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Carta de Salvador

CARTA DE SALVADOR

1. Reunido em seu V Congresso, o Partido dos Trabalhadores, na presença de centenas de militantes de todo o País, renova sua confiança no povo brasileiro, protagonista das grandes transformações que vivenciamos nos anos mais recentes. Reafirmamos, igualmente, nossa convicção de que a edificação de uma nova sociedade, justa, fraterna e solidária, uma Pátria socialista, só se fará com o aprofundamento da democracia e a ampla participação organizada das maiorias sociais. Por isso, diante do cenário atual, em que o mundo sofre as consequências do terremoto da crise global do capitalismo, o PT vem a público apresentar propostas de superação das dificuldades do momento, ao tempo em que nos fiamos na determinação e competência do governo da presidenta Dilma para nos liderar nessa travessia. Reconhecemos nossos avanços, apontamos nossos erros, sugerimos novos caminhos a trilhar e, sobretudo, divisamos um futuro de esperança, de progresso social e de paz. Ao lado de resoluções que dizem mais respeito ao nosso funcionamento interno, divulgamos a presente “Carta de Salvador”, um documento de compromissos históricos, de revigoramento de nossos princípios fundantes e de atualização de nosso projeto.

2. O mundo vive sob as condições geradas pela crise do capitalismo irrompida em 2008, a mais grave e prolongada desde o colapso de 1929.

3. Um tsunami devastou o sistema internacional de crédito, reduziu os fluxos comerciais entre as nações, expôs a contradição entre a crescente capacidade produtiva e a diminuição relativa da renda dos povos e desnudou os laços de dominação das grandes potências sobre os países emergentes e em desenvolvimento.

4. A resposta hegemônica dos países capitalistas dominantes vem aguçando o conflito que opõe os interesses dos trabalhadores e dos países dependentes contra os objetivos imperialistas, neoliberais e das grandes corporações internacionais.

5. O repertório neoliberal frente à crise, rebatizado de austeridade fiscal, tem entre seus principais ingredientes a redução de salários e direitos, o corte dos gastos públicos, a salvaguarda estatal dos bancos privados, o protecionismo comercial e a imposição de novas medidas para a integração subordinada das nações emergentes à ordem econômica mundial.

6. Ao lado da China e da Rússia, e mais recentemente o governo grego, a América Latina tem se constituído em uma das principais frentes de resistência a essa estratégia, pela via autônoma que a região busca construir desde a eleição dos presidentes Hugo Chávez e Luiz Inácio Lula da Silva, na virada do século, seguida de triunfos eleitorais progressistas em outros países importantes.

7. A região latino-americana e caribenha trata de consolidar um modelo de desenvolvimento cujo eixo principal é a criação de amplos mercados nacionais de massa, impulsionados por políticas de distribuição de renda, fortalecimento do mercado de trabalho, soberania sobre as riquezas naturais e fortalecimento do poder público.

8. Apesar das distintas realidades locais e dos diferentes caminhos para a implementação de mudanças, a América Latina tem se empenhado em intensificar a integração regional, construindo instituições políticas, comerciais e financeiras que consolidem um projeto sustentavelmente autônomo, como servem de exemplo o Mercosul, a UNASUL, a CELAC.

9. Os resultados sociais e econômicos são fortemente positivos nos últimos quinze anos: taxas superiores de crescimento do PIB, destacada diminuição da miséria e da desigualdade social, ampliação dos direitos e serviços públicos, melhoria sensível dos indicadores de saúde e educação.

10. É inegável, porém, que a alteração do cenário internacional estabeleceu impasses para o aprofundamento desse modelo.

11. A queda abrupta do excedente comercial, provocada pela derrubada dos preços internacionais de commodities e do volume de transações, e ainda, a expressiva diminuição na arrecadação causada pela queda importante da atividade da indústria, afetaram drasticamente a principal fonte de financiamento das políticas social-desenvolvimentistas.

12. Também se intensificou a tensão entre expansão da renda popular e cadeias produtivas, fortemente dependentes do capital privado local e mundial. Muitos dos atuais problemas inflacionários, fiscais e cambiais derivam dessa desarmonia.

