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Por quem os sinos de Ibaneis dobram?

Em entrevista ao jornalista Chico Santanna, no dia 20 de abril, o presidente do PT-DF, Jacy Afonso, subiu o tom diante do flerte do governador Ibaneis com o bolsonarismo que segue desrespeitando as recomendações da OMS frente a pandemia da Covid-19.

O governador Ibaneis Rocha aproveitou a crise gerada pelas manifestações pró golpe militar, de 19/4, para se diferenciar da maioria dos demais governadores estaduais. Na verdade, Ibaneis já se distanciava do pensamento médio de seus colegas, em especial no que se refere às medidas de combate ao Coronavírus. Ele que foi o primeiro a adotar isolamento social, flexibiliza agora as restrições de convívio social – antes do tempo, segundo os especialistas.

Ao se afastar da maioria dos governadores, se aproxima ao pensamento do presidente Jair Bolsonaro. Um movimento que já vinha sendo percebido, desde que o Governo do Distrito Federal começou a divergir das decisões do então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Ponto alto do entendimento entre Buriti e Planalto, foi a reunião entre os dois, na qual Ibaneis passou a admitir reabrir as escolas, começando pelas militarizadas, atendendo a um pedido direto do presidente da República. Alguns observadores da cena política local avaliam que os desencontros iniciais entre os dois governos decorriam do que o GDF chamava de falta de atenção para com o Distrito Federal, por parte, especialmente, do Ministério da Saúde. A não assinatura do manifesto dos governadores pode, contudo, propiciar leitura mais ampla.

Na Carta Aberta dos Governadores à Sociedade Brasileira, vinte governadores, dentre eles, pesos pesado da economia nacional, como o de São Paulo, João Dória (PSDB) e do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), e até mesmo simpatizantes do presidente, como o de Santa Catarina, Carlos Moisés (PSL), hipotecam solidariedade aos presidentes da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, e ao do Senado Federal, David Alcolumbre, ambos do Democratas. Assinam o manifesto dois dos três governadores eleitos pelo MDB: Helder Barbalho, do Pará e Renan Filho, de Alagoas. Terceiro governador emedebista eleito em 2018, Ibaneis Rocha, não assinou o documento.

Além dele, quebraram a unidade do Fórum de Governadores e não assinaram os titulares de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), do Acre, Gladson Cameli (Progressistas), do Amazonas, Wilson Lima (PSC), do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), de Rondônia, Marcos Rocha (PSL), e o de Roraima, Antônio Denarium (PSL). A não adesão da maioria desses outros governadores ao manifesto não surpreende, pois são lideranças estaduais historicamente mais próximas de Jair Bolsonaro, inclusive com a adoção de medidas de combate ao Coronavírus seguindo a cartilha presidencial. Já Ibaneis foi uma surpresa, pois, ao lado de João Dória, vinha se despontando como um dos líderes desse colegiado de governadores.

Procurada a assessoria de Ibaneis, informou a essa coluna não saber o motivo pelo qual Ibaneis rachara com o grupo e não assinara o manifesto. Ao âncora da Rádio CBN, Brunno Melo, Ibaneis disse ter “o direito de discordar”, mas não disse a razão. O fato é que Ibaneis começa a se distanciar de Doria, busca luz própria na ribalta. Já houve quem defendesse uma dobradinha dos dois em 2022, mas os fatos recentes podem apontar o desejo de um voo solo de Ibaneis Rocha. No cenário local, contudo, perde o apoio popular que conseguiu no início da crise.

Política dos governadores

Para o analista político Mellilo Dinis é necessário destacar o que ele considera como “protagonismo inédito dos Estados e Municípios nesta crise”. Até aqui, havia uma busca pelo bom relacionamento com o Congresso Nacional, sem contudo fechar a porta de acesso ao Executivo Federal.”

Na história política brasileira, o Brasil vivenciou na República Velha (1889-1930) a política dos governadores. Era um acordo político com o intuito de unir os interesses dos políticos locais, marcados pelas oligarquias estaduais da época, juntamente ao governo federal, para assim, garantir o controle do poder político nacional. No início da crise da Pandemia, a ausência de iniciativas federais, acabou por empoderar governadores e prefeitos e tudo com as benção do Supremo Tribunal Federal. Jair Bolsonaro critica as medidas dos governadores face à pandemia da covid-19, principalmente as quarentenas nos estados, e há notícias de tratamento diferenciado entre aqueles que rezam a cartilha federal e os que se opõe a ela. O governador do Maranhã, Flávio Dino (PCdoB), por exemplo, reclama da “solidão” do seu governo, que não contaria com a solidariedade do governo Bolsonaro, o qual, “pelo contrário, tudo tem feito para atrapalhar os esforços maranhenses no combate à covid-19”.

“Ibaneis quer dinheiro da União e acertou com Onyx (Lorenzoni) recursos federais para a área social, que agora é comandada por sua mulher. Na verdade, evita o confronto desde o início, com medo de brigar com o governo federal. Até aplaudiu a demissão do Mandetta” – avalia o analista político, Hélio Doyle, que já atuou no GDF nos governos de Cristovam Buarque, Joaquim Roriz e Rodrigo Rollemberg.

