. Segundo o presidente do PT-DF, Jacy Afonso, havia um sentimento de que era necessário fortalecer a presidenta. “A gente queria demonstrar para a Dilma que ela não estava só, que estávamos juntos. Muita gente compreendia o que estava acontecendo e se mantinha ao seu lado”, disse. E foi com essa intenção que os inoxidáveis decidiram realizar uma serenata para a Dilma no Palácio da Alvorada – a residência oficial da Presidência da República. Para Nazaré Brito, atual secretária de Finanças do PT-DF, foi um momento marcante. “Nos emocionamos muito! Foi uma emoção de gratidão por tudo que ela fez por nós e pelo Brasil. A gente queria acolhê-la, dizer que ela não estava só”, relembra Nazaré. A serenata durou até altas horas e contou com mais de 100 pessoas na frente do Palácio, inclusive artistas que se apresentam nos palcos de Brasília. Dilma ouviu tudo e acendeu as luzes num gesto de gratidão aos participantes.



Outra atividade importante foi quando descobriram que Dilma se exercitava de bicicleta pela manhã. Os inoxidáveis organizaram um dia e a acompanharam, pedalando pelas avenidas de Brasília, nas proximidades do Alvorada.

No dia 31 de agosto de 2016, o Senado Federal decidiu derrubar a presidenta Dilma Rousseff, sem que houvesse crime de responsabilidade. A prova de que a decisão fora eminentemente política, sem fato jurídico perfeito que a justificasse, ficou expressa no resultado final. O Senado manteve os direitos políticos da presidenta – fato que demonstra a vergonha de afastar alguém sem culpa, na onda de criminalização da política brasileira, iniciada pela força-tarefa da Lava-jato, coordenada pelo então juiz Sérgio Moro, com apoio da elite brasileira e seus braços institucionais. Em seu discurso de despedida, no Palácio do Planalto, cercada por apoiadores, governadores, ex-ministros e ministras, parlamentares, dirigentes partidários e lideranças populares, Dilma fez questão de dizer, em tom profético: 

“O golpe não foi cometido apenas contra mim e contra meu partido. Isto foi apenas o começo. O golpe vai atingir indistintamente qualquer organização política progressista e democrática. O golpe é contra os movimentos sociais e sindicais, é contra os que lutam por direitos em todas as suas acepções: direito ao trabalho e a proteção das leis trabalhistas; direito a uma aposentadoria justa; direito à terra; direito à educação, à saúde e à cultura; direito aos jovens de protagonizarem a sua história; direito dos negros, dos indígenas, da população LGBTQIA+, das mulheres; direito de se manifestar sem ser reprimido. O golpe é contra o povo e contra a nação. O golpe é misógino. O golpe é homofóbico. O golpe é racista. É a imposição da cultura da intolerância, do preconceito, da violência”, disse Dilma Rousseff, enquanto os inoxidáveis se postavam na praça – o espaço escolhido para protestar.

Na praça, também decidiram participar do “abraçaço pela democracia” no dia da saída de Dilma da residência oficial, ocorrido no dia 6/9. O evento foi organizado conjuntamente com o MST (Movimento dos Trabalhadores e das Trabalhadoras Rurais Sem Terra) e contou com a participação de muita gente. Os inoxidáveis confeccionaram uma faixa em papel, medindo aproximadamente cinco metros de comprimento por um metro de largura. Durante os dias que precederam à despedida de Dilma, centenas de ativistas e visitantes da vigília na praça, puderam preencher todos os espaços com suas mensagens de carinho, afeto e reconhecimento à presidenta. O documento foi entregue em sua saída do Alvorada, sob a mediação do ex-ministro José Eduardo Cardozo. Quando a comitiva da ex-presidenta se deslocava para a saída, os inoxidáveis jogaram pétalas de rosa sobre o carro que conduzia Dilma. E depois se dirigiram à Base Aérea para assistir ao seu embarque para Porto Alegre (RS).

Ao falar sobre esse momento em que a luta parece não valer a pena, Fátima de Deus, uma das fundadoras do PT-DF, disse que “a consciência de quem somos nós nos manteve firmes. As derrotas não podem servir apenas como frustração. Ela nos energiza para buscar as vitórias. É preciso lembrar daqueles que nos antecederam na luta e seguir em frente”, diz.

Na terceira matéria sobre a trajetória do NDD, você saberá como o movimento cresceu na unidade com o campo progressista e suprapartidário. A semente plantada no início, germinou.#

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