13. Este novo quadro aguça as lutas de classes em toda a região, sob a forma de conflitos distributivos em tempos de escassez. Enquanto a insaciável acumulação capitalista demanda compressão de salários e direitos para aumentar a rentabilidade dos negócios e sua competitividade internacional, a continuidade da ascensão dos pobres da cidade e do campo passou a depender de reformas tributárias e nacionalização de ativos que favoreçam uma maior distribuição de renda.

14. Os países imperialistas, particularmente os Estados Unidos, valem-se da crise para desencadear uma ofensiva contra as experiências latino-americanas, estimulando movimentos para sua derrocada e pressionando pela substituição do modelo, com o objetivo de, pelo acesso fácil aos mercados e às riquezas naturais da região, acumular e concentrar mais capital.

15. Diante deste quadro, os governos progressistas defrontam-se com dilemas cruciais: aprofundar a integração regional ou curvar-se à inserção subordinada ao sistema comandado pelo imperialismo; promover reformas que reduzam a transferência de renda do Estado para grupos privados ou ceder às exigências de mercado para ampliar os ganhos do grande capital.

16. O Brasil, desde 2003, quando toma posse o presidente Lula, é um dos pilares da nova realidade latino-americana, em suas conquistas e desafios.

17. Há quase treze anos o país vive a implantação progressiva de um projeto de desenvolvimento com inclusão social, geração de milhões de novos empregos, distribuição de renda, fortalecimento do mercado de trabalho e abertura de oportunidades para a população.

18. Os governos liderados pelo Partido dos Trabalhadores, aproveitando-se com inteligência e firmeza das condições externas e internas, vigentes até a eclosão da crise capitalista, foram paulatinamente reduzindo as taxas de juros, eliminando a dívida pública externa e diminuindo o peso relativo do endividamento interno.

19. O Estado, a partir deste redimensionamento dos encargos financeiros, amealhou recursos para um conjunto de programas que mudaram drasticamente a vida dos brasileiros mais pobres, em um fenômeno que se refletiu em formidável ampliação do consumo de bens e serviços, que, com o simultâneo fortalecimento do mercado de trabalho, se constituíram em motores da nova etapa de desenvolvimento nacional.

20. Além das políticas sociais – que precisam ser consolidadas — o poder público retomou dinamismo como principal investidor em obras de infraestrutura e projetos estratégicos, tanto através de recursos orçamentários quanto do robustecimento de bancos e empresas estatais.

21. Graças a um longo período de recuperação econômica, o País tornou-se destino obrigatório dos fluxos internacionais de investimento, com rebaixamento acentuado da taxa de desemprego e escalada nos salários pagos nos distintos ramos de atividade.

22. A eclosão da crise internacional, no entanto, abalou o financiamento desse modelo de desenvolvimento, que muito se alimentava do excedente comercial crescente entre 2004 e 2010, com suas boas consequências para as finanças públicas.

23. O Estado começou a perder capacidade de financiar o modelo de desenvolvimento em construção. A persistência da crise mundial, ao reduzir o saldo de exportações, foi respondida pelo governo com subsídios fiscais, para tentar manter o ritmo da economia, e elevação da taxa básica de juros para atrair capitais que permitissem fechar positivamente as contas do país. O “espírito animal” do capital industrial não despertou, apesar da ampla política de desonerações. Até mesmo porque setores do capital industrial foram seduzidos pelas altas taxas de remuneração do rentismo.

24. O governo da presidenta Dilma Rousseff, com essas medidas, conseguiu defender o emprego e a renda dos trabalhadores, mas a soma de desonerações dos grupos capitalistas e arremetida dos custos da dívida interna esvaziaram os cofres do Estado, ainda mais depauperados pelo enfraquecimento do PIB e da queda da arrecadação tributária.

25. O excedente comercial dos primeiros dez anos permitiu o avanço do projeto petista sem mexer nas estruturas rentistas herdadas dos governos neoliberais, mas a retração mundial escancarou o caráter antinacional da financeirização de empresas produtivas e da concentração de renda provocada pela acumulação de bônus da dívida interna.

