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O BPC e a “miséria em qualquer canto”

A redução do número de pessoas vivendo em condição de miséria se dá por um conjunto de política, dentre os quais a ampliação de programas sociais e de transferência de renda.

O Benefício de Prestação Continuada, conhecido como BPC, é uma garantia social importante para esse movimento, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição federal com objetivo de proteger pessoas com deficiência e idosos a partir de 65 anos que não sejam capazes de prover seu sustento, ainda que não tenham sido contribuintes do INSS e desde que a renda familiar seja inferior a ¼ (25%) do salário-mínimo, atualmente R$ 275,00.

De maneira geral, o critério de renda é um fator limitador, considerando que o benefício é direcionado para pessoas de baixa renda e que naturalmente dependem de mais recursos e serviços para garantir o mínimo existencial, sendo comum a exclusão de famílias com rendimentos pouco acima do limite estipulado na legislação, embora com despesas mais elevadas diante de necessidades específicas.

Por isso, o entendimento judicial se fortaleceu ao longo dos anos para admitir a flexibilização do limite de renda e, consequentemente, o equilíbrio do requisito econômico. Esse avanço permite, então, que as despesas de tratamento com saúde, incapacidade ou idade avançada como alimentação especial, fraldas descartáveis, medicamentos e consultas possam ser deduzidas do cálculo da renda familiar, ampliando a base de beneficiários que efetivamente precisam do benefício.

Seguindo essa atualização, em 2015, o § 11 foi acrescido ao art. 20 da Lei de Organização da Assistência Social (LOAS)[1], de modo que a renda passou formalmente a ser avaliada não apenas pelo critério financeiro legal puro, mas considerando também outros gastos que impactam o orçamento familiar.

Hoje, para aplicar o desconto e garantir o acesso ao BPC, o beneficiário deve apresentar o laudo médico e a negativa/omissão de assistência pelo órgão público em relação àquele custo indispensável.

Atentos de que “miséria é miséria em qualquer canto; riquezas são diferentes; índio, mulato, preto e branco; miséria é miséria em qualquer canto”[2], a existência do BPC e, sobretudo, desse ajuste à realidade das famílias brasileiras deve ser encarado como reflexo de importante desafio histórico: a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais.

Vale lembrar que, atualmente, mais de 4,7[3] milhões de brasileiros e brasileiras dependem desse auxílio como instrumento de garantia da dignidade humana consagrada na Constituição federal e que deve ser defendido nas ações governamentais para a criação de condições de contingências sociais e universalização de direitos.

Não obstante, em um cenário pandêmico, o fim do auxílio emergencial inaugura o ano de 2021 com um salto na taxa de pobreza extrema – a fome é urgente e já atinge 10,3 milhões de pessoas, superando números que só foram vistos na década passada.

Assim, a incerteza do futuro torna ainda mais distante e obscura a efetivação da igualdade, dada a realidade de crescente disparidade socioeconômica. E, por isso, o fortalecimento de políticas públicas de distribuição de renda é fonte importante para muitos brasileiros, já que “miséria é miséria em qualquer canto; fracos, doentes, aflitos, carentes”[4].

Brasília e Campinas, 2 de março de 2021.

REFERÊNCIAS

[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8742compilado.htm

[2] “Miséria”, Titãs

[3] http://www.portaltransparencia.gov.br/beneficios/consulta?ordenarPor=mesAno&direcao=desc

[4] Miséria – Titãs

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