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Anatomia da rachadinha

Quebra de sigilos do Caso Flávio revela indícios do esquema ilegal nos gabinetes de Jair e Carlos Bolsonaro

A quebra de sigilos bancário e fiscal de pessoas e empresas ligadas ao senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) revela indícios de que o esquema da rachadinha também ocorria nos gabinetes do pai, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), quando este era deputado federal, e do irmão, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ). Os dados apontam ainda a existência de transações financeiras suspeitas realizadas pela segunda mulher do presidente, Ana Cristina Siqueira Valle.

UOL teve acesso às quebras de sigilo em setembro de 2020, quando ainda não havia uma decisão judicial contestando a legalidade da determinação da Justiça fluminense, e veio, desde então, analisando meticulosamente as 607.552 operações bancárias distribuídas em 100 planilhas -uma para cada um dos suspeitos. O STJ (Superior Tribunal de Justiça) anulou o uso dos dados resultantes das quebras de sigilos no processo contra Flávio, mas o Ministério Público Federal recorreu junto ao STF (Supremo Tribunal Federal). O UOL avalia que há interesse público evidente na divulgação das informações que compõem estas reportagens.

Procurados desde quarta-feira (10) por email, telefone e mensagem de WhatsApp, Jair, Flávio e Carlos Bolsonaro não responderam aos questionamentos da reportagem.

Em quatro reportagens publicadas hoje, o UOL detalha uma série de operações suspeitas de assessores da família Bolsonaro, caracterizadas pelo uso de grandes volumes de dinheiro em espécie.

Dinheiro vivo

A análise realizada pelo UOL mostra que o intenso volume de saques dos assessores de Jair e Carlos é bastante semelhante aos dos funcionários de Flávio.

Esse padrão chama atenção porque foi identificado pelos investigadores do MP-RJ como parte do método usado durante a “rachadinha” na Alerj. Além disso, o uso constante de quantias em espécie dificulta o rastreamento pelos órgãos de controle.

No caso de Flávio, a partir dos saques, os salários eram transformados em dinheiro vivo para entregas a operadores da “rachadinha”: nome pelo qual é conhecido o esquema ilegal de devolução de vencimentos de assessores de um político.

Caixa 2 e repasses

Entre setembro e novembro do ano passado, o UOL publicou uma primeira leva de reportagens sobre o assunto que revelam evidências de crimes eleitorais cometidos pelos envolvidos na rachadinha:

1) O policial militar Fabrício Queiroz, apontado pelo MP-RJ como operador financeiro do esquema no gabinete de Flávio, pagou com dinheiro de caixa 2 despesas da campanha ao Senado do filho mais velho de Jair Bolsonaro. Leia mais aqui.

2) Duas assessoras de Flávio Bolsonaro fizeram repasses para a conta do advogado eleitoral do então candidato ao Senado, durante o período de campanha. Leia mais aqui.

O MP-RJ denunciou Flávio Bolsonaro, Fabrício Queiroz e 15 ex-assessores pelos crimes de peculato (roubo de dinheiro público), apropriação indébita, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A denúncia ainda vai ser analisada pelo Órgão Especial do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro).

Linha do tempo da investigação sobre os Bolsonaro
JAN 18

Relatório do Coaf menciona movimentações financeiras atípicas de Fabrício Queiroz. Documento é enviado ao Ministério Público e à Polícia Federal

JUL 18

MP-RJ abre investigação sobre “rachadinha” em 22 gabinetes de deputados da Alerj

OUT 18

Em 7 de outubro, Jair Bolsonaro e Fernando Haddad vão para o segundo turno das eleições presidenciais. Flávio Bolsonaro é eleito senador. Dias depois, segundo o empresário Paulo Marinho, Flávio recebe o aviso de que uma operação atingiria a Alerj e implicaria Queiroz e a filha dele, Nathália. Em 15 de outubro, Queiroz e Nathália são exonerados. Em 28 de outubro, Jair Bolsonaro é eleito presidente

DEZ 18

Jornal O Estado de S. Paulo publica reportagem sobre relatório do Coaf que apontou movimentações de Queiroz. Advogados de Flávio se encontram com assessores e eles faltam em depoimento no MP

JAN 19

Jair Bolsonaro toma posse. Assessores de Flávio Bolsonaro na Alerj são instruídos a alterar livro de ponto da Alerj. Caso fica parado após pedido da defesa de Flávio no plantão do STF.

FEV 19

Flávio Bolsonaro toma posse no Senado. Ministro Marco Aurélio Mello nega pedido de sua defesa para que caso fosse apurado em Brasília.

MAI 19

TJ-RJ autoriza quebra de sigilo bancário e fiscal de Flávio Bolsonaro, sua esposa, Queiroz e assessores que trabalharam para ele na Alerj durante 12 anos.

AGO 19

Bolsonaro anuncia intenção de trocar o superintendente da PF no Rio, Ricardo Saadi. Por meio de medida provisória, Bolsonaro transfere o Coaf do Ministério da Fazenda para o Banco Central

OUT 19

Em áudio divulgado pelo jornal O Globo, Queiroz — em paradeiro desconhecido — sugere que existem “mais de 500 cargos” na Câmara e no Senado que poderiam ser preenchidos por indicações políticas.

NOV 19

STF considera legal compartilhamento de dados do Coaf com o Ministério Público. Márcia Aguiar e Queiroz trocam mensagens afirmando que Wassef cogita levar toda a família deles para SP.

DEZ 19

Investigados no caso das rachadinhas são alvo de busca e apreensão por autorização do TJ-RJ.

ABR 20

Em reunião ministerial, Bolsonaro diz que trocará pessoas na área de “segurança” e não vai esperar ninguém prejudicar sua família ou amigos para isso. Sergio Moro discorda de troca na direção da PF, acusa Bolsonaro de interferência e deixa Ministério da Justiça. STF abre inquérito para apurar acusações de Moro.

JUN 20

Queiroz é preso em Atibaia escondido em propriedade de Frederick Wassef. A 3ª Câmara Criminal do TJ-RJ aceita recurso de Flávio e o tira de juiz que autorizou a quebra de sigilo e busca e apreensão. Caso é enviado para o Órgão Especial na 2ª instância.

AGO 20

PGR defende que STF não aceite recurso do MP-RJ no caso da rachadinha.

NOV 20

Flávio Bolsonaro e outras 16 pessoas são denunciados por organização criminosa, apropriação indébita, lavagem de dinheiro e peculato pelo MP-RJ.

DEZ 20

A ministra Cármen Lúcia determina que a PGR instaure um inquérito para apurar acusações de que a Abin teria produzido relatórios para a defesa de Flávio, conforme apontou reportagem da revista Época.

JAN 21

Órgão Especial do TJ-RJ marca sessão para analisar se caso de Flávio pode ser julgado pela segunda instância, mas defesa pede liminar contra análise. Ministro Gilmar Mendes defere o pedido e impede julgamento.

Fonte: UOL

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