26. Além de sangrar o orçamento nacional, pois boa parte das receitas públicas federais se destinam a pagamento e amortização de títulos do Tesouro, o rentismo inibe os investimentos privados e aprofunda o processo de desindustrialização, ao pressionar para cima o câmbio e reduzir a competitividade das exportações brasileiras.

27. A verdade é que a baixa do superávit comercial, em convivência com estas velhas estruturas rentistas, desacelerou o crescimento da economia e a expansão do mercado interno, derrubou a taxa de investimentos e penalizou tanto a renovação da infraestrutura quando a ampliação dos serviços públicos.

28. O Partido dos Trabalhadores reconhece que essa situação exige a abertura de um novo ciclo, no qual reformas estruturais, investimentos em inovação, desenvolvimento científico e tecnológico, maior capacitação e valorização da força de trabalho abram campo para a afirmação do projeto nacional de desenvolvimento implantado a partir de 2003.

29. A nova realidade impõe um desmonte progressivo do rentismo, um combate implacável aos saudosistas do neoliberalismo a fim de recuperar a soberania financeira do Estado.

30. A oposição de direita, a mídia monopolizada e seus aliados mais conservadores defendem que a retomada do crescimento depende da atração de capitais externos a qualquer custo, através da redução relativa de salários e direitos, elevadas taxas de juros, privatizações e desregulamentações, diminuição dos gastos públicos e a inserção subordinada do País em acordos de livre-comércio e nas cadeias produtivas globais.

31. O PT se contrapõe a esse ponto de vista, prejudicial aos interesses nacionais e à maioria da população brasileira.

32. A opção pela qual lutamos é a da transição de políticas públicas para reformas de base. O país precisa de um novo programa para um novo ciclo de desenvolvimento, cujo núcleo fundamental é a transformação do sistema tributário, regressivo, injusto, concentrador de renda e riqueza. Coerente com isso, o ajuste fiscal não deve recair sobre os trabalhadores. Por essa razão é preciso que as medidas tenham como princípio a justiça fiscal aprimorando ações como a MP 675 que eleva a CSLL de 15% para 20% no caso dos lucros e dividendos dos bancos.

33. O PT defende também a reversão da política de juros altos, comprovadamente ineficaz no combate à inflação nesta fase de retração da demanda e gravosa para o Tesouro. É preciso conduzir a orientação geral da política econômica para a implementação de estratégias para a retomada do crescimento, para a defesa do emprego, do salário e demais direitos dos trabalhadores, que permitam a ampliação das políticas sociais.

34. O partido acha urgente, ainda, a instituição do imposto sobre grandes fortunas, grandes heranças e sobre lucros e dividendos, para alavancar o modelo de desenvolvimento sustentável com justiça social.

35. Também advoga a mudança das alíquotas do Imposto de Renda, com elevação do atual teto, aliviando a carga tributária sobre a produção e a maioria dos assalariados e onerando os grandes patrimônios e as grandes riquezas.

36. É preciso inverter a lógica do sistema atual, que concentra a carga tributária sobre impostos indiretos, regressivos e injustos, pois atingem a todos igualmente (como são o ICMS e o IPI), para incidi-la mais sobre os impostos diretos, a fim de fazer pagar mais quem tem mais.

37. Consideramos imprescindível um amplo debate nacional sobre financiamento da Saúde Pública.

38. Estas medidas, que a outras se somam, particularmente a manutenção da política de conteúdo nacional e do regime de partilha na exploração do pré-sal, são fundamentais para dotar o governo de recursos que possibilitem a execução das cinco reformas indispensáveis para a edificação do Estado de bem-estar social: agrária, urbana, educacional, sanitária e de transportes.

39. Vital, também, para o PT, é a transformação do Estado, para democratizá-lo, dar-lhe transparência, abri-lo à participação e ao controle da sociedade, bem como torná-lo mais eficiente.