O confronto é forte. Bolsonaro tem a caneta orçamentária, mas os governadores tem os votos no Congresso. Embora no governo de José Sarney os governadores tenham exercido muita pressão sobre o Planalto, não se verificou com nenhum dos sete presidentes que atuaram na Nova República – segundo o cientista político Rodrigo Prando da Universidade Presbiteriana Mackenzie -, quem tivesse sido isolado pelo conjunto dos governadores estaduais como está acontecendo agora”.

Relações Buriti Planalto

A coluna procurou ouvir quem mais entende das relações entre GDF e presidência da República: todos os ex-governadores que passaram pelo Buriti. O médico e ex-governador do DF, Agnelo Queiroz (PT), vê a postura de Ibaneis como errada. Para ele, a articulação dos governadores é a única alternativa eficaz para defender a vida da população em cada Estado do Brasil.

“É uma ação indispensável, necessária para pôr frente a um governo federal, a um presidente da República psicopata, transloucado, um genocida irresponsável, que não teve capacidade de fazer uma articulação nacional de combate ao coronavírus e com isto está colocando a vida da população do Brasil em risco. É uma tristeza ver que Ibaneis não se some aos demais governadores – analisa o ex-governador.”

Na análise de outro ex-governador, Cristovam Buarque (Cidadania), Ibaneis “desapontou ao ficar de fora do documento dos governadores na defesa da democracia. Este não é momento de silêncio”. E considerou a postura de Ibaneis “triplamente lamentável: passa medo, descontentamento e frustração”. “Primeiro, por abrir mão do rigor do isolamento, quando tudo indica, pela ciência e a prática em outros países, que este passo ainda é uma temeridade. A população assiste com medo. Segundo, porque está ficando claro que toma esta decisão por subserviência ao presidente e não por uma decisão e uma iniciativa própria. Faz nos lembrar do desconforto da população quando nossos governadores eram nomeados e demissíveis pelo presidente. Terceiro, pela frustração dos que elogiaram a posição inicial do governador, quando ele tomou a iniciativa, no plano nacional, de impor o necessário isolamento” – assinala Buarque.

Rogério Rosso (PSD) avalia que no Brasil, diferentemente de outras nações, o enfrentamento do grande inimigo chamado coronavírus ganhou uma “perigosa e prejudicial intensidade política, que tem consumido a energia necessária que os governantes precisam dispensar exclusivamente nas ações diárias para reduzir os impactos negativos dessa pandemia.”

“O importante agora é a união de todos em prol do bem mais precioso que temos: a vida. União que exige desprendimento, humildade, compromisso com o coletivo, solidariedade e deixar a disputa política de lado. Cabe ao governador Ibaneis, se assim entender, responder sobre a ausência na carta dos Governadores. O povo brasileiro, em sua esmagadora maioria, entende ser a democracia uma conquista inquebrantável de nossa sociedade e por isso é cláusula pétrea constitucional. E é esse caminho que temos que seguir e defender” – assinalou Rosso.

A deputada Flávia Arruda (PL), disse que seu marido, José Roberto Arruda, esta “recluso” e se absteria de comentar, Rodrigo Rollemberg (PSB) não retornou a consulta.

Mirando 2022

Neste quadro, segundo Mellilo, Ibaneis Rocha, Ibaneis tenta não ser o líder dos governadores, mas sim, se colocar acima deles, “como maior que o conjunto dos demais governadores, não apenas por estar na capital federal, mas por seu projeto próprio (com ou sem o MDB) de ser uma referência em 2022.” É mais ou menos a mesma visão de Doyle. “Ibaneis está preocupado em se sair bem após a pandemia, e acha que aqui não haverá mortes suficientes para desgastá-lo. Por isso aceitou a aproximação com o governo federal e está recuando quanto ao isolamento social”.

Para o presidente do PT-DF, Jacy Afonso, Ibaneis anda “flertando com o bolsonarismo” e contraria até mesmo os ideais da Ordem dos Advogados do Brasil, da qual foi presidente da seccional do DF, e se mostra “omisso” diante das as ações que Bolsonaro tem feito nos últimos dias em Brasília. Isso, na visão dele, coloca a população em risco de contaminação. “Esta omissão do governador Ibaneis é imperdoável” – sentencia Jacy Afonso.

Pós-doutora em Saúde Pública, a professora da UnB, Fátima Sousa – ex-candidata ao GDF em 2018, pelo PSOL -, diz ser “lamentável, repugnante e assustador” ver manifestações pela volta do regime militar, após três décadas de democracia. “Como dito por Martin Luther King, ‘pior que o grito dos maus é o silêncio dos bons’” – assinala ela, dizendo ainda ter esperança de que o comportamento de Ibaneis Rocha não seja um alinhamento político a Bolsonaro, ou desobediência às autoridades sanitárias do Brasil e do mundo como o Ministério da Saúde e a Organização Mundial da Saúde (OMS), abandonando o único e melhor remédio para a pandemia – O ISOLAMENTO SOCIAL (sic)” E conclama Ibaneis a reagir: “Assine governador! Assine em nome da defesa incondicional da ciência, da saúde e da vida da população de Brasília.”

Do Blog Brasília

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