40. Entre várias reformas do Estado necessárias, o PT aponta três, como medidas imediatas.

41. A primeira consiste na reorganização administrativa e institucional, que viabilize a reprogramação de todas as políticas públicas a partir da matricialidade e integração setorial de suas especialidades. Enquanto o Estado funciona na forma de caixinhas setoriais (educação, saúde, trabalho, entre outros) e regionais, os problemas atuais tornam-se cada vez mais complexos e totalizantes, incapazes de serem superados pela lógica de organização pública em partes que não se comunicam, quando concorrentes entre si. A fonte disso encontra-se centrada na recuperação do sistema de planejamento democrático e transparente de médio e longo prazos.

42. A segunda concentra-se na necessária ampliação das políticas distributivas para as redistributivas. Ou seja, a transição da melhor repartição social do orçamento governamental para a expansão da progressividade do fundo público.

 

43. Arrecadando mais e melhor, o Estado passa a alterar, de maneira mais forte e eficaz, a desigualdade medieval que, apesar dos governos progressistas, ainda persiste nos países latinoamericanos.

44. A terceira, por fim, refere-se à reinvenção do mercado, tendo em vista o poder dos grandes grupos econômicos sobre o Estado. Ademais das exigências da transparência e crescente participação social, o Estado precisa reconstituir-se fundamentalmente para o verdadeiro mar que organiza os micro e pequenos negócios no país, com políticas de organização e valorização do setor por meio da criação de bancos públicos de financiamento da produção e comercialização, fundos de produção e difusão tecnológica e de assistência técnica e de compras públicas. Além disso, essa reinvenção passa pela criação e o fortalecimento nas cadeias produtivas regionais, tendo em vista a integração regional energética e de infraestrutura. As cadeias regionais, no contexto político latino-americano atual, têm a capacidade de aglutinar pequenas e médias empresas, além de criar e fortalecer mercados de consumo e de trabalho nos diferentes países.

45. Somente uma reforma do Estado e uma maior ampliação do fundo público poderão ensejar um novo patamar civilizatório, como a postergação do ingresso no mercado de trabalho a partir dos 24 anos, a educação e aprendizagem para a vida toda e, ainda, jornadas de trabalho reduzidas em relação aos tempos extenuantes de agora. Tudo isso, contudo, pressupõe maioria política necessária para tornar realidade o que hoje se apresenta como mera possibilidade.

46. O Partido dos Trabalhadores compreende que estas mudanças não se limitam às fronteiras nacionais, complementando-se com a intensificação dos esforços de integração da América Latina e da aliança com as nações do BRICS.

47. Para libertar o Brasil da ditadura mundial exercida pelo capital financeiro sobre as economias dependentes, é essencial a criação de bancos, fundos de investimentos, tratados de troca e planos produtivos autônomos em relação ao sistema controlado pelos Estados Unidos e Europa. Neste sentido é preciso investir na nova arquitetura financeira mundial que vem surgindo no mundo: o Banco do Sul (da UNASUL), o Banco de Desenvolvimento dos BRICS e o Acordo Contingente de Reservas, bem como o Banco Asiático de Desenvolvimento e Investimento da China.

48. A adoção deste programa como norte para o campo popular deve expressar movimento potente de renovação estratégica, que influencie a política de alianças, as formas de organização e ação, as relações com os movimentos sociais e a institucionalidade.

49. O Partido dos Trabalhadores considera que se fazem necessárias mudanças para que a estratégia partidária se ajuste a esta nova realidade, a fim de vencer os desafios do período que atravessamos.

50. Forjada nos anos posteriores ao colapso da União Soviética, quando se consolidava a hegemonia imperialista sobre o planeta e predominava o pensamento neoliberal, a estratégia do PT identificou uma cisão entre os grupos dominantes em relação ao modelo econômico preconizado pelo Consenso de Washington. Tal divisão semeou o terreno para alianças com setores mais vinculados à indústria nacional e ao mercado interno, cujos interesses eram representados, no plano institucional, por lideranças e grupos políticos navegando no centro do espectro partidário.

51. Foi possível, então, estabelecer uma ampla frente contra o neoliberalismo, politicamente representado pela coalizão PSDB-DEM, acumulando forças para bater as forças do rentismo nas eleições presidenciais de 2002, quando as urnas sufragaram a dobradinha Lula-José Alencar.

52. Esta aliança da esquerda para o centro tornou viável, para as administrações comandadas pelo PT, a construção de maiorias parlamentares táticas, que garantiram a governabilidade para aprovação de políticas públicas e manutenção da estabilidade institucional.

53. A fórmula prosperou, em boa medida, graças às condições materiais favoráveis dos primeiros dez anos. Os cenários externo e interno possibilitaram a aplicação de programas distributivos sem ferir interesses relevantes do bloco rentista, formado pelo capital financeiro, oligopólios industriais e o agronegócio.

54. Na fase ascensional do modelo desenvolvimentista, estes setores, também favorecidos pelo deslanche da economia, foram relativamente neutralizados e evitaram protagonismo na disputa político-ideológica contra os governos petistas, função que acabou exercida pelos grupos de comunicação e os estamentos mais altos das camadas médias.

55. O Partido dos Trabalhadores reconhece, no entanto, que o sucesso desta estratégia foi acompanhado por erros importantes que provocaram efeitos colaterais maléficos para a esquerda e o campo popular.

56. O principal destes equívocos foi não ter estabelecido como tarefas prioritárias, desde o princípio, a reforma do sistema político e a democratização dos meios de comunicação. A falta de maioria parlamentar progressista e a intenção de reduzir ao máximo conflitos em um cenário no qual os trabalhadores não eram força hegemônica deixaram em suspenso uma campanha nacional por esses temas e a subestimar sua influência sobre todo o processo político.

57. A verdade é que, em contraposição aos processos vividos por outras nações latino-americanas sob governos progressistas, o Partido dos Trabalhadores e as administrações sob sua liderança deixaram, na prática, de alterar instituições e instrumentos de poder das velhas oligarquias, que, mesmo fora do governo central, hoje nos combatem ferozmente.

58. O partido e o governo acabaram, assim, adaptados a um regime marcado pelo predomínio do poder econômico, pela limitação da participação popular e pelo monopólio da informação – abdicando de denunciá-lo com o peso devido e de lutar por sua superação desde a primeira hora.

59. Deixado intacto, esse sistema político-eleitoral contaminou práticas partidárias, deformou relações internas e trouxe de contrabando métodos e hábitos da política tradicional: a supremacia dos mandatos sobre as instâncias partidárias, o esvaziamento da vida interna fora de períodos eleitorais, o relativo distanciamento dos movimentos sociais, sinais de burocratização, a centralização como método de direção.

60. Outro grave problema foi a deficiência em determinar a correta relação de coalizão interclassista e pluripartidária com disputa de hegemonia. O primado aliancista, da forma como muitas vezes foi conduzido, reforçou a tendência de converter o PT em braço parlamentar do governo, preliminarmente bloqueando a luta por projetos e ideias na sociedade e no Estado.

61. Uma das principais consequências desta dinâmica foi negligenciar a necessidade de investir na elevação da consciência e da cultura de classe das multidões beneficiadas pela ascensão social, objetivo que deveria ter mobilizado amplamente os aparatos de comunicação e educação do Estado, além do próprio partido.

62. Mesmo internamente, os efeitos foram danosos, definidos pela pouca relevância oferecida à formação político-ideológica da militância e à construção de um sistema de comunicação que pudesse afrontar a influência das corporações midiáticas.

63. O Partido dos Trabalhadores tem buscado corrigir estes erros nos últimos anos, como é possível confirmar pelas resoluções e documentos aprovados desde o III Congresso.

64. Mas reconhecemos que as alterações na situação internacional e local nos obrigam a uma mudança de maior envergadura.

65. A realidade que atualmente vivemos é a da radicalização das disputas de projetos. Aqueles contrários ao projeto de desenvolvimento nacional com distribuição de renda, democracia e soberania nacional ganharam força e buscam desestabilizar o governo, atraindo setores de centro da sociedade brasileira. Esse processo de disputa de projetos apenas confirma nossa concepção de que mudanças, em favor do povo, sem mobilização, são cada vez mais remotas.

66. As vicissitudes do quadro político atual não serão superadas, em favor da classe trabalhadora e seus aliados, sem a emergência de um poderoso movimento de massas que – articulado à luta institucional, às ações efetivas e corretas de governo e à batalha cultural – seja capaz de impor uma situação de cerco ao Estado oligárquico.

67. O programa de reformas estruturais pressupõe a construção de uma frente democrática e popular, de partidos e movimentos sociais, do mundo da cultura e do trabalho, baseada na identidade com as mudanças propostas para o período histórico em curso.

68. Este caminho vai além de acordos eleitorais ou de pactos entre direções: nossa proposta é a constituição de uma nova coalizão, orgânica e plural, que se enraíze nos bairros, locais de estudo e trabalho, centros de cultura e pesquisa, capaz de organizar a mobilização social, o enfrentamento político-ideológico, a disputa de hegemonia e a construção de uma nova maioria nacional.

69. O Partido dos Trabalhadores não economizará esforços para ajudar a reunificar os movimentos, agrupamentos, coletivos e militantes que tornaram possível a reeleição da presidente Dilma Rousseff em outubro de 2014.

70. Apenas com a existência de um bloco desta natureza poderemos disputar as bases do centro político da sociedade e atrair suas lideranças mais dispostas a se separar do conservadorismo, em torno do nosso projeto democrático e popular de desenvolvimento com inclusão social, democracia e respeito aos direitos dos trabalhadores, além de dialogar com enormes contingentes de brasileiros e brasileiras sem-partido.

71. A estratégia de frente é nosso caminho para firmar uma nova aliança social, que incorpore setores novos e tradicionais da classe trabalhadora, das camadas médias, da intelectualidade e do empresariado simpático ao nosso projeto nacional.

72. Esta política deve ser fortemente mobilizadora da juventude e das mulheres, dos coletivos LGBT e antirracistas, dos grupos ecológicos e das organizações de direitos humanos.

73. O programa da frente tem a obrigação de somar, à agenda do desenvolvimento, da questão nacional (a Petrobrás como pilar), da democratização do Estado, o fim dos autos de resistência, a desmilitarização das polícias estaduais, a descriminalização das drogas, a criminalização da homofobia, a igualdade de gêneros e o reconhecimento pleno da união homo-afetiva, entre outros direitos civis.

74. Agrega-se à essa plataforma a necessidade de responder imediatamente à possível vitória da contra-reforma política, operação comandada pelos partidos conservadores com a intenção de manter o controle dos grandes grupos empresariais sobre o parlamento.

75. Torna-se indispensável a retomada da luta pela Constituinte exclusiva e soberana, convocada especificamente para realizar uma verdadeira reforma do sistema político-eleitoral.

76. O Partido dos Trabalhadores está pronto para cumprir estas tarefas, que exigirão muita reflexão, unidade, companheirismo e vontade política de nossos (as) militantes e dirigentes.

77. Como integrante do governo de coalizão comandado pela companheira Dilma Rousseff, o partido tudo fará para que este programa possa ter a presidenta da República como sua principal portavoz e liderança.

78. Para estarmos aptos a ações de tanta envergadura, o V Congresso conclama todo o partido para um profundo processo de reorientação, caracterizado pela renovação em suas estruturas, métodos de organização e direção, formas de financiamento, instrumentos de comunicação e relações com os movimentos sociais.

79. Essa é a senda de um partido de massas vocacionado para dirigir o Estado, mas cujo projeto histórico é a fundação de uma nova sociedade, socialista e democrática.

80. Cometemos erros, mas é fundamentalmente por nossas virtudes que as forças conservadoras nos atacam e almejam nossa destruição. Não aceitam que a classe trabalhadora e seu principal partido estejam no comando do país, enfrentando o legado de opressão e desigualdade gerado em séculos de dominação, violência, privilégios e preconceitos. Respondamos ao ódio reacionário com a esperança simbolizada pela bandeira vermelha: o Partido dos Trabalhadores jamais renunciará ao seu compromisso histórico com a emancipação do povo brasileiro.

81. Essa é a nossa tarefa, a nossa missão. É só querer e, amanhã, assim será! Salvador, Bahia, junho de 2015

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